sexta-feira, 29 de dezembro de 2017

A credibilidade por um canudo

A credibilidade é um activo valioso. E foi este activo que os deputados do PS, PSD, PCP, Bloco de Esquerda e PEV desbarataram ao aprovarem à sorrelfa as alterações à lei do financiamento dos partidos.
Celso  Filipe
Celso Filipe 28 de dezembro de 2017 às 23:00
Como adiantou o Negócios na sua edição de ontem, os partidos criaram para si um regime de IVA mais favorável do que as IPSS, sendo que o duplo benefício de que usufruem viola as regras europeias, segundo três fiscalistas. O próprio Bloco, que votou favoravelmente as alterações, veio posteriormente dizer que discorda da devolução do IVA contemplada no diploma.



Ontem também, a secretária-geral adjunta do PS, Ana Catarina Mendes, veio dar a versão do seu partido sobre as alterações à lei. Numa concepção muito peculiar de democracia acedeu a responder a três perguntas e depois abandonou a conferência de imprensa. Deu as explicações que quis, mas muitas perguntas ficaram sem resposta. No entretanto, garantiu que "a angariação de fundos continua a ser obrigatória, transparente e a constar da contabilidade anual dos partidos" e que "é falsa a ideia de que há um aumento dos cofres partidários". "Não fazemos leis à medida", garantiu a também deputada socialista.



Na realidade, não é uma lei à medida. É apenas uma lei que favorece de forma descarada os partidos e que, no caso do IVA, se traduz numa perda de receita para o Estado. É apenas uma lei que foi discutida à porta fechada, sem actas ou qualquer comprovativo das propostas. E esta prática, quase secreta, contamina irreversivelmente a avaliação das alterações que até tinham um propósito nobre, o de acabar com um conflito resultante do facto de o Tribunal Constitucional ser, em simultâneo, instrutor e juiz dos processos relativos à fiscalização dos partidos.



Os artífices destas alterações contribuíram para tornar mais fundo o fosso da desconfiança dos portugueses em relação aos partidos, o qual se reflecte nas elevadas taxas de abstenção nos diversos actos eleitorais. E não deixam ao Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, alternativa que não a do veto desta lei, devolvendo-a à Assembleia da República ou enviando-a para o Tribunal Constitucional, respaldado na onda avassaladora de críticas que entretanto surgiram.




Perante tamanha inépcia apetece citar Eça de Queiroz, que armado do seu humor corrosivo um dia sentenciou: "Políticos e fraldas devem ser trocados de tempos em tempos pelo mesmo motivo."

Fonte: Jornal de Negócios

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