Sónia Laygue assumiu o cargo há um mês e deparou-se com quebra significativa nos donativos. Apoios do Estado têm mantido associação a funcionar.
“Podemos ser os melhores mecânicos do mundo, mas sem gasolina é impossível fazer o carro andar novamente.” É assim que Sónia Margarida Laygue ilustra a situação da associação Raríssimas, a que preside desde 3 de janeiro deste ano. “Ajudem-nos a salvar a Raríssimas, a cuidar dos nossos utentes”, apelou esta sexta-feira numa conferência de imprensa convocada pela associação, onde foi pedido aos mecenas um reforço dos donativos e aos cidadãos que apoiem a instituição, abalada pelo escândalo da anterior direção de Paula Brito e Costa, suspeita de uso indevido dos fundos da Raríssimas.
A direção de Laygue — também ela mãe de uma criança com uma doença rara — escusou-se a revelar números concretos sobre a queda de donativos, afirmando que ainda está a estudar os dados financeiros, mas garantiu tratar-se de uma “quebra significativa”, já que muitos dos mecenas que apoiavam a instituição optaram por se afastar na sequência das notícias negativas. Contudo, questionada pelo Observador, a presidente deixou claro que sem o apoio do Estado, sobretudo na forma dos contratos com a Segurança Social na Casa dos Marcos e noutros lares residenciais, a associação não teria conseguido manter-se a funcionar em pleno durante este mês de janeiro. “O apoio do Estado é vital para a sobrevivência da Raríssimas”, sublinhou.
No entanto, embora a situação seja “delicada”, Margarida Laygue garantiu que a continuidade dos tratamentos não esteve em causa e que “a gestão diária está assegurada”. A Raríssimas conta atualmente com cerca de 140 trabalhadores e responde a cerca de 1500 pedidos de ajuda por ano, segundo dados da direção.
A renovada presidência da Raríssimas garante estar a pôr em marcha uma série de medidas com vista a recuperar a saúde financeira da instituição e a restaurar a confiança da sociedade. “Estamos a negociar com os fornecedores planos de pagamento para conseguir cumprir com todas as necessidades que temos”, ilustra a presidente.
Para além disso, a associação decidiu cortar alguns custos como o afamado BMW que Paula Brito e Costa conduzia e que custava quase mil euros por mês à instituição. “Era um custo mensal que tínhamos e que era dispensável para uma associação sem fins lucrativos”, diz Sónia Margarida. Para além disso, a Raríssimas compromete-se a rever e a “racionalizar” alguns aumentos salariais que estavam previstos e que ficarão agora adiados.
Paula Brito e Costa, ex-presidente da Raríssimas
A necessidade de distanciamento de práticas do passado levou a nova direção a assumir o que define como um compromisso com a transparência: “Não temos nada, mesmo nada, a esconder. Não queremos tomar conclusões definitivas sobre o passado, mas precisamos de garantir o futuro.” Para isso, a instituição criou um sistema em que comunicará aos seus mecenas o destino concreto de cada donativo concedido.
“A suspensão de Paula Brito e Costa mantém-se, as contas bancárias já estão sob a nossa responsabilidade”, garante a nova presidente, num esforço claro de reforço da confiança. As mudanças, diz a direção, vão para além da troca de rostos: a Raríssimas está atualmente a alterar a sua governance (regras de conduta), a criar um novo organograma e a manter sessões de porta aberta com a direção. Mais do que isso, pretende complementar a sua auditoria anual com uma auditoria global, de maior escala, estando para isso a consultar empresas do sector.
“Só se fala de Paula Brito e Costa e de Margarida Laygue, mas a causa é muito maior do que isso.”
Para trás fica a direção de Paula Brito e Costa cujas práticas, denunciadas por uma reportagem da TVI, podem representar desvio de fundos da instituição. A direção de Sónia Laygue não se alonga em considerações sobre o passado: “Não temos meios para avaliar os atos em causa”, diz a presidente, sublinhando que os esclarecimentos das autoridades competentes, internas e externas, surgirão “nos momentos próprios.”
No entanto, a presidente não se coibiu de reconhecer alguns erros do passado ao abrir a conferência agradecendo aos jornalistas: “Sem a comunicação social, o caso [de Brito e Costa] poderia ser identificado demasiado tarde e por isso mesmo agradecemos o vosso trabalho”, disse. Com apenas um mês de vida, a nova direção da Raríssimas reconhece estar a viver “uma fase atribulada” que necessita de “serenidade”, razão pela qual fez este apelo a contribuições.
Margarida Laygue pede aos mecenas “e aos portugueses” que acreditem na “boa fé da nova direção”. “Tendo em conta a crise reputacional que vivemos e o seu impacto na contribuição de vários mecenas, sentimos que é necessário mudar o rumo das coisas”, afirma. Para isso, sublinha, a Raríssimas necessita de donativos para manter a Casa dos Marcos a funcionar em pleno e dar apoio aos seus utentes e famílias dos portadores de doenças raras: “Só se fala de Paula Brito e Costa e de Margarida Laygue, mas a causa é muito maior do que isso.”
Fonte: O Observador
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