Pela
primeira vez, uma equipa internacional de cientistas planetários,
que inclui David Vaz, do Centro de Investigação da Terra e do
Espaço da Universidade de Coimbra (CITEUC), observou o movimento de
ondas gigantes de areia, designadas megaripples
(“megaondulações”), no planeta Marte.
Esta
descoberta, resultado de cerca de uma década de observações (entre
2007 e 2016), assume particular relevância, uma vez que, até agora,
se pensava que estas estruturas - por serem constituídas por
partículas de areia mais grossa - não estariam ativas (o vento
atualmente não conseguiria fazer mover estas partículas). «Como
não existiam evidências de que se movimentavam, acreditava-se que
seriam "relíquias" da atividade de ventos mais fortes que
terão existido no passado em Marte. No entanto, as nossas
observações são bastante conclusivas e contrariam esta visão, ou
seja, as megaripples
em Marte estão definitivamente ativas»,
explica David Vaz.
Para
chegar a esta conclusão, de que afinal as “megaondulações”
movem-se pelo planeta vermelho, embora lentamente (cerca de 10
centímetros por ano), a equipa liderada por Simone Silvestro, do
INAF-Osservatorio
Astronomico di Capodimonte
(Itália), analisou mais de um milhar destas estruturas sedimentares,
utilizando imagens de alta resolução adquiridas pela sonda Mars
Reconnaissance Orbiter,
da NASA, em duas regiões de Marte: cratera McLaughlin
e Nili Fossae.
A
participação do investigador do CITEUC nesta descoberta centrou-se
no «processamento
das imagens da superfície obtidas pela sonda e na aplicação de
várias técnicas, desenvolvidas anteriormente, que permitem medir
com grande precisão os fluxos de sedimentos (velocidade de
transporte e quantidade de sedimentos transportados por ação do
vento) na superfície de Marte».
«Neste
estudo foi particularmente importante medir a velocidade e o modo
como as megaripples,
um tipo específico de ondulações que se formam pelo transporte de
sedimentos devido à ação do vento, se deslocaram durante um
intervalo de tempo de quase 10 anos terrestres»,
sublinha.
David
Vaz contribuiu também com um conjunto de medições de velocidade de
migração e fluxos sedimentares para dunas de outras regiões de
Marte, «que
serviram para enquadrar e explicar as observações feitas nas duas
áreas em que o estudo se foca»,
tendo participado ainda nos trabalhos de campo que decorreram no
deserto marroquino em 2017 e 2019, onde se estudaram «megaripples
terrestres. Este trabalho, no fundo, serviu de preparação e de
inspiração para as descobertas que fizemos posteriormente em
Marte».
Isto porque o fenómeno observado em Marte também se regista na
Terra, embora a escalas e velocidades muito diferentes.
Ainda
de acordo com David Vaz, doutorado em Geologia pela Faculdade de
Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra (FCTUC), este
estudo «é
importante porque demonstra, pela primeira vez, que estas estruturas
sedimentares (megaripples) estão ativas, e que o vento na superfície
marciana será suficientemente forte para movimentar partículas de
maiores dimensões, ou seja, esta descoberta vem confirmar que Marte
é um planeta bastante ativo do ponto de vista geológico, mesmo que
a velocidades muito menores do que na Terra, os processos geológicos
continuam a moldar a superfície do planeta».
A
equipa, que integra ainda cientistas da Università
degli Studi “Gabriele d'Annunzio”
(Itália), Lunar
and Planetary Laboratory, University of Arizona
(USA), Planetary
Science Institute
(USA) e Ben‐Gurion
University of the Negev
(Israel), pretende agora estender a investigação de megaripples
a todo o planeta Marte.
O estudo,
publicado recentemente no Journal
of Geophysical Research: Planets,
foi destacado e comentado na Science
na última semana. O vídeo com exemplos do movimento das dunas e
megaripples
está disponível em:
https://www.youtube.com/watch?v=hvTnTsZOZGs&feature=emb_logo
e o artigo científico em:
https://agupubs.onlinelibrary.wiley.com/doi/full/10.1029/2020JE006446.
Cristina
Pinto
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