O medronheiro e o medronho necessitam de uma fileira forte e estruturada, que inclua todos os intervenientes da cadeia de valor, para que possa definitivamente afirmar-se no contexto regional e nacional como uma aposta de futuro em que vale a pena investir pois há retorno para os envolvidos. Esta foi uma das notas dominantes da iniciativa “Conversas à Volta do Medronho”, que se realizou no dia 19 de dezembro, integrada na programação do Mercado dos Sabores de Natal, e que contou com a presença de João Lobo, presidente da Câmara Municipal de Proença-a-Nova – que moderou o debate, Hélio Loureiro, gastrónomo, Carlos Fonseca, do ForestWISE – Laboratório Colaborativo para Gestão Integrada da Floresta e do Fogo, Rui Lopes, nutricionista, investigador e empresário, e João Dias, engenheiro agrónomo.
Apesar do seu enorme valor e potencial, o medronho é ainda pouco conhecido da generalidade dos portugueses que o associam maioritariamente à aguardante. “Sou um apreciador de medronho há muitos anos e há uma dificuldade enorme de o encontrar em fresco nas grandes superfícies, nos supermercados e nas frutarias, e as pessoas desconhecem por completo o seu sabor enquanto fruto, além de que gostavam de o ter, mas não sabem onde o encontrar. Devíamos ter em conta, para o futuro, esta importância gastronómica”, salientou Hélio Loureiro. Sendo um produto facilmente encontrado na Beira Interior, o conhecido chef junta ainda uma outra vertente à sua promoção: a turística, tendo em conta “a vontade de as pessoas conhecerem Portugal também pela cozinha. As pessoas viajam muito para conhecer produtos novos, pelo que este espaço para o medronho será importante”.
Do ponto de vista ambiental, Carlos Fonseca apontou a polivalência do medronheiro, espécie arbustiva autóctone, nativa – “muito nossa” e muito resiliente: “após a passagem do incêndio, o medronheiro é das primeiras espécies a regenerar”. Existem experiências muito bem-sucedidas de plantações com medronheiro e sobreiro, estando os benefícios mútuos entre as duas espécies a ser estudados na Escola Superior Agrária de Coimbra. “Não conseguiremos diferenciar o uso deste fruto se não houver, de facto, conhecimento associado e, contrariamente àquilo que possamos pensar, há muitas instituições a desenvolverem investigação científica aplicada ao medronho e ao medronheiro”. Na sua perspetiva, esta fileira atravessa um momento crucial que pode posicionar o país como “o grande produtor de medronho a nível mundial”, sendo preciso continuar a dar passos decisivos, como o que foi dado há alguns anos de criar as primeiras plantações ordenadas, num processo dinamizado pelo Pinhal Interior.
Para isso é necessário apostar na notoriedade do produto, que pode ser utilizado para a produção de aguardente, pode ser consumido em fresco, pode ser utilizado como planta ornamental ou em outros usos que começam agora a despontar, como o pão de medronho desenvolvido por Rui Lopes. “É dos frutos que estudei, das bagas vermelhas, aquele que tem a maior concentração e disponibilidade de compostos bioativos. Quando decidi fazer pão de medronho tinha o objetivo de garantir pelo menos 5% de atividade antioxidante no pão. Hoje estamos com 19,38%.”, refere, o que só foi possível alcançar com investigação e investimento. Para que o pão de medronho possa estar disponível em mais pontos de venda para além de Leiria, Rui Lopes precisava de mais de 30 toneladas de fruto e só conseguiu menos de um terço, o que o leva a incentivar a que mais pessoas invistam na sua plantação. “Estamos perante um fruto que encontramos facilmente em todo o país e que pode trazer um bom retorno financeiro para as economias caseiras”.
Para João Dias, está na hora de criar uma cadeia de valor do medronheiro e do medronho, à semelhança do que já foi feito com outras espécies em Portugal, nomeadamente a pera e a maça. Na sua perspetiva, quando se aborda este tema é preciso considerar a mitigação das alterações climáticas, que se fazem sentir particularmente no concelho, e a sustentabilidade: a de longo prazo, relacionada com os mosaicos florestais e uma floresta mais biodiversa, e a direta, “a que faz com que as pessoas se fixem no nosso território”. Para isso, é necessário retirar rentabilidade da produção, com a criação direta de emprego. Considerando outros produtos endógenos, como os cogumelos, o mel, a cereja ou o limão, o medronho “é o que nos pode dar frutos mais rápido”. Garantir retorno financeiro é fundamental para motivar as pessoas a investirem neste produto.
“Onde nós não produzimos riqueza, as pessoas abandonam o território”, referiu, por sua vez, João Lobo. Para o autarca esta pode ser uma aposta de futuro, incluindo nos terrenos que estão a ser intervencionados nas faixas de proteção dos aglomerados populacionais. Face à falta de mão de obra para a colheita do medronho, ainda um processo manual, é necessário criar condições para a fixação de trabalhadores, numa primeira fase de forma sazonal, recorrendo à imigração sempre que o mercado interno não der resposta. Pela urgência de dar músculo a esta fileira, João Lobo irá agendar no início do ano uma reunião com interlocutores relacionados com este produto, incluindo a Cooperativa do Medronho, no sentido de se criar nova dinâmica para o medronheiro com impactos positivos neste território.
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