“Na confusão da Terra, abriram-se os Céus e a Virgem apareceu em Fátima para dizer aos homens a verdade. Verdade austera, de admoestação e penitência, mas verdade rica em promessas de salvação. O milagre de Fátima se repetiu [...] para atestar que as ameaças de Deus continuam a pairar sobre os homens, mas que a proteção da Virgem jamais abandonará a Igreja e seus verdadeiros filhos”.1
Fátima — evocativo nome que lembra bênçãos, graças, esperanças, misericórdias, mas também castigos. Nome que ecoa pelo mundo há exatos 100 anos, quando Deus enviou à Terra sua própria Mãe como embaixadora para alertar os homens.
Fátima — basta alguém pronunciar este abençoado nome para que católicos (e até mesmo não católicos) de todo o orbe sintam um toque sobrenatural no coração, saudades da inocência primaveril da vida espiritual, um chamado a abrir suas almas à graça divina.
Fátima — palavra sacrossanta que simplesmente pronunciada evoca lembranças de conversões, de prêmios e punições regeneradoras anunciadas pela Rainha do Céu, que também será Rainha efetiva na Terra, sobretudo quando for implantado o Reinado de seu sapiencial, maternal e imaculado coração.
Fátima — palavra que adquire sonoridade especial neste centenário das aparições de Nossa Senhora a Lúcia, Jacinta e Francisco. Sonoridade sacral como a do mais famoso verso cantado em todas as línguas:
A treze de maio na Cova da Iria
No Céu aparece a Virgem Maria!
Como é mundialmente reconhecido, o maior propagador da mensagem de Nossa Senhora de Fátima no século passado foi o Prof. Plinio Corrêa de Oliveira (1908–1995), principal colaborador de Catolicismo. Assim, se ainda estivesse entre nós, a ele recorreríamos para pedir-lhe uma matéria exclusiva e/ou entrevista para publicarmos neste centenário das aparições da “Senhora mais brilhante que o sol” aos três pastorzinhos nos idos de 1917.
Não sendo isso possível, compulsamos no vastíssimo acervo intelectual que ele nos legou — conferências, artigos, entrevistas e livros — alguns textos sobre Fátima, e encontramos matéria abundante. As análises desse grande pensador e líder católico, que desde muito jovem procurou investigar tudo que fosse concernente a Fátima, parecem até mais atuais do que naqueles dias das aparições aos pequenos pastores de Aljustrel, nas quais a Santíssima Virgem anunciava ao mundo os terríveis castigos e as grandes recompensas e conversões caso os homens atendessem a seus pedidos.
Assim, o Prof. Plinio dedicou-se a essa extraordinária divulgação — inicialmente nas páginas do “Legionário”, então órgão oficioso da Arquidiocese de São Paulo, do qual era diretor, e a partir de 1951 através do “Grupo de Catolicismo” —, a qual atingiu maior expansão com o nascimento da Sociedade Brasileira de Defesa da Tradição, Família e Propriedade (TFP), por ele fundada em 1960. Sociedades coirmãs e autônomas foram se sucedendo em vários países, nos quais também se incumbiam de propagar a Mensagem de Fátima.
O triunfo do Imaculado Coração de Maria, o que pode ser?
Vitória que será total e completa quando se efetivar o Reinado do Imaculado Coração de Maria — o ressurgimento revigorado e maravilhoso de uma civilização autenticamente católica, toda voltada para Nosso Senhor Jesus Cristo e sua Santíssima Mãe. Uma civilização “austera e hierárquica, fundamentalmente sacral, anti-igualitária e antiliberal”.2 Essa vitória total e completa, quando se dará? O futuro só a Deus pertence, mas uma das grandes certezas de Plinio Corrêa de Oliveira sempre foi essa vitória da Contra-Revolução3 e o triunfo da Santa Mãe de Deus com o advento do Reino de Maria.
Ao reproduzir aqui os trechos mais elucidativos do líder da Contra-Revolução sobre Fátima, Catolicismo não deseja senão continuar nos passos de seu principal colaborador, que orientou nossa revista a expandir ao máximo as advertências e as promessas de Nossa Senhora na Cova da Iria.
