terça-feira, 17 de outubro de 2017

100 mortos em quatro meses. E o Governo? É inimputável?

P
 
 
Enquanto Dormia
 
David Dinis, Director
 
Noite boa, com a chuva a voltar e a ajudar os bombeiros.
Já vamos aos incêndios, passo antes pelas últimas notícias:  

Foram detidos dois líderes da revolta catalã. A juíza da Audiência Nacional espanhola acusou os dois responsáveis de "sedição" por terem incentivado as massas a "impedir" a operação da polícia espanhola contra o referendo. Em Madrid, Rajoy e oposição preparam-se para completar o cerco político a Puigdemont: o próximo passo é retirar poderes às instituições catalãs
Foi assassinada uma jornalista que investigava os 'Panama Papers'. Daphne Caruana Galizia morreu na sequência de uma explosão do seu carro, depois de denunciar um caso de alegada corrupção envolvendo o actual primeiro-ministro de Malta. Agora, o FBI está a ajudar na investigação do provável homicídio.
"A guerra nuclear pode estourar a qualquer momento". O número dois da Coreia do Norte na ONU foi ao comité de desarmamento dizer que nenhum outro país foi sujeito a "uma ameaça nuclear tão extrema e directa", alegando assim o direito a manter arsenal nuclear para "autodefesa". A notícia é do The Guardian.
O Ophelia já matou três pessoas na Irlanda e Reino Unido. Depois de passar a norte da Península Ibérica, o furacão que já virou tempestade deixou um rasto e várias vítimas. As autoridades decidiram manter tudo fechado ainda durante o dia de hoje.

4 meses, 100 mortos

"Sem desculpa", diz o JN"Imperdoável", prefere o CM. Aqui no PÚBLICO deixámos os números falarem por si: "Quatro meses, mais de 100 mortos". Como falam por si os olhos de um camponês, fotografado pelo Adriano Miranda e que faz a nossa capa - e de que fala também o Ferreira Fernandes no DN"Ontem, António Costa falhou em nos cativar. Faltou-lhe olhar, antes de nos falar, a foto do camponês de Vouzela - fotografado por Adriano Miranda, no Público. Mãos calosas no cajado, cajado no peito e olhos tão tristes, frente à casa que já não era dele. Depois de o olhar demoradamente é que António Costa nos devia ter falado".
A foto, essa foto, está nesta reportagem, do Adriano e da Natália Faria, com um título com um ponto de interrogação que nos faz chorar: “Depois disto, o que é que nos segura cá?”. Mas também podia estar nesta outra, do Camilo Soldado, porque cada história destes incêndios é uma história de nós todos.
O dia de hoje começou melhordepois da chuva apagar os incêndios. Mas a noite de ontem elevou já para 36 os mortos das passadas 48 horas - numa lista demasiado triste que inclui um bebé de dois meses. Ninguém merece, nenhum país merece (e nem visto de fora parece admissível).
Na Galiza, onde muito também ardeu (mas muito menos pessoas morreram), já chamam a isto terrorismo. E fazem-se manifestações contra a gestão dos incêndios.
Por cá, António Costa falou ao país, mas sem olhar para trás"É preciso passar das palavras aos actos”, disse-nos o primeiro-ministro sem ver a foto do Adriano Miranda, depois do Presidente avisar que também falará, depois do PCP pedir uma audiência em Belém e outra em São Bento, depois do Bloco ter pedido mudanças no Governo (já para nem falar da oposição).
"Não é tempo de demissões, mas de soluções", disse Costa a rimar, sabendo que o MAI perdeu 29 meios aéreos desde o início do mês, como pode ler na nossa manchete de hoje, sabendo que a GNR não conseguiu avisar sobre as estradas proibidas, que as comunicações falharam outra vez, que os meios faltaram em todo o lado.
"Não é tempo de demissões, mas de soluções", disse Costa a rimar, depois de 24 horas com risos madrugadores, férias, contradições e zero demissões, conhecendo já o segundo relatório sobre Pedrógão, que deu mais um tiro na Protecção Civil - atribuindo-lhe culpas antes, durante e depois da tragédia. E ouvindo o especialista Xavier Viegas dizer que "Pedrógão pode não ser um caso isolado". Costa falou, talvez sem antes ver a foto do Adriano Miranda, talvez sem ver as imagens dos incêndios partilhadas por quem os viu de perto.
Talvez António Costa leia os textos de hoje na imprensa. Unânimes, na indignação. Talvez leia o João Miguel Tavares a falar de "uma comédia chamada Estado português", Paulo Rangel a dizer que "não é aproveitamento político, é respeito, é pudor, é sentido do dever". Ou o editorial do DN a falar de um "Estado de medo", o do JN a baixar a cabeça sobre as "cinzas e luto", o do Negócios a sugerir à ministra que "vá de férias".
Talvez António Costa não queira ler o nosso editorial, mas ele foi escrito a pensar que sim, que talvez ainda o leia, que talvez ainda vá a tempo: "A António Costa só nos resta pedir que não nos faça chorar mais, que faça de uma vez o que tem de ser feito. Porque este Governo pode ser popular, mas não pode mesmo ser inimputável. Ou será, senhor Presidente?".

