domingo, 28 de janeiro de 2018

O Nuno Artur, o CGI e a vitória da calúnia e do nojo

Pedro Marques Lopes
O Dr. Nuno Artur Silva foi responsável, nos últimos três anos, pela reconfiguração estratégica da política de conteúdos da empresa, numa ótica de serviço público de media, tarefa que desempenhou de modo altamente meritório e sucessivamente reconhecido pelas instâncias de escrutínio da empresa."

Este parágrafo consta do comunicado do Conselho Geral Independente, órgão que, entre outras coisas menores, define o conselho de administração da RTP. O elogio não é de pouca monta. A mim não me admira. Conheço o Nuno e sei bem dos seus profundos conhecimentos da área, de como sabe tudo sobre televisão, da sua criatividade, da sua capacidade de trabalho e da forma como inventou grande parte do entretenimento que se fez em Portugal nos últimos trinta anos. A minha opinião sobre os conhecimentos dele sobre televisão não conta, mas posso responder pela sua seriedade e honestidade sem mácula.

Porém, não há especialista ou profissional do setor que não lhe louve as enormes qualidades profissionais. Como não há quem não reconheça que a RTP se tornou uma televisão realmente virada para o serviço público, com critérios de qualidade, com uma aposta forte em conteúdos portugueses, com uma informação isenta e que não embarcou em voyeurismos, escândalos e porcarias do género. E foi obviamente por aquelas qualidades que foi escolhido para reconfigurar estrategicamente a RTP na ótica do serviço público, tarefa que desempenhou de modo altamente meritório e foi por causa dos resultados alcançados que foi sucessivamente reconhecido pelas instâncias de escrutínio da empresa. E tudo isto diz o CGI.

No entanto, reza ainda o comunicado, "a sua continuidade na RTP é, no entanto, incompatível com a irresolução do conflito de interesses entre a sua posição na empresa e os seus interesses patrimoniais privados, cuja manutenção não é aceitável, não obstante o CGI, no âmbito das suas funções de supervisão e fiscalização, não ter verificado que isso tenha sido lesivo da empresa, no decurso do seu mandato". O CGI não explica qual é o conflito de interesses, mas garante que não foi lesivo para a empresa. E não explica porque se tivesse de explicar cairia num enorme ridículo.

E a coisa até é fácil de contar. O Nuno Artur Silva quando foi convidado para administrador da RTP era proprietário de uma empresa chamada Produções Fictícias. Empresa que produziu programas relevantíssimos na televisão portuguesa, que lançou estrelas como o Ricardo Araújo Pereira, que escreveu milhares de textos para séries, programas de humor e um nunca acabar de trabalhos para a televisão, além de ser proprietária do Canal Q. O administrador da RTP não a conseguiu vender e o facto é que a sua atividade se reduziu muitíssimo. Incompatibilidade? Aquelas que eram conhecidas na altura da escolha do Nuno Artur e não fizeram o CGI hesitar em nomeá-lo? O facto é que a RTP não comprou um único conteúdo às Produções Fictícias, nada, nickles, zero - facto claramente admitido pelo CGI. E houve alguma vantagem, patrimonial ou outra, para quem quer que fosse das Produções Fictícias? Nada, nickles, zero, mais uma vez o admite o CGI. E houve algum artista que pelo facto de ter sido das Produções Fictícias fosse beneficiado pela RTP? Nada, nickles, zero, como o CGI sabe. Mas aqui importa lembrar que muitos artistas que estão hoje na RTP passaram pelas Produções Fictícias. Na TVI também. Na SIC também.

Por que diabo então o CGI não reconduz o Nuno Artur já que reconhece a excelência do seu desempenho e que a sua conduta não teve a mais leve mancha ética? A resposta é simples: porque foram vulneráveis a uma das mais nojentas campanhas negras que foram movidas a uma pessoa e provavelmente temeram que lhes acontecesse o mesmo.

Durante três anos não se ouviu uma palavra sobre o mandato do administrador para os conteúdos da RTP ou das suas possíveis incompatibilidades. Melhor, uma vez. Na altura do seu afastamento, o diretor-geral da RTP, que tinha estado com todos os anteriores poderes da televisão pública e que nunca se tinha indignado com coisa nenhuma, deu uma entrevista, bastante cobarde e difamatória. Depois disso, nada.

Até cerca de um mês antes da decisão ter de ser tomada, quando o Correio da Manhã começou uma campanha que meteu primeiras páginas de acusações - completamente infundadas e que depois não eram consubstanciadas em desenvolvimentos nas páginas interiores, ou seja, não havia nada. Apareceram declarações da comissão de trabalhadores da RTP que eram verdadeiras tentativas de assassínio de caráter ao jeito estalinista, que foram amplamente divulgadas nessas mesmas primeiras páginas. Já as dezenas de declarações de trabalhadores indignados com a comissão e de apoio ao Nuno Artur foram olimpicamente ignoradas. Um autodenominado crítico televisivo que cobiça e pedincha, há muito tempo, um lugarzinho na televisão pública debitava periodicamente insultos e críticas gratuitas ao administrador da RTP. Um misto de inveja, ódio e despeito temperado com a habitual violência que o Correio da Manhã dedica a quem não se verga à sua nojenta agenda e não pactua com aquele tipo de esgoto a que alguns chamam com piada jornalismo.

A estes juntaram-se os que acham que a RTP é deles. Que construíram autênticas dinastias dentro da televisão pública, que sempre viveram da baixa política de caserna e que não podem suportar quem chega com vontade de trabalhar, que não olha a nomes mas a obras e que não está disposto a vergar-se aos do costume. Os que passaram vidas a fazer favores a alguns políticos e que precisam das contrapartidas para esses favores.

A todos estes o Conselho Geral Independente fez um imenso favor. Pactuou com gente que vive na lama e que faz da intriga, da calúnia e da insídia modo de vida. Trocou competência e honradez por formalismos vazios.

Sim, sou amigo do Nuno Artur Silva e tenho um orgulho imenso de assim o poder chamar.

Fonte: DN
28 DE JANEIRO DE 2018

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