Em uma matéria redigida para Catolicismo, ele indagava: “O triunfo do Imaculado Coração de Maria, o que pode ser, senão o reinado da Santíssima Virgem, previsto por São Luís Maria Grignion de Montfort? E esse reinado, o que pode ser, senão aquela era de virtude em que a humanidade, reconciliada com Deus, no regaço da Igreja, viverá na Terra segundo a Lei, preparando-se para as glórias do Céu?”4
Esse restabelecimento da ordem católica no mundo, segundo a concepção desse grande santo e missionário francês (1673-1716), é o modo mais adequado para a instauração na Terra do Reinado de Nosso Senhor Jesus Cristo:
“Quando virá este tempo feliz em que Maria será estabelecida Senhora e Soberana nos corações, para submetê-los plenamente ao império de seu grande e único Jesus? Quando chegará o dia em que as almas respirarão Maria, como o corpo respira o ar? Então, coisas maravilhosas acontecerão neste mundo, onde o Espírito Santo, encontrando sua querida Esposa como que reproduzida nas almas, a elas descerá abundantemente enchendo-as de seus dons, particularmente do dom da sabedoria, a fim de operar maravilhas da graça. Meu caro irmão, quando chegará esse tempo feliz, esse século de Maria, em que inúmeras almas escolhidas, perdendo-se no abismo de seu interior, se tornarão cópias vivas de Maria, para amar e glorificar Jesus Cristo? Esse tempo só chegará quando se conhecer e praticar a devoção que ensino, Ut adveniat regnum tuum, adveniat regnum Mariae” (Que venha o Reino de Maria, para que assim venha o vosso Reino — ou seja, o Reino de Jesus Cristo).5
Condições para a plena e autêntica conversão da humanidade
Mas, para que tal triunfo da Cristandade fosse possível, Nossa Senhora pediu em Fátima a Consagração da Rússia ao Imaculado Coração de Maria, além de oração, penitência, conversão dos homens e a difusão da devoção à Comunhão Reparadora nos primeiros sábados do mês.
Notamos em nossos dias uma humanidade convertida? — O que vemos é precisamente o contrário: a fuga de qualquer penitência e conversão; a busca desenfreada de uma vida uma “vida deliciosa” e hedonista, oposta aos preceitos divinos, cheia dos deleites pecaminosos da sensualidade, sendo poucos aqueles que desejam se sacrificar e lutar em prol da Santa Igreja Católica Apostólica Romana.
Notamos que a prática de “Comunhão Reparadora” se estendeu pelo mundo inteiro? — Infelizmente, também não! Essa devoção foi negligenciada por boa parte do clero, sobretudo por aqueles eclesiásticos da chamada “Igreja progressista”, atados às ideias da “Teologia da Libertação”. A tal respeito, em sua primeira carta dirigida ao Papa Pio XII, em 1940, a Irmã Lúcia escreveu:
“Pediu [Nossa Senhora] se propagasse no mundo a Comunhão Reparadora nos primeiros Sábados de cinco meses seguidos, fazendo com o mesmo fim uma confissão, um quarto de hora de meditação sobre os mistérios do Rosário e rezando um terço com o fim de reparar os ultrajes, sacrilégios e indiferenças cometidos contra o seu Imaculado Coração. Às pessoas que praticarem esta devoção, promete a Nossa boa Mãe do Céu, assistir na hora da morte com todas as graças necessárias para se salvarem”.6
“O acontecimento mais importante e mais empolgante do Século XX”
Fátima é sem dúvida uma das mais importantes mensagens marianas de toda a História da Igreja. Conforme o engenheiro Antonio Augusto Borelli Machado, fatimólogo de renome internacional e autor do best-seller As aparições e a mensagem de Fátima conforme os manuscritos da Irmã Lúcia — publicado em primeira mão por Catolicismo em maio de 1967 e que já ultrapassou os cinco milhões de exemplares em 20 línguas e 30 países —, “pode-se afirmar categoricamente e sem o menor receio de contradita, que as aparições de Nossa Senhora de Fátima e do Anjo da Paz em Fátima constituem o acontecimento mais importante e mais empolgante do Século XX”.7
Talvez nossos leitores mais recentes ainda não tenham tomado conhecimento dessa obra, que julgamos fundamental para se ter uma ideia de conjunto de todas as aparições da Senhora de Fátima aos três pastorzinhos. Neste caso, recomendamos vivamente sua aquisição, que pode ser feita através do site da Livraria Petrus.8 Deste mesmo conceituado especialista na temática relativa às mensagens de Fátima recomendamos ainda a leitura de sua entrevista sobre os famosos “segredos de Fátima”, publicada em nossa edição de novembro último.
