Portugal não pôs em prática – ou só o fez parcialmente – medidas recomendadas pela Comissão Europeia contra o Racismo e a Intolerância sobre comunidades ciganas, continuando a faltar a recolha de dados e a simplificação de procedimentos.
Num documento divulgado esta terça-feira, a Comissão Europeia contra o Racismo e a Intolerância (ECRI) apresenta as suas conclusões, a propósito da aplicação das recomendações feitas a Portugal pelo organismo em 2013.
Na altura, o ECRI – um organismo independente do Conselho da Europa, especializado nas questões de luta contra o racismo e a intolerância – fez uma série de recomendações a Portugal, no âmbito doquarto relatório sobre o país.
Agora, dois anos depois, o organismo fez o acompanhamento dessas recomendações, e chegou à conclusão de que algumas não foram aplicadas, enquanto outras o foram apenas parcialmente.
De acordo com os dados do Conselho da Europa, Portugal tem uma comunidade cigana entre 40 mil e 70 mil pessoas (0,52% da população), quase todas de nacionalidade portuguesa, que continuam a deparar-se com sérios problemas de igualdade de direitos e de integração.
O ECRI começa pela questão da recolha de dados e lembra que, em 2013, incitou as autoridades nacionais a desenvolverem um sistema de monitorização que recolhesse dados, fosse por autoridades governamentais ou instituições académicas, e mostrasse que grupos são alvo de discriminação.
Segundo a ECRI, as autoridades portuguesas referiram que foi criado o Observatório das Comunidades Ciganas, que realizou um estudo nacional, e lembraram também o trabalho do Observatório das Migrações, cujo trabalho tem ajudado a melhor definir, aplicar e avaliar políticas com vista à integração dos imigrantes.
A ECRI elogia o passo dado para a recolha de dados, tanto pelo Observatório das Migrações como pelo Observatório das Comunidades Ciganas, mas entende que continua a faltar um sistema de monitorização que possibilite a recolha de dados que mostrem se há grupos em particular que estão em desvantagem ou são discriminados.
“Além disso, o estudo referido não faz um retrato completo da situação das comunidades ciganas no país, já que apenas metade dos municípios foram envolvidos. Nesse sentido, a ECRI entende que esta recomendação foi apenas parcialmente implementada”, lê-se no documento.
Segregação
Os ciganos encontram numerosas dificuldades nos domínios do educação, emprego, cuidados de saúde e habitação. Além disso, a discriminação faz parte da sua vida quotidiana.
Em 2013, a ECRI tinha “fortemente recomendado” a Portugal que simplificasse e acelerasse os procedimentos relativos à apresentação de queixas ao Alto Comissariado para as Migrações (ACM) e, nesse âmbito, que as autoridades ponderassem formas de pôr em prática “o princípio da partilha do ónus da prova”.
Na resposta, as autoridades nacionais informaram que estão em vias de publicar uma nova lei contra a discriminação, mas “não deram qualquer indicação sobre se a nova lei introduz alterações que simplifiquem e acelerem os procedimentos”, o que levou a ECRI a entender que estas recomendações não foram adotadas.
Por último, o organismo lembra que pediu a Portugal para eliminar todas e quaisquer barreiras físicas que segregassem as comunidades ciganas, lembrando um caso, no distrito de Beja, em que havia ummuro de 100 metros de comprimento a separar uma comunidade de cerca de 400 pessoas ciganas do resto da população.
Sobre esta matéria, Portugal não deu qualquer esclarecimento, mas o ECRI conseguiu saber que o muro acabou por ser demolido pelos próprios ciganos e que, na sequência disso, o presidente da Câmara Municipal de Beja, juntamente com várias associações, tomou a iniciativa de melhorar o local.
Apesar de admitir que o resultado satisfatório foi obtido, não por medidas governativas, mas por força da comunidade cigana, a ECRI entende que a medida foi apenas parcialmente aplicada, já que não obteve informação sobre a existência de outras barreiras do género e do que está a ser feito para as derrubar.
No relatório de 2013, era referido um grande número de ciganos que ainda vivia em acampamentos de barracas ou de tendas, onde faltam frequentemente as infraestruturas de base, como o acesso a água potável, a eletricidade ou a evacuação das águas usadas.
AF, ZAP / Lusa
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