Plinio Maria Solimeo
A crise pela qual passa a Igreja Católica atinge também as confissões protestantes e resulta em grande parte do desejo de estarem acordes com o espírito do mundo. Isso tem provocado o afastamento de muitos de seus fiéis. Um exemplo característico, na área protestante, é o da Igreja Anglicana do Canadá. Pelo fato de admitir mulheres como bispos e sacerdotes, o “casamento” homossexual, como também adotar uma posição dúbia em relação ao aborto, ela tem perdido tantos seguidores, que está fadada a desaparecer nos próximos 20 anos.
Além dos anglicanos oriundos da Igreja da Inglaterra, sua homóloga canadense inclui outras igrejas historicamente ligadas ao anglicanismo. Como se recorda, a Igreja Anglicana surgiu com o rompimento do lúbrico rei Henrique VIII [quadro ao lado] com a Igreja Católica no século XVI, por ela não aceitar seu divórcio com a rainha Catarina de Aragão. Ele se proclamou então Cabeça da “Igreja na Inglaterra”.
O cisma real foi agravado pela heresia, com a posterior aceitação de doutrinas luteranas e calvinistas.
Na América do Norte, depois da Revolução Americana, as congregações anglicanas dos Estados Unidos e do Canadá foram reorganizadas em igrejas autônomas, com seus proprios bispos e estruturas.
Ameaça de desaparecimento
Em 1961, 7% dos canadenses eram membros da Igreja Anglicana. A título de comparação, nessa época, antes do Concilio Vaticano II, a Igreja Católica no Brasil comportava cerca de 90% da população brasileira.
Em 1976 os anglicanos canadenses, a exemplo do que ocorria na Inglaterra, começaram a ordenar sacerdotisas; e, em 1994, bispas, e sua posição contra o aborto tornou-se dúbia. Isso levou a que, em 2001, apesar da chegada de muitos imigrantes anglicanos de países de língua inglesa, africanos ou asiáticos, seus fiéis cairam para 2% da população, isto é, somente 640 mil se declaravam membros dessa igreja.
Segundo dados de 2017, a Igreja Anglicana do Canadá só tem 360 mil membros, ou seja, apenas 1% de uma população de 35 milhões de habitantes. Em duas gerações, ela perdeu um milhão de fiéis, quase 75%.
Segundo um informe do McKerracher Reporter, calculava-se que a Igreja Anglicana no Canadá desapareceria por volta de 2060. Entretanto, com base nos novos dados, as webs conservadoras anglicanas calculam que sua extinção se dará em 2040, quer dizer, daqui a 20 anos ou mesmo antes, pois um número reduzido de fiéis não pode sustentar o clero e os edifícios, e, por conseguinte, a hierarquia e a liturgia.
É preciso dizer que, segundo as estatísticas, há um numero relativamente alto de clérigos. Mas isso se deve ao fato de a maioria deles não cobrar salário, pois trabalha no ministério sacerdotal apenas em tempo parcial; ou seja, um pouco aos domingos e em alguma tarde de fim de semana. Em geral, trata-se de aposentados — na sua grande maioria do sexo feminino —, que dedicam parte do tempo à paróquia.
Controvérsia sobre o “matrimônio” homossexual
Apesar de estar perdendo muitos fiéis, essa igreja continua avançando na linha da modernidade. Em meados de 2019, o Sínodo Geral da Igreja Anglicana do Canadá começou a debater a mudança da lei canônica para aprovar plenamente os “casamentos” entre pessoas do mesmo sexo. Mais de dois terços dos delegados leigos e clérigos votaram a favor. Mas como entre os bispos não houve unanimidade, não foram alcançados os dois terços necessarios para a aprovação. Contudo, o referido sínodo impôs uma resolução dizendo que, como não estava especificamente proibido casar duas pessoas do mesmo sexo, cada diocese podia decidir sobre fazer ou não essas uniões.