“Era uma Senhora vestida toda de branco, mais brilhante que o sol”
Para se compreender melhor alguns pontos essenciais da sacrossanta mensagem, vamos rememorar, contextualizar e analisar aqui mais detidamente apenas a terceira aparição (13 de julho de 1917), porquanto uma análise de todas as aparições comportaria um volumoso livro. Contudo, convém antes deixar consignado sinteticamente o seguinte: Nossa Senhora apareceu seis vezes aos três pastorzinhos (entre 13 de maio e 13 de outubro de 1917) na aldeiazinha portuguesa de Aljustrel, na região de Fátima, enquanto eles cuidavam de algumas ovelhas na Cova da Iria. Portanto, essas seis aparições ocorreram ainda em meio à primeira conflagração mundial (1914–1918).
Entre outras sublimes e apocalípticas palavras, a Santíssima Virgem lhes disse: “Vim para vos pedir que venhais aqui seis meses seguidos, no dia 13, a esta mesma hora. Depois vos direi quem sou e o que quero. Depois voltarei ainda aqui uma sétima vez. [...] Rezem o terço todos os dias, para alcançarem a paz para o mundo e o fim da guerra”.9
Assim Lúcia descreveu essa primeira aparição: “E começamos a descer a encosta, tocando as ovelhas em direcção à estrada. Ao chegar, mais ou menos a meio da encosta, quase junto duma azinheira grande que aí havia, vimos outro relâmpago e, dados alguns passos mais adiante, vimos, sobre uma carrasqueira, uma Senhora, vestida toda de branco, mais brilhante que o Sol, espargindo luz, mais clara e intensa que um copo de cristal, cheio d’água cristalina, atravessado pelos raios do sol mais ardente. Parámos surpreendidos pela aparição. Estávamos tão perto, que ficávamos dentro da luz que A cercava ou que Ela espargia, talvez a metro e meio de distância, mais ou menos”.10
Algumas profecias de Fátima já realizadas, e outras ainda não
Na já citada terceira aparição, Nossa Senhora — após ter mostrado o inferno a Lúcia, Jacinta e Francisco [vide quadro no final, denominado LÚCIA DESCREVE A VISÃO DO INFERNO] — prevê o fim da Primeira Grande Guerra e a ameaça de outra hecatombe: “A guerra vai acabar. Mas se não deixarem [os homens] de ofender a Deus, no reinado de Pio XI começará outra pior.11 Quando virdes uma noite alumiada por uma luz desconhecida, sabei que é o grande sinal que Deus vos dá de que vai a punir o mundo de seus crimes, por meio da guerra e de perseguições à Igreja e ao Santo Padre.
“Para a impedir, virei pedir a consagração da Rússia a Meu Imaculado Coração e a Comunhão reparadora nos primeiros sábados. Se atenderem a Meus pedidos, a Rússia se converterá e terão paz; se não, espalhará seus erros pelo mundo, promovendo guerras e perseguições à Igreja. Os bons serão martirizados, o Santo Padre terá muito que sofrer, várias nações serão aniquiladas. Por fim, o Meu Imaculado Coração triunfará”.12
Ouvindo a celestial voz de Fátima, não endureçamos nossos corações
Quando a primeira conflagração mundial parecia chegar a seu desfecho, e nos bastidores políticos já se confabulava a configuração que o mundo teria na nova era pós-guerra, Plinio Corrêa de Oliveira analisou o acontecimento nas páginas do “Legionário”, de onde extraímos os seguintes trechos:
“Quando começavam a delinear-se apenas, timidamente, as primeiras linhas desse mundo novo, verificou-se um dos fatos mais consideráveis da História contemporânea. Em nosso mundo são muitos os céticos que não acreditam nesse fato. Os que não são céticos são tímidos, e não ousam proclamar os fatos em que acreditam. Uns por falta de Fé, outros por falta de coragem, não ousam incorporar à História contemporânea esse acontecimento. Mas os mais graves motivos sobre que a inteligência humana pode basear-se aí estão patentes, a atestar que Nossa Senhora baixou dos Céus à Terra, e que manifestou a três pequenos pastores de um recanto ignorado e perdido do pequeno Portugal, as condições verdadeiras, os fundamentos indispensáveis para a reorganização do mundo. Ouvida essa mensagem, a humanidade encontraria verdadeiramente a paz. Negada, ignorada essa mensagem, a paz seria falsa e o mundo imergiria em nova guerra. A guerra veio. A guerra aí está. Cogita-se agora de reorganizar novamente o mundo. Nenhum momento é mais oportuno do que este, para recordar a aparição de Nossa Senhora em Fátima. […]
“Antes de tudo, notemos que ela é absolutamente ortodoxa. Não é fácil inventar uma mensagem ortodoxa. Muito figurão ‘católico’ que serve para discursos de inauguração, de luto, etc. etc. etc., toma um cuidado tremendo para não preparar um discurso que cheire a heresia… e solta duas ou três heresias em seu discurso. Ora, todas, absolutamente todas as palavras da Senhora aos pequenos pastores são de uma ortodoxia absoluta. Tratando temas complexíssimos, Ela nem uma só vez erra em doutrina. Positivamente, isto não poderia ser invenção de pequenos pastores.
