sábado, 10 de julho de 2021

Eleições peruanas — maré vermelha?

Manifestação em Lima contra Pedro Castillo

  • Julio Loredo de Ízcue

Os meios de comunicação apresentam a vitória do candidato da extrema-esquerda, Pedro Castillo [foto abaixo], nas recentes eleições presidenciais no Peru, como a enésima prova da derrapagem inexorável do continente ibero-americano para o socialismo. Embora essa tendência seja tristemente real (escrevemos recentemente um artigo sobre isso para o público italiano),1 e haja muito com o que se preocupar, o empreendimento eleitoral de Castillo deve ser encarado como um incidente num conjunto muito maior.

Resultado ainda pendente

Com Pedro Castillo: Peru em direção ao socialismo

No momento em que escrevemos, os dados oficiais do ONPE (Escritório Nacional de Processos Eleitorais), com quase 100% dos votos apurados, dão a Pedro Castillo a vitória com 50,15% dos votos, contra 49,85% de Keiko Fujimori [foto ao lado]. Isso corresponde a uma pequena margem de aproximadamente 30.000 votos.

Chama a atenção o elevado número de atas com votos contestados, nos círculos eleitorais em que a candidata Keiko Fujimori recebeu mais votos. Aí começa a primeira perplexidade. Na verdade, aumentam os rumores de fraudes massivas a favor do candidato marxista. Sete escritórios de advocacia em Lima examinaram as atas, com a participação de centenas de voluntários em todo o país. Encontraram inúmeras irregularidades, contestando assim 802 assembleias de voto perante os júris eleitorais, envolvendo mais de 200 mil votos. Na cidade de Cusco, ‘fortaleza’ de Castillo, os advogados encontraram cerca de 45.000 votos suspeitos, muitos com assinaturas que não correspondiam ao registro de identidade nacional. Só não contestaram número maior devido à polêmica disposição que encerrou o prazo após tê-lo ampliado.

50% dos votos para candidato mais odiado

A figura do ex-presidente Fujimore ainda domina o cenário político do Peru

É impossível contar num simples artigo a saga da família Fujimori, que começou com Alberto, pai de Keiko, presidente do Peru por dois períodos. A guerra de propaganda contra ele tem algo de surreal. Poucos personagens foram tão difamados, vilipendiados, perseguidos. Apesar das evidentes luzes e inevitáveis sombras ​​em seu governo, não o perdoa a esquerda por ter desmantelado a revolução socialista militar de Velasco Alvarado e pela redução do terrorismo comunista à sua mínima expressão. Essa guerra não cessou até que ele foi levado para a prisão, onde cumpre uma pena severa. Apesar de sua idade e deterioração da saúde, todos os pedidos de libertação foram rejeitados: o ‘monstro’ deve permanecer trancado!

Depois de destruir o pai, essa enorme máquina de guerra descarregou artilharia contra sua filha e herdeira. No meio da campanha eleitoral, um promotor pediu 30 anos de prisão para Keiko; e de fato ela já passou 16 meses em prisão ‘preventiva’ durante a investigação. Para a propaganda, ela é filha do monstro, da corrupção encarnada, do mal absoluto. Só um peruano pode perceber quão visceral e generalizado se tornou esse ódio. Apesar dessa rejeição massiva instilada pela propaganda, Keiko conseguiu até o momento 49,85% dos votos válidos. Diante disso, o dado eleitoral importante é que, disputando com Keiko, a candidata propagandisticamente mais odiada da história do Peru, a muito custo Castillo obteve 50% dos votos.

Isso diz muito sobre a situação real da opinião pública peruana. Significa que a rejeição ao comunismo é tão forte, que em muitos casos supera até mesmo o ódio contra Keiko. Opositores históricos de Fujimori, como Mario Vargas Llosa, ganhador do Prêmio Nobel, falaram também a favor da candidata da Fuerza Popular.

Isso também significa que nem todos os votos de Pedro Castillo são da esquerda. Analistas estimam que pelo menos 30% deles são votos anti-Fujimori. Ou seja, no Peru não há maioria de esquerda; muito pelo contrário, pois no primeiro turno os candidatos de centro-direita somaram 68% dos votos.

Reação anticomunista

O fenômeno mais interessante que se manifestou durante as eleições é a reação anticomunista muito forte, especialmente entre os jovens. Assim que se tornou evidente o perigo real de o Peru sofrer o mesmo destino da Venezuela, um grito se ergueu das profundezas da opinião pública: Comunismo nunca! Nas cidades, cartazes anticomunistas, rosários contra o comunismo em praça pública, camisetas com slogans anticomunistas, folhetos com textos do Magistério Pontifício contra o comunismo, frases de Nossa Senhora de Fátima condenando “os erros da Rússia”, que se espalhariam pelo mundo. Em muitas cidades, incluindo a capital, grandes manifestações populares foram realizadas contra o comunismo, enquanto vários jogadores da seleção nacional de futebol fizeram declarações anticomunistas.

