quarta-feira, 25 de março de 2020

O coronavírus pode ser uma “quimera” de dois vírus diferentes: estudo


Por , em 24.03.2020

O coronavírus que causa a doença chamada de COVID-19 é o SARS-CoV-2.
Enquanto seu genoma foi rapidamente sequenciado por pesquisadores chineses, ainda restam muitas dúvidas sobre sua origem – por exemplo, de qual animal veio?
Agora, os resultados de novos estudos indicam que o SARS-CoV-2 pode ser uma “quimera”, ou seja, uma mistura de dois vírus diferentes vindos de morcegos e pangolins, recombinados em um novo (e ainda desconhecido) hospedeiro.

Origem nebulosa

Em dezembro de 2019, 27 dos primeiros 41 infectados com SARS-CoV-2 que foram hospitalizados disseram que haviam passado por um mercado de animais vivos no coração da cidade chinesa de Wuhan, na província de Hubei. Isso totalizava 66% dos pacientes.
O mercado parecia, então, ter alguma conexão com o vírus. No entanto, talvez não seja sua origem – um estudo conduzido pelo pessoal do Hospital de Wuhan revelou que o primeiro caso conhecido de COVID-19 era de um paciente que não frequentava tal mercado.
Além disso, uma estimativa de datação molecular baseada nas sequências genômicas do SARS-CoV-2 indica que o vírus “nasceu” em novembro, o que levanta questões sobre o vínculo entre essa doença e a vida selvagem.

O que sabemos?

O genoma do SARS-CoV-2 tem a forma de uma molécula de RNA de cerca de 30.000 bases contendo 15 genes, incluindo o gene S que codifica uma proteína localizada na superfície do envelope viral.
A título de comparação, nosso genoma tem a forma de uma hélice dupla de DNA com cerca de 3 bilhões de bases e 30.000 genes.

Análises genômicas comparativas mostraram que o vírus pertence a um grupo de betacoronavírus semelhante ao SARS-CoV, responsável por uma doença chamada de síndrome respiratória aguda grave que atingiu a província chinesa de Guangdong em novembro de 2002, espalhando-se para 29 países em 2003.
No caso do SARS-CoV, sabe-se que morcegos do gênero Rhinolophus eram seus hospedeiros naturais, enquanto o gato de algália, também chamado de civeta (Paguma larvata), pode ter sido o hospedeiro intermediário entre morcegos e seres humanos.

Mas e o SARS-CoV-2?

Os cientistas conhecem muitos betacoronavírus, a maioria deles tendo como hospedeiros naturais morcegos. Por exemplo, o RaTG13, isolado na espécie Rhinolophus affinis, da província chinesa de Yunan, foi descrito recentemente como muito similar ao SARS-CoV-2 – seus genomas são 96% idênticos.
Isso indica que morcegos, especialmente algum do gênero Rhinolophus, são os hospedeiros naturais do SARS-CoV-2 também.
Em fevereiro de 2020, porém, os pesquisadores descobriram outro vírus ainda mais parecido com o SARS-CoV-2, encontrado em pangolins, mamíferos que vivem em zonas tropicais da Ásia e da África – eles possuem 99% de concordância genômica.
E agora? De onde veio o SARS-CoV-2, então? De morcegos ou de pangolins? Na verdade, pode ter vindo tanto de um quanto do outro, ou de ainda outro animal que tenha servido como hospedeiro intermediário.

Isso porque é provável que o SARS-CoV-2 seja uma quimera dos dois vírus, transformado em um novo vírus que se formou provavelmente em um intermediário antes de passar para seres humanos.

Quimera

Uma pesquisa, que está sendo revisada e ainda não foi publicada, analisou o genoma do coronavírus isolado de um pangolim-malaio (Manis javanica) e determinou que ele é menos similar ao SARS-Cov-2, com apenas 90% de concordância genética, que o RaTG13.
Apesar disso, na região específica da famigerada proteína S – onde localiza-se o receptor que permite que o vírus infecte células humanas -, há 99% de concordância.
Por outro lado, o vírus RaTG13 isolado de um morcego Rhinolophus affinis só tem 77% de concordância com o SARS-Cov-2 nessa região. Isso significa que não pode entrar em células humanas.
Todas essas comparações genômicas, em conjunto, sugerem que o SARS-Cov-2 é o resultado da recombinação entre os dois vírus, o do morcego e o do pangolim. Em outras palavras, é uma quimera.

O processo de recombinação

Alexandre Hassanin, da Universidade Sorbonne e do Instituto de Estatística, Evolução e Biodiversidade do Museu Nacional de História Natural da França, explica que esse mecanismo de recombinação já foi descrito em outros coronavírus.
Para que esse processo ocorra, os dois vírus diferentes precisam infectar o mesmo organismo simultaneamente.
Uma vez que tal recombinação resulta em um novo vírus potencialmente capaz de infectar uma nova espécie hospedeira, duas importantes questões sobre o SARS-Cov-2 continuam sem resposta: em qual organismo essa recombinação ocorreu, em um morcego, um pangolim ou outra espécie? E, acima de tudo, sob que condições ocorreu?
É isso que os cientistas ainda têm que determinar.

hypescience

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