“Mas há mais. A mensagem da Senhora, que sobreveio precisamente no momento crucial em que se preparava o pós-guerra, desprezando as manifestações aparatosas de falso patriotismo e de cientificismo dos ‘técnicos’, colocou com grande simplicidade todas as coisas em seus termos únicos e fundamentais. A guerra fora um castigo do mundo, por sua impiedade, pela impureza de seus costumes, por seu hábito de transgredir os domingos e dias santos. Isto resolvido, todos os assuntos se resolveriam por si. Isto não resolvido, todas as soluções nada resolveriam… E se o mundo não ouvisse a voz da Senhora, se ele não respeitasse esses princípios, nova conflagração viria, precedida de fenômeno celeste extraordinário. E essa conflagração seria muito mais terrível que a primeira.
“Reuniram-se os técnicos — que são hoje os reis da Terra, juntamente com os banqueiros — et convenerunt in unum adversus Dominus. Construíram uma paz sem Cristo, uma paz contra Cristo. O mundo se afundou ainda mais no pecado, a despeito da mensagem de Nossa Senhora. Em Fátima, os milagres se multiplicavam às dezenas, às centenas, aos milhares. Ali estavam eles, acessíveis a todos, podendo ser examinados por todos os médicos de qualquer raça ou religião. As conversões já não tinham número. E, tudo isto não obstante, ninguém dava ouvidos a Fátima. Uns duvidavam sem quererem estudar. Outros negavam sem examinar. Outros criam mas não tinham coragem de o dizer. A voz da Senhora não se ouviu. Passaram-se mais de 20 anos. Um belo dia, sinais estranhos se viram no Céu… era uma aurora boreal, noticiada por todas as agências telegráficas da Terra. Do fundo de seu convento, Lúcia escreveu a seu Bispo: era o sinal, e dentro em breve a guerra viria. A guerra veio dentro em breve. Ela está aí e hoje se cuida novamente de ‘reorganizar o mundo’, aos últimos clarões desta luta potencialmente já vencida.
“Si vocem ejus hodie audieritis, nolite obdurare corda vestra (‘Se hoje ouvirdes Sua voz, não endureçais vossos corações’), diz a Escritura. Inscrevendo a festa de Nossa Senhora de Fátima no rol das celebrações litúrgicas, a Santa Igreja proclama a perenidade da mensagem de Nossa Senhora dada ao mundo através dos pequenos pastores. No dia de sua festa, mais uma vez a voz de Fátima chegou a nós: não endureçamos nossos corações, porque só assim teremos achado o caminho da paz verdadeira”.13
Desabamento do czarismo, implantação do comunismo na Rússia
Devido ao não atendimento do maternal pedido de Nossa Senhora, comunicado na aparição de Fátima acima referida, explode alguns meses depois a Revolução Comunista na Rússia, também 100 anos atrás. Comenta o Prof. Plinio:
“Em 1917, um novo sopro de espírito revolucionário varreu a Europa. Deu-se o imenso estrondo do desabamento do czarismo, e se implantou o comunismo na Rússia. Toda a vida intelectual e social se seccionou ainda mais do passado. No Ocidente, a hegemonia se deslocava cada vez mais da Europa tradicional para os Estados Unidos niveladores”.14
Fator que “contribui para dar à Mensagem um peso extraordinário”
Na linha da previsão da Senhora de Fátima a respeito “dos erros da Rússia” (questão que, em julho de 1917, fora de difícil compreensão, uma vez que a Revolução Comunista ainda não havia eclodido), Plinio Corrêa de Oliveira escreveu, em maio de 1962, um artigo para a revista “Cruzado Espanhol”, de Barcelona:
“Perto de meio século depois de anunciado por Nossa Senhora — caso seus pedidos não fossem atendidos e o mundo não fizesse penitência a Rússia espalharia seus erros por toda a parte — é forçoso reconhecer que os homens não fizeram penitência, e de fato o mundo inteiro está convulsionado pela ação dos erros que a Rússia está espalhando por toda a parte [...]
