quarta-feira, 20 de dezembro de 2017

Macroscópio – A mulher que pode mudar o destino da Catalunha. E de Espanha.

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Macroscópio

Por José Manuel Fernandes, Publisher
Boa noite!

Quem é Inés Arrimadas, a mulher de 36 anos, licenciada em Direito, líder do Ciudadanos na Catalunha que, se as sondagens se confirmarem, tem hipóteses de vir a ser a próxima Presidente da Generalitat? O El Pais chamou-lhe “la cariátide del unionismo”, o El Español mais smplesmente “la jefa”, o ABC “la obra más perfecta de Rivera”, referindo-se ao líder nacional do seu partido. Verdadeiro fenómeno político, capaz de gerar entusiasmos e ódios, símbolo maior da renovação de gerações na política espanhola, importa conhecer melhor esta mulher que nada parecia predispor a uma carreira partidária. Neste Macroscópio dar-vos-ei algumas pistas para que possam entrar um pouco no seu mundo e apreender as suas propostas e ideias.
 
Começando por Portugal, João Almeida Dias escreveu no Observador um longo e detalhado perfil, A maria-rapaz que pode liderar a Catalunha, onde nota que “Inés Arrimadas está longe de ser uma personagem consensual na Catalunha. Entre algumas esferas independentistas, é frequentemente o alvo preferido de programas de sátira e também de insultos que muitas vezes resvalam para o machismo e também para a xenofobia.” Recorda mesmo um caso em que foi feito um apelo público que fosse violada, numa reacção extremista a um seu discurso no Parlamento catalão, local onde se destacou pela sua frontalidade. Um exemplo recente, recordado neste trabalho, e que reflecte uma das suas linhas de campanha: “Houve uma parte do seu discurso em que repousou as mãos sob o púlpito e, entre os seus papéis, pegou num passaporte espanhol. Era aquele o seu trunfo e tinha chegado a altura de usá-lo. “Os meus pais, os meus irmãos e os meus sobrinhos vivem na Andaluzia, senhor Puigdemont”, disse, para depois rematar: “Não vou permitir que lhes peçam o passaporte para virem visitar-me”.
 
No Expresso Diário (paywall) foi Ana França que escreveu sobre A jovem sensação da política catalã que preferia o Barça às Barbies. Ao situá-la politicamente nota que, “Para que não restem dúvidas do seu “conservadorismo rebelde” – é a designação por ser tão unionista na Catalunha –, Arrimadas já disse que espera “um governo de coligação de vários partidos constitucionalistas” e que, se essa for a vontade dos catalães, então o processo independentista “deixará de ser uma prioridade” e no seu lugar ficará “o investimento em mais políticas sociais”.
 
Já em A jovem advogada andaluza que quer governar a Catalunha, no Público, Sofia Lorena relaciona as suas origens com o seu apelo eleitoral junto de um eleitorado que, como ela, tem raízes fora da Catalunha. Ao descrever um comício numa povoação da cintura popular da cidade condal, nota que “entre a audiência (...) estiveram muitos nascidos fora da Catalunha, ou filhos de pais que vieram de outras regiões, especialmente a Andaluzia (...), e se concentram na área metropolitana de Barcelona. “Tentaram partir um coração em que cabem três bandeiras. A mim cabe-me a bandeira andaluza, e sei que a muitos de vocês também”, afirmou a candidata.”
 
Na imprensa espanhola é grande o interesse por esta jovem política que se tornou uma figura nacional quando, em 2015, encabeçou a lista do Ciudadanos nas eleições catalãs, conseguindo transformar o partido na principal força da oposição à maioria independentista (maioria em deputados, que não em votos). Se agora conseguir ir ainda mais longe e o seu partido, que tem pouco mais de dez anos, acabar como força mais votada, concretizar-se-á o maior pesadelo dos independentistas, como escreve o Político no seu perfil (em 7 contenders in the Catalan election): “If separatists have nightmares, they must surely feature Inés Arrimadas as the next president of Catalonia.” De facto, “Ciudadanos is the bête noire of the independence camp. It takes pride in organizing public shows of support for Spanish unity in Catalonia, such as installing big screens in the streets to show the matches of the national football team La Roja. It has also attacked nationalist totems like the primacy of the Catalan language in public schools, pushing for more lessons to be taught in Spanish.”
 
