sábado, 10 de dezembro de 2016

Macroscópio – Falando de Educação: o que podemos aprender com outros – e os outros connosco.

Macroscópio

Por José Manuel Fernandes, Publisher
Boa noite!

Nas duas últimas semanas foram publicados os resultados de dois grandes estudos internacionais que permitem comparar o grau de aprendizagem de estudantes de dezenas de países e territórios. Um, o TIMSS (Trends in International Mathematics and Science Study) avalia a literacia em matemática e em ciências de alunos do 4º ano de escolaridade e é IEA (International Association for the Evaluation of Educational Achievement) desde 1995 com periodicidade quadrianual. O outro, o PISA (Programme for International Student Assessment) realiza-se de três em três anos e é organizado pela OCDE, visando avaliar se os alunos de 15 anos, de todas as modalidades de educação e formação, conseguem mobilizar os seus conhecimentos e competências de leitura, matemática ou ciências na resolução de situações relacionadas com o dia a dia. Em ambos houve boas notícias para Portugal, que subiu nos rankings e já se encontra bem situado entre os países desenvolvidos. Depois de termos começado pelo fim da tabela, a melhoria dos nossos resultados foi tão significativa que chamou mesmo a atenção de alguma imprensa internacional.
 
Comecemos pelos dados, que o Observador sintetizou em Alunos do 4.º ano estão melhores a matemática e até ultrapassaram a Finlândia (notícia sobre o TIMSS) e Alunos portugueses acima da média da OCDE pela primeira vez em 15 anos (notícia relativa ao PISA). Aqui podem os leitores encontrar o essencial da informação, sendo notável o que nos mostra o gráfico da evolução no PISA desde que participamos neste estudo, isto é, desde 2000:
 
 

Para um conhecimento mais detalhado dos dados deste estudo os interessados podem consultar o site do IAVE (Instituto de Avaliação Educativa) onde é possível descarregar os documentos completos:
 
A divulgação destes resultados suscitou naturalmente discussão política, até porque o TIMSS abrangeu alunos que iniciaram os seus estudos exactamente no ano em que o anterior governo entrou em funções (2011), constituindo por isso como que um “exame” às políticas educativas de Nuno Crato e à sua forte aposta na Matemática. Talvez por isso mesmo dois dos órgãos de informação internacionais que analisaram o exemplo português – a revista britânica The Economist e o diário espanhol El Pais tenham optado por o ouvir.
 
A The Economist dedicou ao PISA um artigo bastante longo e detalhado – What the world can learn from the latest PISA test results – onde se sublinha que “Reforming education is slow and hard, but eminently possible”. Depois de uma rápida introdução às controvérsias que sempre rodeiam este tipo de testes, sublinha-se que “PISA has flaws. It is one of many standardised tests, and tests are not all there is to learning. But it matters. It is the most influential research report in education for good reason. It offers informed guidance on what policymakers should do to fix their school systems. Just as importantly, it tells them what not to do.” E entre o que não se deve fazer está, por exemplo, aumentar sem critério o investimento em Educação, pois “Money isn’t everything”.
 
Sobre Portugal nota-se que se trata de “Another impressive mover, albeit more of a tortoise than a hare, is Portugal. Since 2006 it has steadily improved its scores across each subject by about a year of schooling, overtaking the United States as it went from a middling to an above-average performer.” E depois acrescenta-se: “There are three reasons for Portugal’s steady progress, says Nuno Crato, the country’s former education minister. First, it began to care about results, introducing new standardised tests. Second, a new curriculum with higher standards was introduced from 2011. Third, it has reduced the amount of streaming by ability, keeping its use “temporary and partial”. Struggling pupils may get extra tuition but teachers will try to keep them in the same classes as their peers.”
 
Já o El Pais é mais directo, a começar pelo título escolhido para o seu artigo: El secreto portugués para mejorar casi 30 puntos desde que existe PISA. Depois de descrever os novos avanços comparando-os com a relative estagnação de Espanha, o diário de Madrid também cita Nuno Crato, que “Achaca la mejora a su trabajo en el ministerio, concretamente a la introducción de nuevas metas curriculares en el curso 2013/2014 para los alumnos de 1º a 3º, que se extendieron a los de 2º y 4º en el curso siguiente, además de exámenes finales a los alumnos de 4º año, ya el pasado curso.” O jornal cita depois o director do IAVE, João Marõco, que concorda parcialmente com o ex-ministro, nomeadamente ao sublinhar o papel dos exames finais: "Los exámenes", señala el profesor Marõco, "consiguen una doble objetivo: comprometen a los profesores a cumplir el programa y compromete al estudiante porque sabe que va a tener un examen final de todo el año lectivo".
 