“Há uma circunstância que torna particularmente digna de nota essa profecia. É que ela foi anunciada aos pastorzinhos de Fátima por Nossa Senhora em 13 de julho de 1917. Ora, nessa data, a própria Rússia ainda não se fizera comunista, pois a revolução irrompeu a 7 de novembro desse mesmo ano. Isto é, nem ela mesma abraçara os erros dos quais, segundo a revelação de Nossa Senhora, se faria propagadora mundial. Aquilo que a três pequenos pastores analfabetos havia sido anunciado como certo, inúmeros estadistas europeus, americanos ou asiáticos nem de longe o previam.
“Este particular muito contribui para dar à Mensagem de Fátima um peso extraordinário”.
Cumprida a previsão da hecatombe mundial pior que a primeira
Ainda na revelação acima mencionada (do dia 13 de julho), na qual a Santíssima Virgem alertou que “[se os homens] não deixarem de ofender a Deus, no reinado de Pio XI começará outra [guerra] pior”, pairavam um pedido e uma ameaça: se seu pedido não fosse atendido, viria uma guerra ainda pior. A humanidade ficou surda à celestial voz de Fátima, e a hecatombe eclodiu, envolvendo o mundo inteiro. [vide quadro no final, denominado FÁTIMA — EXPLICAÇÃO E REMÉDIO DA CRISE CONTEMPORÂNEA].
Em março de 1938, a Alemanha nazista anexou a Áustria e, em seguida, o território sudeto. Discernindo os acontecimentos, o Prof. Plinio fez um prognóstico num artigo publicado no “Legionário”: “A guerra é uma questão de dias, ou de meses, mas fatalmente explodirá”.15
Ela não tardou. Em 1º de setembro do ano seguinte, o Führer alemão ordenou a invasão da Polônia. A Grã-Bretanha e a França declararam guerra ao invasor nazista. Iniciou-se a Segunda Grande Guerra. Os Estados Unidos somente entrariam no conflito em 1941, após o bombardeio lançado pelos japoneses contra a base naval norte-americana de Pearl Harbor, no Pacífico.
Após seis anos de conflito, resultou um mapa mundial completamente mudado, fracionado em dois blocos: a URSS, que graças ao Tratado de Yalta abocanhou vários países, especialmente do Leste europeu, escravizando-os, escravizando-os, segregando-os do Mundo Livre e separando-os com uma “Cortina de Ferro”, segundo a feliz expressão de Churchill; e o mundo não comunista, sob a liderança dos Estados Unidos.
Erros espalhados pelo mundo e “fumaça de Satanás” na Igreja
Quase todas as previsões da Santa Mãe de Deus na terceira aparição de Fátima se cumpriram: o término da Primeira Grande Guerra um ano depois; a Rússia espalhou intensamente seus erros pelo mundo inteiro; a mencionada perseguição à Igreja e aos bons, ora cruenta, ora moral, é um fato doloroso e cotidiano — basta recordar as invasões e investidas islâmicas no mundo inteiro; os católicos sendo martirizados em diversos países; no Ocidente, leis ímpias contrárias à Lei Deus e à Lei Natural destroem a instituição familiar (divórcio, controle artificial da natalidade, aborto, eutanásia, Ideologia de Gênero, “casamento” homossexual e adoção de crianças por esses “casais” etc.); os verdadeiros fiéis enfrentam o martírio de alma devido à imoralidade galopante e à sociedade cada vez mais distanciada dos preceitos divinos; o processo de “autodemolição da Igreja” registrado por Paulo VI após o Concílio Vaticano II, quando afirmou: “Por alguma fissura a fumaça de Satanás entrou no templo de Deus”.16 Constatamos assim um panorama assustador, na Igreja e no mundo.
