quarta-feira, 17 de abril de 2019

Opinião | Porquê mentir?

Joaquim Carlos *
É certo serem muitas as pessoas que mentem. E porquê? Muitas vezes por medo… Fizeram alguma coisa que lhes era proibida, receiam ser punidas. É tontice querer apagar uma falta cometendo outra. Muitas vezes a sua «falta» não era mais que um descuido: partiram um copo, entornaram a chávena do café… e agora não dizem a verdade para não serem repreendidas. Assemelham-se àquele que, para apagar uma mancha de lama no fato branco, se espojasse num atoleiro!
Seria mais ajuizado raciocinar assim: «é verdade que cometi uma falta, e que, se a confessar, serei repreendido. Mas, depois? Amanhã a repreensão estará esquecida e eu estarei contente por ter sido franco e honesto. Se, ao contrário, eu consigo, pela mentira, evitar a repreensão, esta mentira fará em minha alma uma ferida profunda com a qual sofrerei por muito tempo porque tirou a paz do meu coração».
Gosto mais de confessar francamente a minha falta: «Fui muito descuidado, fui grosseiro, cometi uma leviandade; esforcei-me por não a repetir, mas castigue-me como entender»! Vês? Ficou assim salva a honorabilidade; e estou persuadido de que, depois de semelhante confissão, não haverá castigo. Mas se o houvesse? Então dirias: «Prefiro sofrer pela justiça a fazer sofrer a justiça por culpa minha»!
Outros há que mentem por cobardia. Entre jovens fala-se, por exemplo, de religião, de princípios morais, de ideal; alguns começam a troçar disso. Seria o momento de se pôr abertamente do lado de Deus, da Igreja; não se atreve com receio de olhares irónicos, prefere-se mentir. É cobardia!
Há-os que mentem por inveja. Louva-se em sua presença um dos seus colegas? «Oh! Ele não é o que se diz! Tem tal defeito!» dizem, caluniando-o.
Para se procurar obter vantagens: «Não foi um «goal», não é verdade, a bola não tocou!».
Por fidelidade mal compreendida, quando, por exemplo, se quer ajudar um amigo a sair de embaraços. Para se gabar: «Oh! Se visses o esplêndido automóvel que tínhamos neste Verão!» ou ainda: «Que maravilhosas aventuras eu tive!» quando é certo que nada ou quase nada disso era verdade.
Na aula, mente-se recitando uma lição que um companheiro sopra do lado, ou copiando o exercício de outro, porque então faz-se figura com alguma coisa que não nos pertence. Nestas ocasiões, o jovem de carácter firme responde à tentação: «Sou demasiado orgulhoso para tentar elevar-me servindo-me de meios indignos».
Tenho já visto mentir por simples leviandade. Esses não mentem no sentido estrito da palavra; mas a sua leviandade acarreta-lhes, por vezes, surpresas muito desagradáveis. Não pode a gente fiar-se neles, porque têm o hábito de ser imprecisos e de brincar com as palavras. Não é raro que um jovem de carácter recto se abstenha sempre de grandes mentiras, mas se permita dizê-las pequenas, por vezes; também isto prejudica o carácter. Um jovem digno nunca dirá: «Não era eu!» quando era ele; mas acontecer-lhe-á dizer: «Fui algumas vezes com tal companheiro», quando ele deveria confessar que habitualmente o acompanhava; ou ainda: «Irei com certeza», quando deveria dizer: «Irei, se puder». Tu não faças assim…
Tudo o que é contrário à verdade e à rectidão é uma mentira. Pode-se ainda mentir não somente por palavras, mas, também pelo silêncio de circunstância, por uma conduta hipócrita, etc.
Um homem com quem nunca se sabe onde se está, que não diz senão metade do que pensa, que está sempre a recorrer a subterfúgios, mente da mesma maneira que se sustentasse conscientemente uma coisa errónea.
A mentira é uma floresta virgem! Mais, a mentira é um monstro gerado pela língua; e os monstros de nascença nunca têm longa vida. Lá iremos na próxima reflexão.
Este comportamento foi bem revelador num julgamento que decorreu recentemente num tribunal em Lisboa. Os autores de uma carta aberta, difamatória, mentiram de forma tão descarada que só lhes faltou mudar de cor.
A mentira é mesmo uma floresta virgem.

*Director

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