terça-feira, 3 de novembro de 2015

Ingratidão

Ingratidão

Por Joaquim M. C. Carlos *

É muito difícil compreender certas contradições e paradoxos da vida. O exame metódico e sereno das coisas, feito por processos rigorosamente científicos, baseados numa segura e firme argumentação, não se aplica quando se pretende explicar determinados mistérios da alma humana, que escapam duma maneira geral à observação mais aguçada e minuciosa. Por isso, na necessidade de analisar esses sentimentos e de os explicar melhor ou pior, tem de se recorrer ao estudo de tantos outros factores que com eles estão relacionados, e depois, por deduções, bastantes ocasiões muitas vezes à «contrário sensu», concluir aquilo que parece estar mais conforme com as circunstâncias especiais no fenómeno.

Há sentimentos que desnorteiam e desorientam as mais sólidas teorias e entre eles figura, talvez, em lugar bem distinto, precisamente porque é dos mais vulgarizados, a ingratidão, nas suas múltiplas fórmulas e revelações externas. Não custa nada, por muito orgulhoso que seja, mostrar reconhecimento a quem nos fez um favor, e que, portanto, se soubermos ser delicados, nos pode vir a fazer muitos mais.

Agradecer é um sinal de superioridade de carácter, um pretexto para merecermos a confiança de amigos bons e sinceros, dos quais, naturalmente, podemos precisar, mais depressa do que se julga. E, apesar disto, os homens, ainda mal acabaram de receber uma gentileza, já estão esquecidos da mão que os amparou com o benefício, quando não pagam com qualquer grosseria a benevolência tida. Quando eu encontro alguém que sabe ser reconhecido, fico admirado, admirando a superioridade desse alguém o que é tão raro nos dias que correm.

Os homens obcecados na alucinada demência duma maldade feroz e egoísta, esquecem o que convém às suas conveniências, agradecer para receber, pois não é com «espinhos que se colhem rosas»...

Ocultos atrás dum sorriso alvar, escondidos na mesquinha insolência duma inteligência que a maldade desvaria à multidão é difícil sentir prazer espiritual da gratidão.

Reconhecer uma fineza, é admitir em alguém uma virtude, prestar-lhe homenagem, elevá-la, e essas criaturas não sabem mais do que rebaixar os outros, difamar todas as intenções honestas e todos os esforços generosos.

Ser reconhecido e agradecer, é prestar um alto acto de Justiça e, devemos confessá-lo, se o verdadeiro sentido da Justiça não existe na maioria dos homens, também não pode existir neles o sentido abençoado da gratidão.

Tenho sentido na pele a feroz ingratidão desde a fundação desta associação, que por sua vez se torna difícil explanar. Por vezes surge do lado que menos esperava, mas, o ser humano na sua maioria é assim, é ingrato, é mau e tem memória curta.

Apesar de tudo a obra está ai, os resultados alcançados falam por si deitando por terra a incredibilidade que muitos revelaram e profetizaram contra este projecto desde o seu início. São necessárias pessoas que estejam motivadas para elevar ainda mais a ADASCA, e não as motivadas pelo fingimento, inveja, intriga e ingratidão, com o intuito de a destruir, existe algumas destas ervas daninhas no seu interior, que em muito me têm infernizado a vida.

Para poucos a ADASCA é filha, para alguns é sobrinha e para muitos é enteada. É nesta última condição que desde sempre tem sido tratada. Haja respeito pelo trabalho que tem sido desenvolvido em prol da comunidade necessitada.

“Existem três classes de ingratos: os que silenciam diante do favor; os que o cobram e os que se vingam.” (Ramón y Cajal). Mais: ““O indivíduo infiel é tão perigoso como o mentiroso. Ambos são fracos, ingratos e constroem castelos sem fundações”. Textos Judaicos.

*Presidente da Direcção da ADASCA.

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