Entre 2004 e 2006 a Câmara Municipal de Silves, liderada pela presidente Isabel Soares e por uma maioria absoluta do PSD, entendeu dar à empresa Viga d’ Ouro, de Tunes, um enorme número de empreitadas. Na azáfama de tanta obra, a autarquia esqueceu-se de cuidar do bem comum. Os relatórios oficiais são arrasadores: neste período foram feitas obras sem concurso, no valor de quase cinco milhões de euros, todas pela mesma empresa, que cobrou pelo seu trabalho cerca de cinco vezes mais do que o preço normal de mercado.
Esta é a essência do caso Viga d’ Ouro, foi assim que tudo começou. Não me deterei agora em mais pormenores, porque os mesmos são conhecidos da maioria dos leitores e porque nesta edição temos um bom espaço reservado ao assunto.
Mas não posso alinhar na atitude de quem desvaloriza o caso, como se fosse um eco do passado distante que em nada nos perturba. Não é. Por muitas razões e por mais uma: até ao final de 2020 estaremos a pagar as dívidas contraídas nesses anos.
Mas também não posso alinhar na atitude de quem desvaloriza o caso porque entendo que o assumir de um cargo num órgão autárquico implica não só competência como também honestidade pessoal e política e um sentido de cidadania, de dever e de serviço público que de forma alguma é compatível com o que se passou na Câmara Municipal de Silves.
E também não posso alinhar na atitude de quem desvaloriza o caso porque lembro muito bem a atitude de prepotência e de desconsideração que incidiu sobre o jornal Terra Ruiva, em mim enquanto sua diretora e sobre alguns colaboradores, quando começámos a publicar notícias sobre o “caso Viga d’ Ouro”. Lembro-me de sermos acusados de publicar mentiras e de visarmos prejudicar o partido político no poder, apesar dos nossos artigos serem baseados em documentos oficiais. E de nunca, nem uma única linha publicada ter sido desmentida!
Há alturas em que, “doa a quem doer”, como diz o presidente da República, é necessário tomar posição. Em toda a sua existência o Terra Ruiva nunca abandonou a sua linha editorial e o esforço de ser um jornal sério, credível, empenhado nos grandes valores de democracia, liberdade, pluralismo, justiça social.
A sentença que o Tribunal de Contas determinou sobre os ex-presidentes Isabel Soares e Rogério Pinto, ao contrário do que alguns poderão pensar, não nos traz nenhuma satisfação profissional ou pessoal, porque deploramos e condenamos os atos que levaram até essa sentença. Mas o facto de que, ainda que tardiamente e muito parcialmente, ter sido feita alguma justiça, devolve ao nosso pequeno mundo um pouco de estabilidade, em que vemos os “erros e omissões”, como diz o tribunal, a ser condenados.
Mais do que os valores a que os autarcas de Silves foram condenados a devolver, considero importante enquadrar esta pena num esforço que tem de ser feito para responsabilizar os eleitos pelos atos de gestão danosa das autarquias que dirigem.
A generalização dessa consciência e prática, não só nas autarquias mas em todos os serviços públicos e nas instituições, associações e clubes que recebem verbas públicas, implicará um conceito diferente de responsabilidade e exigência de competência.
Uma maior responsabilização poderá trazer dúvidas e receios aos que são eleitos para dirigir… mas servirá de entrave àqueles que ambicionam os cargos e os dinheiros públicos para deles se servirem, a nível pessoal e/ou partidário. O que, feitas as contas, será muito útil ao país. E à verdade.
Fonte: terraruiva
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