Representação de Protestantes derrubando imagem de Nossa Senhora |
- Padre David Francisquini *
Analisando os fatos históricos decorrentes da ação nefasta do protestantismo — que arrebatou da Santa Igreja metade da Europa —, pode-se conjecturar que mesmo depois do Concílio de Trento prosseguiu um trabalho sutil, matreiro, silencioso e bem orquestrado por parte daqueles que, não aderindo abertamente à heresia luterana, preferiram permanecer no interior do Corpo Místico de Cristo para continuar a corrompê-lo.
Essa obra infausta iniciou-se com Jansênio (1585-1638), pregador da volta da Igreja à penitência e aos tempos primitivos. Ele afirmava que, com a Redenção, Cristo não teria morrido por todos os homens, mas apenas pelos eleitos, capazes de obter a graça eficaz para a consecução de todo bem. Essa escola de pensamento religioso levou muitas almas ao temor e ao desespero.
Antoine Arnauld (1612-1694), prócer da mesma corrente herética, publicou o livro A Comunhão frequente, no qual induzia à penitência pública, à dilação da absolvição para satisfação dos pecados e — como meio salutar de penitência —, ao afastamento das almas da comunhão frequente, chamada por ele de “luxúria espiritual”. Apesar disso, seu livro obteve na época a aprovação de nada menos que 11 bispos…
O jansenismo representou um verdadeiro câncer que arruinou o edifício religioso das almas dos fiéis. Ele chegava ao ponto de deixar os doentes morrerem sem os devidos sacramentos. Sem destruir os altares dos santos e de Maria Santíssima, esses inimigos da fé atacavam sutilmente essa devoção, sob o pretexto de afastar abusos e fórmulas exageradas. Aparentemente submissos à orientação da Igreja, os jansenistas procuravam encontrar meios cada vez mais escusos para explicar a vida interna da Igreja, mas sem mudar os sentimentos que os alinhavam aos seus antepassados protestantes.
No seu afã de mitigar o fervor religioso nas almas dos fiéis, os jansenistas se valeram de todos os ardis possíveis para afastá-los da devoção a Nosso Senhor e a Nossa Senhora. Chegaram a afirmar que se tratava de devoções imprudentes, indiscretas, que concorriam para desacreditar a Igreja. Inimigos sempre os houve na Igreja, ora agindo às claras, ora — mais frequentemente — se apresentando de maneira camuflada, num trabalho paulatino de demolição das instituições eclesiásticas internas e de dessoramento da vida espiritual dos fiéis.
Em seu livro Revolução e Contra-Revolução, Plinio Corrêa de Oliveira cita Pio XII quando este sustenta: “É um inimigo que se tornou cada vez mais concreto, com uma ausência de escrúpulos que ainda surpreende: Cristo sim, a Igreja não! Depois: Deus sim, Cristo não! Finalmente o grito ímpio: Deus está morto”. Se a Revolução é processiva — como podemos ler nas páginas da obra supracitada —, eis o referido processo e seu desenvolvimento no seio da Santa Igreja com o escopo de destruí-La.
Alegando sempre e antes de tudo zelo pelas almas, ei-lo que inicia a ruína individual das pessoas ou de uma instituição como a Igreja. Depois, em nome da fé, procura demolir as devoções multisseculares. Por fim, começa a se infiltrar em todos os campos da vida humana, para demolir com mais eficácia as estruturas da fé católica, o fervor das principais devoções com foco em Nosso Senhor e Nossa Senhora. Uma vez obtido isso, os bons vão se tornando tíbios, deixando ao inimigo campo aberto para que implante seus mais ímpios desígnios. Assim chegamos ao neopaganismo de nossos dias.
A prova da existência desse processo corrosivo é a onipresença da mentalidade jansenista, a qual se manifesta, por exemplo, sob o manto de muitos sofismas, na protelação cada vez maior da administração dos sacramentos da Confissão, da Comunhão e da Crisma.
Frontispício de uma das primeiras edições (1796) de “Glórias de Maria Santíssima” |
O grande baluarte da luta contra o jansenismo foi Santo Afonso Maria de Ligório. Em suas missões por toda a Itália, ele promovia a devoção a Nossa Senhora e aos santos, pregava os Novíssimos do homem, a visita ao Santíssimo Sacramento, a recitação do Santo Rosário, o exercício da penitência, a frequência aos sacramentos da Confissão e da Comunhão, entre tantos outros bons ensinamentos e práticas. Esse santo escreveu o livro Glórias de Maria Santíssima [capa ao lado] para combater os erros do jansenismo, além de ter travado um debate apologético contra os seus fautores.
Afinal, para esse grande moralista, a “intercessão de Maria não é apenas útil, mas necessária à nossa salvação. Não de uma necessidade absoluta, mas de necessidade hipotética, pois esta é a ordem providencial estabelecida por Deus. Essa é a vontade de Deus, que tenhamos tudo, mas tudo por Maria. Por isso, procuremos a graça, mas procuremo-la por Maria. Ela é, pois, toda a razão da minha esperança: espero em Deus, fonte da graça, mas de que me serviria a fonte sem o canal que é Maria?“
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* Sacerdote da Igreja do Imaculado Coração de Maria – Cardoso Moreira (RJ).
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