Perecimento de tradições, naufrágio da História e restauração da civilização
Em artigo para a “Folha de S. Paulo”, o Prof. Plinio sintetiza assim as sequelas deixadas pela Segunda Guerra Mundial:
“Para não alongar por demais as coisas, consideremos só as décadas que se seguiram à Segunda Guerra Mundial. Incontáveis mudanças se têm produzido, nesse período, no modo de pensar, de sentir, de viver e de agir dos homens. Consideradas essas mudanças em seu todo — e descontadas as exceções — é inegável que elas rumam para uma situação violentamente oposta a todas as tradições espirituais e culturais que recebemos. Essas tradições ainda estão vivas, mas a todo momento alguma modificação as debilita. Logicamente, se ninguém se levantar em favor delas, acabarão por perecer. Ora, o perecimento dessas tradições importa, a meu ver, no maior naufrágio da História”.17 [vide quadro no final, denominado FÁTIMA, NUMA VISÃO DE CONJUNTO].
Nesse “naufrágio”, a humanidade perece e os que desejam a salvação necessitam de um farol que lhes ilumine o caminho e indique o “porto seguro”, o rumo desejado por Deus para suas vidas. É caso de todos nós. Mas onde encontrar esse “farol”, no qual podemos olhar com confiança e seguir com toda certeza? — Claro que em Deus. Mas Ele, que nunca abandona seus filhos, enviou-nos sua própria Mãe, para nos orientar, alertar, preservar do pecado e indicar o rumo certo. As proféticas revelações de Fátima constituem esse sacrossanto “farol” para nos iluminar neste mundo tão afastado dos divinos ensinamentos.
“Farol” que é um verdadeiro luzeiro também para nos conduzir no período dos terríveis castigos de proporções universais anunciados pela “Senhora mais brilhante que o Sol” os quais desabarão sobre o mundo contemporâneo porque a humanidade pecadora não atendeu seus pedidos e não se converteu.
“Várias nações serão aniquiladas. Por fim, o meu Imaculado Coração triunfará”
Na revelação acima citada, Nossa Senhora prognostica que “várias nações serão aniquiladas”…
Neste ano em que se comemora o centenário de Fátima, o noticiário geral vem nos informando acerca de acontecimentos trágicos que fazem temer a eclosão de uma grande guerra. Muitos intuem até a iminência de uma terceira guerra mundial. Aproxima-se a grande punição anunciada por Ela em 1917?
É algo cujo conhecimento só a Deus pertence. Em qualquer caso, fundados nas revelações de Fátima e com nossos olhos sempre voltados para a Rainha dos Anjos e dos homens, poderemos atravessar as catástrofes e chegar regenerados à bendita época do Reino do seu Imaculado Coração, de cuja plena glorificação — queira Deus — possamos participar em um mundo todo consagrado a Ela!
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Notas:
1. Catolicismo, janeiro/1952. A íntegra desse artigo, assim como dos demais aqui reproduzidos apenas parcialmente, encontra-se disponível no site http://www.pliniocorreadeoliveira.info
2. Revolução e Contra-Revolução, Artpress, S. Paulo, 4a. edição em português, 1998, Parte II, Cap. II, 1, p. 93.
3. Revolução é o processo quatro vezes secular que vem desagregando a civilização cristã; Contra-Revolução é o movimento que visa restaurar essa mesma civilização. Ambos os termos são empregados nesta matéria conforme exposto na obra Revolução e Contra-Revolução — publicada em primeira mão por Catolicismo, Abril/1959 —, disponível no site: http://www.pliniocorreadeoliveira.info
4. Catolicismo, dezembro/1957.
5. Tratado da verdadeira devoção à Santíssima Virgem, São Luís Maria Grignion de Montfort, Editora Vozes, Petrópolis, 1961, VI ed., pp. 210-211.
6. Um caminho sob o olhar de Maria – Biografia da Irmã Lúcia Maria de Jesus e do Coração Imaculado, Carmelo de Coimbra, Edições Carmelo, Coimbra, 2013, p. 248.
7. Antonio Augusto Borelli Machado, As aparições e a mensagem de Fátima conforme os manuscritos da Irmã Lúcia, Editora Vera Cruz Ltda., 46ª edição, São Paulo, 1997, 3a. capa.
9. Um caminho sob o olhar de Maria – Biografia da Irmã Lúcia Maria de Jesus e do Coração Imaculado, Carmelo de Coimbra, Edições Carmelo, Coimbra, 2013, pp. 50-51.
10. Id., Ib. p. 50.
11. Para a Irmã Lúcia não representa maior dificuldade o fato de se entender habitualmente que a guerra começou somente sob o pontificado de Pio XII. Observa ela que a anexação da Áustria, e vários outros acontecimentos políticos no fim do reinado de Pio XI que poderíamos acrescentar, constituem autênticos prolegômenos da conflagração, a qual se configuraria inteiramente como tal algum tempo depois (cfr. Entrevista ao Pe. Iongen, fevereiro de 1946, apud Pe. João M. de Marchi, I.M.C., Era uma Senhora mais brilhante que o sol, Edição do Seminário das Missões de Nossa Senhora de Fátima, Cova da Iria, p. 58.
