Um
inquérito feito a 806 jornalistas de todo o país (ao todo serão
mais de 7 mil), veio trazer preciosas informações sobre a situação
do jornalismo em Portugal.
Em
primeiro lugar, vemos uma profissão afetada por uma certa
precariedade: dos inquiridos, há 24,6% que recebem mais de 1500
euros mensais, e 19,1% recebem entre 1000 e 1500 euros mensais, mas
os restantes, 56,3%, recebem abaixo desse valor. Na verdade, 22,1%
recebe entre 601 e 900 euros, 8,6% recebe entre 506 e 600 euros e há
uma fatia de 7,3% dos jornalistas que estão a receber um valor
igual ou inferior ao salário mínimo nacional - 505 euros.
Além
disso, cerca de 55% dos jornalistas inquiridos concorda que a sua
situação laboral afeta o desempenho do seu trabalho. São o dobro
daqueles que discordam que a situação laboral afeta o desempenho
no trabalho (cerca de 28%), sendo que provavelmente nestes 28% se
encontram os jornalistas mais bem remunerados.
As
coisas tornam-se ainda mais preocupantes quando 28,9% dos
jornalistas concordam que a situação laboral pode interferir com
preceitos éticos no desempenho da profissão.
77,3%
dos inquiridos considera que é difícil arranjar um novo emprego
nesta profissão. O que reforça a precarização e aumenta o
abandono da profissão, conduzindo a que a maioria dos jornalistas
esteja na profissão há menos de 25 anos (há uma tendência para a
profissão ser abandonada).
Dados
ainda mais preocupantes: quase um quarto dos inquiridos diz-se
sujeito a pressões da administração onde trabalha, mais de um
quarto diz-se sujeito a pressões da direção editorial e quase 36%
sente-se alvo de pressões externas. Há ainda quase 10% dos
inquiridos que dizem que os seus trabalhos são alterados sem o seu
consentimento por editores ou pela direção de forma frequente.
Estes
resultados permitem-nos tirar muitas conclusões. Em primeiro lugar,
que ser jornalista não é para muitos uma profissão muito
rentável. Em segundo lugar, que ao ser uma profissão muitas vezes
mal remunerada e onde se regista grande tendência para abandonar a
profissão, até porque há dificuldades em arranjar novo emprego na
profissão, como concordam muitos dos inquiridos, a situação
laboral de muitos não é a mais favorável, o que pode interferir
com o seu desempenho e com a ética no jornalismo. Em terceiro
lugar, estes dados permitem concluir que grande parte dos
jornalistas se sentem sujeitos a diversas pressões, que vão afetar
o seu desempenho.
O
facto de os jornalistas se sentirem prejudicados no seu trabalho por
tantos fatores (pressões da direção ou de outras entidades, má
situação laboral, etc) pode-nos ajudar a explicar por que razões
está o nosso jornalismo a bater no fundo. A preocupação de muitos
não é fazer jornalismo de qualidade, mas conseguir sobreviver, uma
vez que o seu trabalho é precário e sabem que não é fácil
conseguirem um novo emprego. A prioridade não é transmitir
notícias e informações, mas agradar às direções, às redações
e a qualquer tipo de pressão externa. Os salários baixos e as
pressões vêm interferir com o trabalho dos jornalistas, diminuir a
qualidade do que fazem e descredibilizar a profissão. Tudo isto
associado à tendência crescente dos jornais em procurar captar
leitores a qualquer custo (clickbaits). Passamos a ter um jornalismo
pautado pelo sensacionalismo, pela procura de audiências e pela
tentativa de influenciar o leitor e deixamos de ter um jornalismo de
rigor e de qualidade, preocupado com a seriedade, a veracidade, a
objetividade e a imparcialidade do seu conteúdo.
É
certo que, infelizmente, pressões e más situações laborais
também ocorrem noutras profissões. Mas na profissão de jornalista
é, de um certo modo, mais grave. Hoje em dia, numa era em que a
imprensa rapidamente nos transmite toda a informação (e
desinformação), ela assume um papel extremamente importante nas
vidas de cada um. Uma imprensa parcial e de fraca qualidade (como
ocorre em Portugal, cada vez mais), vai informar erradamente as
pessoas, vai fazê-las cair em erro, torna-se um instrumento de
manipulação ao serviço de interesses económicos, políticos ou
ideológicos. Infelizmente, é precisamente isso que ocorre hoje em
Portugal. Daí que, cada vez mais, esteja a perder a credibilidade.
E
aí, destacar o excelente trabalho da página Os
truques da imprensa portuguesa,
que se tem esforçado por combater essa realidade. Claro que com o
desagrado de muitos, porque isto vem interferir com esses interesses
instalados em muitos jornais. Mas tenho a certeza que além de mim,
muitos leitores de jornais e muitos jornalistas que amam a profissão
e querem o rigor e a seriedade de volta à mesma agradecem o seu
trabalho. É, neste momento, um dos mais importantes meios de
combater o que está mal no jornalismo.
Fonte:oesquerdino.blogspot.pt
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