Família que sobrevive com uma cesta básica de ajuda. (Foto: Paulo Spranger/Global Imagens) |
BE critica demora injustificada de medida "que se limita a transpor algo que já existe". Milhares de famílias carenciadas continuam sem apoio na água
Aprovada em outubro de 2016, com o Orçamento do Estado para o corrente ano (OE 17), a legislação que devia equiparar o total de beneficiários da tarifa social da água, para todas as famílias carenciadas já com acesso a descontos na eletricidade e gás natural, continua parada.
São assim várias dezenas de milhares de famílias carenciadas que continuam sem qualquer apoio no acesso a este bem essencial. Conforme o Dinheiro Vivo deu conta em novembro de 2016, em 128 autarquias então analisadas, apenas 95 tinham um tarifário social para a água. Contudo, e como as condições de acesso não estão harmonizadas, sendo na maioria dos casos mais restritivas do que as que estão em vigor para a luz e gás, mesmo nas câmaras com estes apoios, as tarifas não chegam a todos os beneficiários potenciais: apenas 23,6 mil famílias carenciadas das 234 mil existentes nas autarquias consideradas tinham acesso a apoios.
Foi para acabar com este cenário e alargar o total de beneficiários a todas as famílias carenciadas, que o Bloco de Esquerda negociou para o OE a harmonização das regras de acesso, equiparando-as às em vigor para a luz, ainda que respeitando a autonomia municipal. Mas até agora nada avançou.
Questionado com um total de dez questões sobre a matéria, o gabinete de Eduardo Cabrita, ministro adjunto que está com o dossiê em mãos, disse apenas ao DV que o “governo está a trabalhar na autorização legislativa que desenvolverá o regime conforme definido” no OE, apontando que “a iniciativa legislativa deverá estar pronta até ao final do primeiro semestre”.
Mas este é um calendário que coloca em risco que a tarifa chegue a tempo das autárquicas: como a aplicação das tarifas e a forma dos descontos dependerá das câmaras, as eleições poderiam servir de impulso ao alargamento ou criação deste regime em dezenas de câmaras de forma mais rápida – muitas autarquias estão renitentes pois isto irá aumentar-lhes a despesa.
Bloco critica
atraso Questionado sobre a demora desta iniciativa, Jorge Costa é crítico: “Nada justifica a demora na regulamentação de uma medida que está pronta, que se limita a uma transposição de algo que já está criado”, aponta o deputado do BE, partido responsável pelas iniciativas que alargaram os beneficiários na luz e que agora o procura fazer para a água. Esta medida é mais uma das negociadas à esquerda que estão por fechar, atrasos que podem marcar as negociações do OE 18.
“Teria sido importante regulamentar mais cedo para encorajar os executivos [municipais] a avançar”, diz ao DV. “Passado o calendário eleitoral, o estímulo será menor.” Para Jorge Costa, o risco é que “este atraso” leve a um “atraso ainda maior” quando o alargamento chegar aos municípios, leia-se até às próximas eleições.
Ainda assim, e dependendo da forma que o governo vier a dar à iniciativa, a possibilidade de alargar a tarifa ainda pode ser real até às eleições. “Se tudo for feito no imediato e as autarquias se adaptarem, pode acontecer”, diz. Nesse sentido, e tal como já fez em Lisboa, o BE irá tentar acelerar este processo mal seja possível através das assembleias municipais onde está presente.
Câmaras preocupadas pedem apoio para subida de custos
A harmonização dos critérios de acesso à tarifa social na água aos que estão em vigor na luz e no gás irá aumentar o total de beneficiários, elevando assim a despesa das autarquias com este apoio. E este é um dos fatores que mais deixa as autarquias de pé atrás face a esta iniciativa do governo.
Contactadas aquando da aprovação da medida no OE 2017, algumas câmaras manifestaram ao DV preocupações com o alargamento dos beneficiários e também com a falta de mais informação sobre o que irá mudar, pedindo ou a compensação pela subida dos custos ou a absorção destes pela administração central. “A harmonização dos critérios só respeitará a autonomia local, se o impacto financeiro for integral e anualmente assegurado pela administração central”, comentou na altura o gabinete da presidência da Câmara Municipal da Figueira da Foz (PS).
Esta autarquia sublinhou ter já um tarifário social de critérios “justos e adequados”, dedicados às famílias de baixos rendimentos, que chegava a 512 famílias no final de 2016. Mas este número compara com as 4724 famílias no município que preenchiam os requisitos para ter acesso à tarifa social da luz – as mesmas que, em teoria, deveriam ter, no futuro, acesso a uma tarifa social na água.
Já em Évora (PCP), as alterações previstas no OE foram vistas como um “ataque à autonomia do poder local, agora através de uma medida ‘simpática’ de apoio social”, afirmou no final de novembro o chefe de gabinete deste município. A câmara afirmou então ser prematuro tomar qualquer posição sobre “o normativo”, atirando uma opinião para quando este avançar, isto “se este chegar a ser aprovado”.
Em Barrancos (PCP), a câmara admitiu estimar “um aumento (exponencial) do número de beneficiários”, de nove para “não menos de 150”. E este será “sempre um encargo muito elevado para o orçamento municipal”. Apesar de considerar “o princípio louvável”, a câmara defendeu que deviam “ser previstas compensações pelos custos, que poderão, nalguns casos, levar a incumprimentos”.
Fonte: Dinheiro Vivo
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