Entretanto, antes disso o bispo anglicano de Toronto, já em novembro de 2016, começou a celebrar “casamentos” homossexuais. E nesse mesmo ano um homossexual, tendo-se “casado” anglicanamente em dezembro de 2018, foi eleito seu bispo auxiliar.
Alternativas para os anglicanos conservadores
Como o assunto passou a ser da esfera dos bispos, alguns deles — como foi o caso de dois bispos e duas “bispas” da diocese do Artico — decidiram manter-se fiéis à doutrina conservadora, declarando-se “em estado de comunhão desigual” e de “diocese autodeterminada”, e afirmando que “nos reservamos o direito de não apoiar nem submeter-nos às decisões que violam a doutrina da igreja sobre o matrimônio”. Mas não foram adiante.
Embora cubra um terço do país, essa diocese fica numa região gelada e pouco habitada. Conta com 18 mil fiéis, de origem nativa ou esquimó, espalhados em paróquias diversas, muito conservadores e contrários ao “casamento” homossexual.
Os bispos não conformistas têm três grandes opções: criar, como outros já o fizeram e é muito comum entre os protestantes, sua própria igreja; somar-se à Anglican Church of North America — anglicana conservadora, pró-vida, pró-familia, que defende o matrimônio entre um homem e uma mulher, bem como os ensinamentos bíblicos; ou finalmente converter-se ao catolicismo, unindo-se ao Ordinariato Anglo-católico da Cátedra de São Pedro. Este Ordinariato foi fundado pela Constituição Apostolica Angligonorum Coetibus de Bento XVI para receber na Igreja Católica todos os clérigos e leigos convertidos da Igreja Anglicana.
Reação dos fiéis
Essas atitudes mais progressistas das igrejas anglicanas levaram a Igreja Episcopal a perder, além dos fiéis já mencionados, 517 paróquias. 100 mil episcopalianos, tanto dos Estados Unidos como do Canadá, cansaram-se do estado de confusão doutrinária e prática, e decidiram organizar sua propria Igreja Anglicana da América do Norte.
Alguns episcopalianos migraram então para essa Anglican Church of North America, mais conservadora; outros se fizeram católicos no Ordinariato Anglocatólico, que já conta com 43 paróquias nos Estados Unidos e no Canadá. Outros passaram para paróquias católicas normais. Ainda outros se fizeram protestantes evangélicos ou carismáticos. Entretanto, a maioria morre de velhice e não passa a fé aos seus filhos, ou quando não os tem, simplesmente fica em casa.
Consequência: uma paróquia inteira se torna católica
Um exemplo frisante é o da ex- paróquia anglicana de São João Evangelista, em Inglewood, Calgary, cujos fiéis votaram em bloco em 2010 para unir-se ao Ordinariato Católico quando este fosse criado.
Entretanto, como a criação do Ordinariato estava tardando, começaram a estudar com afinco o Catecismo da Igreja Católica e tomaram uma decisão: converter-se em uma paróquia católica “de uso anglicano do rito latino”, fórmula que já vinha sendo utilizada havia 30 anos com paróquias católicas dos Estados Unidos que antes foram anglicanas. Seguindo o exemplo de Inglewood, outras paroquias da Anglican Church of North America continuam a migrar para a Igreja Católica — migração que seria muitíssimo maior se não fosse sua presente crise de autodemolição, a partir do próprio papado.
Para terminar, cumpre ressaltar que, num país muito secularizado, 46% da população canadense — ou seja, 13 milhões — ainda se declaram católicos, embora somente 27% vão à Missa; outros 27% se declaram “não afiliados” a qualquer prática religiosa, e 7% se declaram simplesmente ateus.
ABIM
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Fontes:
Pablo J. Gins, disponível em: https://www.religionenlibertad.com/mundo/309217828/Un-iglesia-muy-liberal-y-feminista-que-se-muere-a-los-anglicanos-de-Canada-les-quedan-20-anos.html?utm_source=boletin&utm_medium=mail&utm_campaign=boletin&origin=newsletter&id=31&tipo=3&identificador=309217828&id_boletin=155125633&cod_suscriptor=452495753
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