Macau, China, 26 jun (Lusa) - O primeiro Plano Quinquenal de Macau (2016-2020) afirma que o papel da cidade como ponte entre a China e a lusofonia, definido por Pequim em 2003, entrará numa "nova etapa", mas persistem dúvidas sobre a eficácia desta missão.
Especialistas ouvidos pela Lusa questionam o peso da intervenção de Macau, por exemplo, nas relações económicas mais importantes entre a China e os países da lusofonia.
"O Brasil nunca irá discutir a Macau os problemas da construção aeronáutica espacial, parece-me evidente. E Angola nunca virá a Macau discutir a exportação de petróleo", ilustra o economista José Isacc Duarte, residente em Macau.
Também Émilie Tran, investigadora da Universidade de São José (de Macau) e autora de um estudo sobre a importância dos seminários organizados pelo Fórum Macau como instrumento diplomático da China, alerta que, apesar de "muito ter acontecido" entre a China e os países lusófonos como grupo, "muito mais tem acontecido ao nível bilateral" com os grandes parceiros. É o caso do Brasil, "para quem o Fórum não é assim tão importante e que lida diretamente com Pequim", afirma.
Foi em 2003 que Pequim definiu Macau como plataforma entre a China e os países lusófonos e criou o Fórum Macau.
Também o Instituto de Promoção do Comércio e do Investimento de Macau (IPIM) se debruça sobre as relações com os países de língua portuguesa e irá criar este ano um "departamento específico" dedicado a este fim.
Por outro lado, foi criada recentemente a Comissão para o Desenvolvimento da Plataforma de Serviços para a Cooperação Comercial entre a China e os Países de Língua Portuguesa, presidida pelo chefe do Governo de Macau, cuja secretaria-geral está a cargo do IPIM.
Segundo o Plano Quinquenal, em consulta pública até esta semana, a comissão "tem como missão estudar e elaborar as medidas e as políticas necessárias à promoção da construção desta plataforma".
O IPIM salientou, numa resposta escrita à Lusa, que a comissão "vai conduzir investigação relacionada com a política da Plataforma e intensificar a formação e trocas culturais e comércio entre a China e os países de língua portuguesa, além de disponibilizar assistência e serviços de consultadoria às partes envolvidas em tradução/interpretação e noutras matérias relacionadas com língua, finanças, assuntos legais e gestão".
A comissão, defende o IPIM, vai permitir a Macau "utilizar plenamente as suas vantagens especiais, impulsionando o seu papel como plataforma e desenvolvendo uma forte colaboração entre a China e os países de língua portuguesa".
"O Fórum foi criado em 2003. Ao fim de 13 anos de atividade o chefe do Executivo cria uma comissão presidida por ele próprio para definir qual é a atividade a desenvolver. É preciso dizer mais", questiona José Isacc Duarte.
O economista considera que a ideia de Macau fazer esta intermediação "tem muito interesse e em potência tem toda a lógica", no entanto, "na prática", tem "dificuldade em ganhar tração".
"As relações da China com os países de língua portuguesa têm crescido, sim, mas não são tão centrais, digamos, como as com o G7 e outras organizações multilaterais", contextualiza, por seu turno, Émilie Tran.
Para a investigadora, o Fórum Macau tem conseguido "conquistar os corações" dos participantes dos países lusófonos através seus seminários, contribuindo para promover uma imagem positiva sobre a China, mas tal não significa que "já não haja dúvidas ou suspeitas sobre as verdadeiras intenções da China".
A agência Lusa contactou o Fórum Macau para a realização de uma entrevista, mas tal não foi possível.
As trocas comerciais entre a China e os países de língua portuguesa têm vindo a cair: em 2015, desceram 25,73%, atingindo 98,47 mil milhões de dólares, a primeira queda desde 2009. Os dados mais recentes deste ano apontam para uma queda de 23,03% no primeiro trimestre do ano, face ao período homólogo de 2015.
ISG // MP/VM
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