quinta-feira, 7 de julho de 2016

Comissão abre processo inédito que pode levar a sanções a Portugal

Executivo comunitário declara que Portugal não tomou medidas eficazes para cumprir as recomendações do Conselho e abre o processo que pode levar a que até Agosto Portugal possa ser alvo de sanções.
A Comissão Europeia concluiu esta quinta-feira que Portugal e Espanha não tomaram medidas eficazes para cumprir as recomendações do Conselho da União Europeia, abrindo, pela primeira vez, um processo que pode levar a sanções pela violação das regras orçamentais. A medida não implica em si sanções para já, mas, caso seja aprovada na próxima semana pelos ministros das Finanças, obriga a Comissão Europeia a propor sanções antes do final do mês.
Como era esperado, a Comissão Europeia concluiu que Portugal e Espanha não tomaram as medidas necessárias para reduzir os seus défices e faz uma única proposta, para já, aos ministros das Finanças da União Europeia: que aprove uma norma a dizer que “Portugal não tomou medidas eficazes em resposta à Recomendação do Conselho de 21 de junho de 2013”.
Em comunicado, a Comissão confirma que o Colégio de Comissários “confirmou que Portugal não corrigiu o seu défice excessivo dentro do prazo estabelecido (2015)”.
Para além de ainda não serem conhecidas as propostas da Comissão para sanções, não é feita também a proposta de novo limite para que Portugal corrija o seu défice excessivo, ainda que anteriormente os comissários europeus já tenham adiantado que pretendem que Portugal tenha apenas mais um ano, ou seja, até ao final deste ano.
Com isto, a Comissão livra-se para já de propor sanções, passando a batata quente ao Ecofin, que se vai reunir na próxima terça-feira em Bruxelas. Se os ministros aprovarem a proposta da Comissão, as sanções, sejam elas quais forem, terão de ser adotadas no máximo antes da primeira metade de agosto.
A Comissão justifica a decisão lembrando que Portugal estava obrigado a acabar com o défice excessivo, que se verificava desde 2009, até ao ano de 2015 — um prazo que foi alargado por duas vezes. Em 2015, Portugal estava obrigado a reduzir o défice para 2,5% do PIB, mas acabou por ficar em 4,4%, um valor que conta com o apoio ao Banif na parte final do ano. Mas não é só o défice nominal que conta, e no que diz respeito ao ajustamento estrutural o não cumprimento das metas é ainda mais evidente: Portugal tinha de fazer um ajustamento estrutural de 2,4% do PIB entre 2013 e 2015, mas só chegou aos 1,1%. No ano passado, em vez de esforço estrutural houve um agravamento deste défice.
“Estima-se que o esforço orçamental acumulado empreendido por Portugal no período entre 2013 e 2015 tenha ficado significativamente aquém do recomendado pelo Conselho, o que leva a concluir que a resposta de Portugal à recomendação do Conselho não foi suficiente”, diz a Comissão Europeia.
A Comissão explica ainda que a apreciação feita em relação à adoção de medidas eficazes “baseia-se apenas na análise de dados orçamentais passados destes dois países. Embora ambos os países tenham conseguido uma consolidação orçamental significativa desde que os respetivos défices atingiram níveis culminantes no auge da crise financeira, esse esforço ficou aquém dos objetivos fixados pelo Conselho, tanto em termos nominais como de esforço orçamental estrutural”.
“O défice nominal de Portugal diminuiu de 11,2 % do PIB em 2010 para 4,4 % em 2015, ao passo que a meta recomendada para 2015 era de 2,5 % do PIB. O esforço orçamental estrutural acumulado durante o período 2013-2015 estima-se em 1,1 % do PIB, o que é significativamente inferior aos 2,5 % do PIB recomendados pelo Conselho. Após ter atingido um ponto culminante de 130,2 % do PIB em 2014, a dívida pública continuava a ser elevada, situando-se em 129,0 % do PIB em 2015”, diz o comunicado.