         Esta reação foi especialmente forte entre os jovens, revelando a existência de um setor amplo, informado e militante que não teme expor-se politicamente para evitar que o país caia no comunismo. É interessante notar que esta geração não experimentou o inferno da ditadura Velasco Alvarado.

A rejeição ao comunismo, portanto, é baseada em princípios. Oferece-nos um retorno a este fenômeno muito interessante da opinião pública, visível em quase todas as partes da América Latina, e que funciona como um contrapeso à ‘maré vermelha’marxista que invade a América Latina.

Na Igreja, poucas vozes claras e muitas omissões

Mons. Javier Augusto Del Río Alba, Arcebispo de Arequipa

Um último ponto, em certo sentido o mais importante, é a triste omissão de grande parte dos pastores da Igreja abstendo-se de ensinar ao rebanho de Jesus Cristo a incompatibilidade entre catolicismo e socialismo, justamente em um momento histórico em que isso era essencial. Mas uma clara e forte reação anticomunista foi sentida em vários setores do clero. Até alguns bispos, incluindo o Arcebispo de Arequipa, a segunda maior cidade do país, se manifestaram abertamente contra o comunismo, lembrando aos fiéis que o Magistério da Igreja o condena. Alguns até evocaram a excomunhão declarada pelo Papa Pio XII, em 1949, contra aqueles que apoiavam o comunismo.

A Conferência Episcopal Peruana emitiu uma nota oficial declarando: “A Igreja sempre rejeitou e condenou o comunismo”, mas lamentamos não ter havido a divulgação necessária. O YouTube encheu-se de vídeos em que sacerdotes alertam contra o perigo comunista, tornando presente a doutrina católica a esse respeito.

Um caso paradigmático foi o manifesto anticomunista publicado no Facebook por jovens seminaristas do Seminário Maior de São Toríbio, na capital peruana. Embora tenha sido imediatamente retirado pelos superiores, o texto continuou a circular nas redes sociais, indicando que algo muito profundo está acontecendo no clero do Peru.

Eleições deixam o Peru à beira do
precipício marxista

As duas principais nomeações do Papa Francisco merecem menção especial: o Emmo. Cardeal Pedro Barreto, Arcebispo de Huancayo, e o Exmo. Dom Carlos Castillo, Arcebispo de Lima. Vários observadores têm apontado como as posições de ambos, nos últimos anos, tendem a coincidir com as da “esquerda católica”. Muitos consideram que o primeiro favoreceu indiretamente o voto de esquerda.O segundo advertiu que nenhum candidato poderia ser excluído a priori ou demonizado; omitindo, é claro, que o comunismo é “intrinsecamente mau”.

Omissões e meias palavras contribuíram para que o polo de esquerda atraísse muitos católicos desavisados, bem como aqueles afetados pelo orgulho igualitário e pela inveja. A maioria dos pastores não parece preocupada com o mal que o lobo pode fazer às ovelhas.

A esquerda não dominará facilmente o povo peruano

Embora o resultado ainda esteja tecnicamente em suspenso, o predomínio da esquerda a favor do candidato marxista é evidente. Entretanto, um eventual governo de Pedro Castillo terá que enfrentar uma reação anticomunista muito forte, visível até mesmo entre o clero. Cada passo em direção ao socialismo terá a oposição de uma opinião pública cada vez mais convencida de que este é o caminho errado, não só politicamente, mas também — e sobretudo — teologicamente.

ABIM

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Notas:

1.https://www.atfp.it/notizie/306-analisi/1930-l-america-latina-si-tinge-di-rosso-con-l-aiuto-del-progressismo-cattolico-2

2.Já em 2019, o Cardeal havia afirmado que “a Força Popular nunca quis o bem do Peru, isso deve ser dito com clareza”. Quando, por insistência de um jornalista do “Expreso”, falou sobre a questão subjacente, disse: “O comunismo é condenado pela Igreja como um sistema perverso, assim como o capitalismo. O Papa Francisco e João Paulo II condenaram o capitalismo com palavras muito duras”. No entanto, omitiu que a condenação da Igreja não é dirigida ao próprio sistema capitalista, mas aos pecados humanos que às vezes são praticados sob a sua proteção. O comunismo, pelo contrário, foi condenado em si mesmo.

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