12. Um caminho sob o olhar de Maria – Biografia da Irmã Lúcia Maria de Jesus e do Coração Imaculado, Carmelo de Coimbra, Edições Carmelo, Coimbra, 2013, pp. 63-64.
13. “Legionário”, 4-5-1944.
14. “Legionário”, 13-5-1945.
15. “Legionário”, 18-9-1938.
16. Insegnamenti di Paolo VI, Alocução de 29 de junho de 1972, Tipografia Poliglota Vaticana, vol. X, pp. 707-709).
17. “Folha de S. Paulo”, 20-3-69 .
LÚCIA DESCREVE VISÃO DO INFERNO
A Santíssima Virgem, a fim de favorecer a conversão dos pecadores empedernidos e evitar assim que afundem nos tormentos eternos, na terceira aparição (13 de julho de 1917) mostrou o inferno aos três confidentes de Fátima. Visão extraordinariamente bem narrada pela Irmã Lúcia.*
“Abriu [Nossa Senhora] de novo as mãos, como nos dois meses passados. O reflexo pareceu penetrar a terra e vimos como que um mar de fogo. Mergulhados em esse fogo, os demónios e as almas, como se fossem brasas transparentes e negras ou bronzeadas, com forma humana, que flutuavam no incêndio, levadas pelas chamas que delas mesmas saíam juntamente com nuvens de fumo, caindo para todos os lados, semelhante ao cair das faúlhas em os grandes incêndios, sem peso nem equilíbrio, entre gritos e gemidos de dor e desespero que horrorizava e fazia estremecer de pavor (deveu ser ao deparar-me com esta vista que dei esse ‘ai!’ que dizem ter-me ouvido).
“Os demónios distinguiam-se por formas horríveis e asquerosas de animais espantosos e desconhecidos, mas transparentes como negros carvões em brasa. Assustados e como que a pedir socorro, levantamos a vista para Nossa Senhora que nos disse, com bondade e tristeza:
“Vistes o inferno, para onde vão as almas dos pobres pecadores; para as salvar, Deus quer estabelecer no mundo a devoção a Meu Imaculado Coração”.
___________________
(*) Um caminho sob o olhar de Maria – Biografia da Irmã Lúcia Maria de Jesus e do Coração Imaculado, Carmelo de Coimbra, Edições Carmelo, Coimbra, 2013, p. 63.
FÁTIMA
Explicação e remédio da crise contemporânea
[Excertos]
Plinio Corrêa de Oliveira
Catolicismo, nº 29 – maio de 1953
A Guerra Mundial de 1914-1918 pareceu uma tragédia insuperável. Na realidade, a de 1939-1945 a superou do ponto do vista da duração, da universalidade, da mortandade, e das ruínas que ocasionou. Ela nos deixou a dois passos de uma nova guerra ainda pior sob todos os pontos de vista. Massas humanas têm vivido estes últimos anos no terror dessa perspectiva, cônscias de que um terceiro conflito mundial talvez acarrete o fim de nossa civilização.
O elemento essencial das mensagens do Anjo de Portugal e de Nossa Senhora consiste em abrir os olhos dos homens para a gravidade destes fatos, em lhes ensinar sua explicação à luz dos planos da Providência Divina, e em indicar os meios necessários para evitar a catástrofe. É a própria História de nossa época, e mais do que isto o seu futuro, que nos é ensinado por Nossa Senhora.
O Império Romano do Ocidente se encerrou com uma catástrofe iluminada e analisada pelo gênio de um grande Doutor, que foi Santo Agostinho.
O ocaso da Idade Média foi previsto por um grande profeta que foi São Vicente Ferrer.
A Revolução Francesa, que marca o fim dos Tempos Modernos, foi prevista por outro grande profeta que foi ao mesmo tempo um grande Doutor, São Luís Maria Grignion de Montfort.
Os Tempos Contemporâneos, que parecem na iminência de se encerrar com nova crise, têm um privilégio maior. Veio Nossa Senhora falar aos homens. Santo Agostinho não pôde senão explicar para a posteridade as causas da tragédia que presenciava. São Vicente Ferrer e São Luís Grignion de Montfort procuraram em vão desviar a tormenta: os homens não os quiseram ouvir. Nossa Senhora a um tempo explica os motivos da crise, e indica o seu remédio profetizando a catástrofe caso os homens não a ouçam.