Outras notícias

Só umas linhas para lhe deixar os links essenciais:
O Novo Banco já aprovou o aumento de capital a assegurar pela Lone Star. Só falta chegarem os 750 milhões.
Governo e enfermeiros chegaram a acordo. Entre as medidas acordadas está a reposição do pagamento por inteiro das horas nocturnas, de fins-de-semana e feriados. 
Mas o Governo vai dar maisas 35 horas vão chegar a todos os profissionais de saúde na segunda metade de 2018, diz a secretária de Estado da Administração Pública, numa entrevista ao PÚBLICO. Mas não pode ser tudo, acrescenta Maria de Fátima Fonseca: contabilizar tempo nas carreiras, "não permitia descongelar em dois anos".
Tempo é o que se pede (outra vez) na Operação MarquêsO caso ficará parado até decisão sobre imparcialidade de Carlos Alexandre, conta-nos a Mariana Oliveira. E já há um advogado a reivindicar um ano extra para acabar de consultar processo.

Uma pausa para ler... 

No meio de tanta desgraça, precisamos mesmo de boas notícias - e de boas leituras. Aqui estão algumas, só para si:
1. Pela primeira vez, vimos ondas gravitacionais e luz emitidas pela colisão de duas estrelas de neutrões. Um batalhão de telescópios pelo mundo fora juntou-se para fazer observações astronómicas inéditas a vários níveis. Anunciados esta segunda-feira em conferência de imprensa, os resultados serão publicados em inúmeros artigos científicos. A isto chama-se história - e ninguém melhor do que a Teresa Firmino para nos explicar (e mostrar) a descoberta.
2. É com o cérebro que comemos"Um prato redondo e vermelho faz com que a comida pareça mais doce? Estamos dispostos a pagar mais por uma refeição se os talheres forem pesados? Charles Spence, investigador em Oxford, trabalha há muito para provar que a experiência de comer começa antes do momento em que a comida nos chega à boca." Um momento, chegou a Alexandra Prado Coelho para nos abrir o apetite. Vai uma prova?
3. Vivemos colados ao telemóvel (mas não digam a Martin Cooper que a culpa é dele). Há 44 anos, ele fez a primeira chamada a partir de um telefone sem fios. Aos 88 anos de idade, este norte-americano continua a dar-nos lições sobre as tendências e o futuro das comunicações móveis. E não o faz sozinho, porque é casado com a “primeira-dama do wireless”. Se entrar para ler, já sabe a quem apontar o dedo.

Agenda do dia

Passa, claro, pelo rescaldo dos incêndios - talvez Marcelo nos fale hoje, seguramente o Parlamento voltará ao tema. Mas hoje também vamos ouvir falar da compra da TVI pela Altice, porque é dia da ERC nos dizer que a proposta é admissível. E também de uma decisão judicial: irão a julgamento os inspectores da PJ e da GNR, acusados de tráfico de droga? Mais logo, hora marcada para o regresso da Champions: às 19h45 o Porto vai a Leipzig - e o jogo pode dar asas. 
Chegou a altura de deixar o dia voar, esperamos que de novo com razões para nos fazer sorrir. Pelo sim, pelo não, vá passando por nós - estamos aqui para lhe contar tudo. O que lhe desejo é um dia feliz. E produtivo.  
Até já.

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