Jornal de Angola, editorial
Numa altura em que um dos maiores desafios que a sociedade enfrenta consiste no resgate de valores morais e cívicos, urge repensarmos todos o papel da família de Cabinda ao Cunene.
Durante longos anos, a família angolana passou por sucessivas provas que, em grande medida, contribuíram para os níveis de desestruturação e problemas por que passou o principal núcleo da sociedade em Angola.
O conflito armado terminou há já algum tempo e é verdade que, em muitos aspectos, vivemos e convivemos ainda com sequelas da fase trágica por que Angola passou.
Além da perda dos seus membros, muitas famílias foram forçadas à deslocação dentro e fora do país, com graves repercussões no processo de adaptação e recomeço.
Não há dúvidas de que o principal segmento mais afectado, ao longo desse tempo, foi a família, cujos valores conheceram níveis acentuados de degradação. Trata-se de uma realidade que sucedeu em grande medida também por causa de factores externos com os quais estamos inevitavelmente confrontados. Num mundo globalizado em que se encurtaram consideravelmente as distâncias, em que os valores culturais são absorvidos com excessiva rapidez, o nosso país não esteve imune. E fruto dessa interacção, o processo de aculturação, em muitos aspectos, foi inevitável, uma realidade que serve hoje como desafio na medida em que urge resgatar e preservar os valores e tradições que mais se identificam com os povos de Angola.
Terminada a guerra, foi empreendido um grande esforço por parte das instituições do Estado, e com a reabilitação das infra-estruturas, com o processo de reencontro e reconciliação de numerosas famílias, numerosos desafios renovaram-se ao longo dos últimos anos.
O processo de criação de condições para que as famílias realizem o seu sonho passou a ser um desafio imenso, razão pela qual as instituições do Estado contam com todas as organizações da sociedade civil.
Mas tal como foi possível enfrentar e vencer a referida etapa, que contribuiu sobremaneira para a desestruturação de numerosas famílias, para a absorção de atitudes nem sempre consentâneas com a nossa cultura, podemos igualmente superar a fase actual.
Trata-se de um exercício que deve engajar todos os sectores da sociedade e ser encarado como o ponto de partida para invertermos o actual curso dos acontecimentos e desafios junto das famílias. Para todos os efeitos, está em causa a recuperação do papel da família na sociedade enquanto núcleo por via do qual podemos criar novos alicerces em que se podem basear a vida familiar e individual. O Vice-Presidente da República renovou há dias o repto a todos os angolanos, a todas as famílias e a todas as instituições do país para repensarem o papel da família na sociedade.
“Em nosso entender, o Governo deve, juntamente com outros parceiros sociais, como a Igreja, estudar as formas de cooperação que garantam a manutenção do papel da família, como agente estruturante e estabilizador da sociedade”, disse Manuel Vicente em representação do Chefe de Estado, José Eduardo dos Santos, na abertura da 17ª Assembleia Plenária dos Bispos do Simpósio das Conferências Episcopais de África e Madagáscar.
O chamado principal núcleo da sociedade continua no centro das principais preocupações do Estado, tal como provam sucessivas iniciativas da parte do Executivo. Desde a aprovação da Lei Contra a Violência Doméstica, adopção e ratificação de numerosas Convenções e Tratados Internacionais, grande parte com uma forte incidência sobre a família, vários passos positivos têm sido dados. Da parte das instituições, a julgar pela intervenção do Vice-Presidente, há um firme compromisso do Estado para que o problema da família não seja apenas encarado como um assunto do Estado para passar a ser um tema de todos. Cada membro de um agregado familiar, cada chefe de família, independentemente do género, cada instituição da sociedade como as igrejas, as associações profissionais, tem o dever de jogar o papel que dela se espera para bem da família.
É preciso que a reflexão sobre o estado da família contribua também para a busca de melhores resultados no combate contra a violência doméstica, maus tratos contra crianças, idosos, vandalismo e outras práticas sociais reprováveis. Estamos certos de que todos os sectores da sociedade abraçam o repto do Vice-Presidente para que tenhamos como foco principal, neste processo de resgate de valores e avaliação do papel da família, o principal núcleo da sociedade para bem de todos os membros da família angolana. E nisto, vale a pena destacar o papel incansável das igrejas que, desde sempre, se mantiveram como parceiros do Estado, contribuindo para a construção de uma sociedade livre, justa, democrática, solidária, de paz, igualdade e progresso social.
Mais do que apontar-se o dedo ou caminhar para um exercício de recriminações entre todos os membros da sociedade, vale a pena olharmos para a frente e termos a família como agente estruturante e estabilizador da sociedade.
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