De todo ponto de vista, pela natureza do conteúdo como pela dignidade de quem as fez, as revelações de Fátima sobrepujam pois tudo quanto a Providência tem dito aos homens na iminência das grandes borrascas da História.
Os diversos pontos das revelações relativos a este tema constituem propriamente o elemento essencial das mensagens. O mais, por importante que seja, constitui mero complemento.
Não há uma só aparição em que não se insista sobre um fato: os pecados da humanidade se tornaram de um peso insuportável na balança da justiça divina. Esta a causa recôndita de todas as misérias e desordens contemporâneas. Os pecados atraem a justa cólera de Deus. Os castigos mais terríveis ameaçam pois a humanidade. Para que não sobrevenham, é preciso que os homens se convertam. E para que se convertam é preciso que os bons orem ardentemente pelos pecadores e ofereçam a Deus toda a sorte de sacrifícios expiatórios.
FÁTIMA, NUMA VISÃO DE CONJUNTO
[Excertos]
Plinio Corrêa de Oliveira
Catolicismo, nº 197 – Maio de 1967
O mundo de hoje se vai dividindo cada vez mais em duas famílias de almas. Uma considera que a humanidade é presa de um feixe de erros e de iniquidades, as quais começaram na esfera religiosa e cultural com o Humanismo, a Renascença e a Pseudo-Reforma protestante. Tais erros se agravaram com o iluminismo e o racionalismo, e culminaram na esfera política com a Revolução Francesa. Do terreno político passaram eles para o campo social e econômico, no século XIX, com o socialismo utópico e com o socialismo dito científico. Com o advento do comunismo na Rússia, toda essa congérie de erros passou a ter um começo de transposição, incipiente mas maciça, para a ordem concreta dos fatos, nascendo daí o império comunista moloch. Ao mesmo tempo, sobretudo a partir da Grande Guerra, a moralidade se pôs a declinar com rapidez espantosa no Ocidente, preparando-o para a capitulação ante o comunismo, o qual é a mais audaciosa expressão doutrinária e institucional da amoralidade.
A concepção histórica contida nessas considerações se encontra exposta no artigo A cruzada do século XX publicado no primeiro número deste órgão. Procuramos dar-lhe um mais amplo desenvolvimento no ensaio Revolução e Contra-Revolução, que Catolicismo estampou em seu nº 100. Por fim, encontra-se ela enunciada com grande elevação e clareza no histórico documento em que duzentos Padres do II Concílio Ecumênico do Vaticano, por iniciativa dos Exmos. Revmos. Srs. D. Antonio de Castro Mayer e D. Geraldo de Proença Sigaud, pediram uma nova condenação do marxismo. Para as incontáveis almas de todos os estados, condições de vida e nações, que condividem este modo de pensar, a mensagem de Fátima é tudo quanto há de mais coerente com a doutrina católica e com a realidade dos fatos.
Há também outra família de almas, para a qual os problemas do mundo contemporâneo pouca ou nenhuma relação têm com a impiedade (considerada enquanto desvio culposo da inteligência) e a imoralidade. Nascem eles exclusivamente de equívocos involuntários, que uma boa difusão doutrinária e um conhecimento objetivo da realidade podem dissipar. Esses equívocos resultam, aliás, de carências econômicas. Filhos da fome, morrerão quando no mundo não houver mais fome. E não morrerão antes disto. Com o auxílio da ciência e da técnica, a crise da humanidade se resolverá. Não só isto. Não havendo como nota tônica das catástrofes e dos perigos em meio aos quais nos debatemos, o fator culpa, a noção de um castigo universal se torna incompreensível. Tanto mais quanto, para esta família de almas, o comunismo não é intrinsecamente mau, e com ele são possíveis acomodações que evitem incômodas perseguições.
É claro que por amor à brevidade a descrição dessas duas famílias de almas esquematiza algum tanto o panorama. Entre uma e outra há muitas gamas. Não haveria porém espaço para retratá-las aqui. Na medida em que qualquer das correntes intermediárias se aproxima de um polo ou do outro, para ela se vai tornando compreensível ou incompreensível a mensagem de Fátima. Fátima se encontra pois, neste sentido, como um verdadeiro divisor de águas das mentalidades contemporâneas.
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