Valdis Dombrovskis, que apresenta os resultados, é citado no comunicado elogiando os esforços dos dois países, mas lembrando que “ultimamente os dois países desviaram-se do caminho da correção dos seus défices excessivos e não atingiram os seus objetivos orçamentais”
“Estamos dispostos a trabalhar em conjunto com as autoridades espanholas e portuguesas a fim de definir a melhor via a seguir. A redução dos elevados níveis de défice e de dívida é um pré-requisito indispensável para um crescimento económico sustentável em ambos os países”, diz o vice-presidente da Comissão para o Euro, Valdis Dombrovskis.
Pierre Moscovici, comissário responsável pelos Assuntos Económicos e Financeiros, espera que os ministros aprovem a recomendação e deem início ao processo, na reunião da próxima semana, e garante que a Comissão sempre agiu de acordo com as regras, depois de ter sido alvo de críticas pelo adiamento, por mais de uma vez, da tomada de decisão, por vários ministros das Finanças europeus.
“A Comissão sempre agiu, age e continuará a agir em conformidade com as regras do Pacto de Estabilidade e Crescimento. Trata-se de regras complexas mas inteligentes, que devem ser aplicadas de forma inteligente pela Comissão e pelo Conselho. Trabalharemos em conjunto com Espanha e Portugal para alcançar um entendimento comum sobre os compromissos políticos que devem ser assumidos”, diz o comissário.
O processo é complexo, e inédito, mas tentamos explicar aqui o que está em causa.
Do défice excessivo à violação das recomendações
Quando um Estado-membro viola as metas do défice, é aberto um procedimento por défice excessivo a esse país. O país recebe então uma recomendação para reduzir o défice excessivo até uma certa data (um certo número de anos).
Ao abrigo das regras orçamentais, o país tem que mostrar que tomou medidas para reduzir o défice para os valores acordados dentro do prazo previsto.
Se o Estado-membro não cumprir a recomendação, seja em termos de défice nominal ou em termos de ajustamento estrutural, a Comissão deve adotar uma recomendação onde conclui que não foram tomadas medidas eficazes para reduzir o défice na data prevista, e dar uma nova data limite para que o défice seja reduzido.
As sanções possíveis
Aprovada a conclusão de que o país não tomou medidas eficazes para cumprir as recomendações do Conselho da União Europeia (composto pelos ministros das Finanças da União Europeia), abre-se um importante processo legal que pode ter sérias consequências para o país em causa.
Multas
Aprovada no Conselho a conclusão de que o país não tomou medidas eficazes, a Comissão passa a ter 20 dias para apresentar uma nova recomendação ao Conselho sobre o país em causa, impondo uma multa. A multa prevista automaticamente é de 0,2% do PIB do ano anterior.
No entanto, a Comissão pode propor uma redução dessa multa (até zero) ou simplesmente cancelá-la. Mas, para que isso aconteça, tem de o justificar com circunstancias económicas excecionais ou aceitando como boas as justificações do país para a violação das metas, numa defesa que o país pode apresentar num prazo máximo de 10 dias após a decisão do Conselho.
Se a multa for aplicada, o Estado-membro tem de fazer um depósito junto do fundo de resgate europeu, o Mecanismo Europeu de Estabilidade. Esse depósito não rende juros ao país e é transformado em multa a fundo perdido se o incumprimento for repetido (havendo lugar a mais multas se isso acontecer).
Suspensão dos fundos estruturais
Uma vez aprovada a conclusão da ausência de medidas eficazes, a Comissão é obrigada a propor a suspensão de parte dos fundos estruturais que o país deve receber no ano seguinte ao ano em que é aprovado este processo.
A suspensão a impor tem de ser a menor destes dois limites: a suspensão de, no máximo, 50% dos fundos estruturais e de investimento para o ano financeiro seguinte; ou um máximo de 0,5% do PIB nominal.
O nível do congelamento pode ainda ser mitigado tendo em conta alguns fatores económicos relevantes: a taxa de desemprego do país; a fatia da população em risco de pobreza e exclusão social; e anos consecutivos de contração económica.
Vigilância mais apertada
Para além de eventuais sanções ou suspensão de fundos estruturais, que são claramente as medidas mais gravosas, o país pode também passar a ser alvo de uma vigilância mais apertada que poderá passar por:
·         Análise prévia da Comissão ao programa de financiamento do país, que detalha os planos de emissão de dívida.
·         Visitas trimestrais para acompanhar a evolução do défice a cada seis meses ou mesmo três meses, tal como durante o programa de resgate. Durante essas visitas, a Comissão pode concluir que o país precisa de tomar mais medidas para corrigir o défice e exigir que assim aconteça, mas apenas se a estabilidade financeira da zona euro puder ser afetada pela instabilidade nesse país.
·         O Banco Europeu de Investimento pode reconsiderar os empréstimos ao Estado-membro em causa.
Calendário
Ao fim de 20 dias, a Comissão apresenta a sua proposta. A partir daí contam mais dez dias para que o Conselho da União Europeia possa votar a proposta da Comissão e, se assim entender, rejeitar a proposta por maioria qualificada.
Mas a votação do Conselho não é obrigatória. A mudança nas regras orçamentais implica que a proposta de sanções da Comissão Europeia seja adotada automaticamente ao fim de dez dias depois de apresentada, caso não seja rejeitada pelo Conselho. Ou seja, a proposta tem sempre de ser adotada antes de setembro, mesmo que os ministros não se voltem a reunir, o que é improvável ainda assim.
O calendário será, portanto, este:
·         Comissão adota decisão a declarar que os países não tomaram medidas para cumprir as recomendações do Conselho.
·         Ecofin reune-se dia 12 para aprovar a decisão.
·         Comissão Europeia tem 20 dias para propor sanções, Portugal e Espanha têm dez dias para se defender.
·         Feita a proposta de sanções, o Conselho da União Europeia tem 10 dias para se pronunciar. Caso não rejeite por maioria qualificada, as sanções são aprovadas. Se o Conselho não se pronunciar, as sanções são aprovadas automaticamente.


Fonte: observador
Comentário: Portugal tem sido governado por uma espécie de abutres e quebra ossos.
J. Carlos

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