Ao mesmo tempo, contudo, “the 36-year-old leader of the Ciudadanos, or Citizens’ party, is a hero to many of the more than 50 per cent of the Catalan population who do not want Independence”, escreve o Financial Times em Spanish unity candidate seeks to heal Catalonia’s wounds.


Da imprensa espanhola seleccionei vários perfis, alguns deles escritos em 2015, antes da eleição em que pela primeira vez liderou a lista dos Ciudadanos. O mais completo e interessante é porventura o do El Español, La medio tímida, escrito por Jordi Pérez Colomé. É um texto que explica as suas origens familiares (os pais eram de uma aldeia perto de Salamanca), recorda como a família passou para Barcelona antes de se mudar para a Andalusia, onde Inés Arrimadas foi a última a nascer de cinco irmãos. Também se recorda o seu percurso escolar (e o gosto pelo desporto, até como praticante, ver foto acima) e académico e lembra a forma como chegou ao Ciudadanos quase por acaso, depois de ter ido assistir a um comício. A seguir, “Todo fue rápido. A finales de 2011 el partido renovaba la ejecutiva y Rivera pidió a Arrimadas que entrara: su perfil de consultora y licenciada en Derecho le interesaba. Menos de un año después, el president Artur Mas convocó elecciones anticipadas. Arrimadas era la número cuatro de la lista por Barcelona. Le costó tomar la decisión. Significaba pedir la excedencia en Daleph para ser un cargo público. Pero ya no iba a frenar: “Decidí ser valiente en lugar de ser una cagada”. Ciudadanos sacó nueve diputados y ella entró en el Parlament.
 
“Decidí ser valiente en lugar de ser una cagada” é, seguramente, uma frase que define bem o carácter de alguém que não planeou esta carreira: “Un domingo de 2010 una compañera de despacho propuso a la actual jefa de la oposición del gobierno de Cataluña, acudir a un mitin de Albert Rivera. Y se engancho.”, recorda Manuel Vincent, do El Pais, em La novicia en la escena del sofáNesse texto recorda-se que Arrimadas “Tiene antepasados rojos y nacionales. Sus padres, Rufino e Inés, nacieron y se casaron en Salmoral, un pueblo de 155 habitantes de la provincia de Salamanca, emigraron a Andalucía, luego se trasladaron a Barcelona donde en la década de los sesenta el padre ejerció de policía científico y abogado, regresaron a Jerez de la Frontera en 1970 y allí en julio de 1981 nació Inés, la última de cinco hermanos.” Por incrível que pareça este percurso pessoal e familiar é boa parte da sua força, pois permite-lhe identificar-se com a base eleitoral do Ciudadanos: “No era ni inmigrante ni charnega sino una profesional moderna, que amaba la lengua y la cultura catalana sin perder el gen castellano, replantado en Andalucía, pero aún sin sentirse discriminada se encontró muy pronto con una frontera interior. No tenía capacidad para entender la razón emocional del nacionalismo, ni podía imaginar que ese sentimiento tan noble fuera capaz de llegar hasta la locura política.”
 
No mesmo El País, num texto mais analítico – Inés Arrimadas, la cariátide del unionismo – escreve-se mesmo que, “Objetivamente hablando, Arrimadas es la jefa de la oposición en el Parlamento de Cataluña. Y objetivamente también, cuesta trabajo encontrar un parlamento occidental u homologable donde semejantes puesto y atribuciones supongan tanto esfuerzo, abnegación y resistencia. Arrimadas rema en la tempestad y es la contrafigura de porcelana a la ferocidad de sus adversarios. Una mujer que podría descender del linaje de Audrey Hepburn y que, por las mismas razones, ha tenido que demostrar su valía en una conspiración de clichés y hasta de vejaciones.” Mais: “Arrimadas representa la esencia sociológica o demoscópica de su partido. La edad —nació en Jerez de la Frontera en 1984—, la formación universitaria —derecho y empresariales—, la idiosincrasia urbanita y la “aleación” comunitaria —completó sus estudios en Niza— abundan en una suerte de relación mimética con el votante tipo de su partido. Arrimadas es “muy de Ciudadanos” y encarna el relevo generacional de la política española, aunque la Epifanía que la condujo a la “misión” tiene bastante de accidental o de providencial, según se mire.”


Indispensável também para compreender melhor aquela que pode ser a próxima líder do governo catalão é viajar até à sua Andaluzia natal, como fez o El Mundo em Retrato familiar de Inés Arrimadas desde Jerez: 'La niña ya es imparable'. Da conversa com a mãe de Arrimadas resultou um retrato da jovem Inés que tem sido muito citado por toda a imprensa: "Siempre ha tenido su criterio. No la callábamos ni debajo de agua. Como era la pequeña, tenía que sacar la cabeza para discutir con los hermanos". Así, en las discusiones caseras y escolares, se fraguó su habilidad para el debate, alejada siempre de los polos. "Nunca ha sido de extremismos de izquierda o de derecha. Siempre le ha gustado discutir por lo que es justo".
 
Talvez por isso mesmo José María Albert de Paco, do El Español, não hesite em tratá-la por La jefa. Nessa crónica recorda uma conversa com um jornalista catalão ainda antes das eleições de 2015, que lhe disse que "Inés (...) no sólo es brillante; además, es una de las personas más perseverantes que he conocido; en las reuniones de la ejecutiva, por ejemplo, defiende sus puntos de vista con un empeño extraordinario; y créeme, como rival puede llegar a ser terrible, agotadora. A mi juicio, Artur Mas tiene un problema.”
 
Também por isso o conservador ABC titulou Arrimadas, la obra más perfecta de Rivera. Num texto onde se relata a sua relação com o líder do Ciudadanos – que é catalão mas pontifica no parlamento de Madrid – também se discute um dos seus traços de personalidade mais curiosos, sobretudo tratando-se de uma política: “Decir que Inés Arrimadas es una persona tímida se ha convertido en un mantra de todo perfil sobre su figura. Realmente ella se considera así, pero en cuanto se rompe la barrera inicial se muestra como una persona natural.”
 
A terminar apenas mais uma referência, esta do El Comércio, onde num texto que destaca o seu namoro e casamento com um político que era deputado de uma das formações indepdentistas – Inés Arrimadas, una líder de la oposición con pareja independentista y fan de Guardiola – se recordam as suas raízes familiares para explicar as suas principais referências políticas: “Rufino, su padre, abogado, emigró de Salamanca a Jerez de la Frontera, donde llegó a ser concejal por UCD en el primer ayuntamiento de la democracia, en 1979. Quizá por eso Inés cita siempre a Adolfo Suárez como su político de referencia: «Me gustaría que en los próximos años recuperemos algo de su espíritu conciliador y de consenso», dice ella.”
 
Adolfo Suárez foi, de facto, o grande protagonista de uma transição “impossível”, a da transformação da Espanha da ditadura na Espanha democrática. Pensando nas dificuldades que o próximo presidente da Generalitat terá pela frente numa Catalunha profundamente dividida é muito significativo que Arrimadas olhe para o exemplo de Suárez.
 
Na Catalunha as eleições são já esta quinta-feira, dia 21. A expectativa é enorme, as sondagens estão muito equilibradas, qualquer um dos lados pode vencer. Num deles está e estará Inés Arrimadas, que com os seus 36 anos parece ter vindo para ficar. Mas por hoje é tudo. Tenham bom descanso e boas leituras. 

 
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