E em Portugal que foi que se escreveu? Porventura menos do que o necessário para aprofundar o debate, mas mesmo assim o suficiente para já termos alguns pontos de vista importantes, sendo que quase todos apontam para a necessidade prosseguir as políticas que vinham do passado, algo que contraria as opções do actual ministro da Educação, que optou por acabar com os examos no 4º e no 6º anos, por exemplo.
 
Merece por isso destaque o que escrever Alexandre Homem Cristo no Observador em Na política, Educação discute-se mas não se pensa. Sublinha ele: “Sim, o TIMSS mostrou que os alunos do 4.º ano melhoraram sob a tutela ministerial de Nuno Crato. Sim, o PISA mostrou que os alunos de 15 anos melhoraram ao longo do mandato do anterior governo. Mas isso importa? Para o actual governo, não: sem esperar por avaliações nacionais ou internacionais, sem recorrer a estudos, sem qualquer suporte empírico e apenas munidos de preconceitos, PS/PCP/BE reverteram inúmeras medidas estruturais de Nuno Crato – na avaliação dos alunos, na avaliação dos professores, no currículo. Aquelas cujo impacto positivo agora conhecemos e lançou os alunos portugueses para cima da média da OCDE. Que os quatro partidos que apoiam o governo sejam indiferentes a isto é alarmante.”
 
A preocupação com a reversão de políticas que estavam a ter sucesso é comum a outros colunistas, como João Miguel Tavares, no Público, em Justiça para Nuno Crato, onde depois de notar que a FENPROF não festejou estes resultados (ao contrário da Sociedade Portuguesa de Matemática, por exemplo), acaba por escrever na sua condição de pai de quatro filhos: “Qualquer pai, excepto aqueles para quem a definição de felicidade é não trabalhar, sabe que metas e exames são uma forma eficaz de exigir mais aplicação aos alunos e aos professores. O aumento dos níveis de ansiedade é largamente compensado pelas competências que se conquistam ao nível do estudo, do empenho e da concentração num objectivo.”
 
No Expresso Diário Henrique Monteiro escolheu um título irónico para a sua crónica: Macedo e Crato, destruidores implacáveis(paywall). Como se depreende associa a recuperação para a CGD do “destruidor” do SNS aos resultados da políticas educativos do “destruidor” da escola pública. E nota: “Os dois casos são interessantes porque não têm nada a ver um com o outro, salvo esta coisa que os nossos politiquissimamente corretos arautos da pós- modernidade abominam: rigor, exigência, disciplina, eficácia, trabalho, mais trabalho e orelhas moucas aos muitos lóbis e sindicatos que infestam ambos os sectores.”
 
Referência ainda para os textos dos dois ex-ministros da Educação que podem ser considerados responsáveis directos pelas subidas mais pronunciadas nos testes PISA e que escreveram no Diário de Notícias. Maria Lurdes Rodrigues (a quem podemos atribuir a subida de 2009): PISA 2015: qualidade e equidade na educação; e Nuno Crato (que foi ministro nos anos que antecederam a subida de 2015): Melhorámos! Podemos ainda melhorar!
 
Antes de terminar por hoje gostaria de fazer uma referência a um país que tem vindo a percorrer um percurso inverso do português, a Finlândia. Caiu no TIMSS e no PISA e isso sucede pela segunda vez. Não encontrei textos que analisem o que se passou nestes últimos testes, mas deixo-vos mesmo assim uma referência à preocupação que já se notava em 2013: Finland Used To Have The Best Education System In The World — What Happened?, interrogava-se a Business Insider. Nesse texto cita-se Kai-Ari Lundell, um professor que chegou a ser considerado o melhor do país, e que no final se lamenta: "Some teachers think that our life in Finland is so easy, our pupils have forgotten how to work," Lundell says. "You won't learn mathematics if you don't work enough."
 
Mas esta é apenas uma de muitas pistas para compreender o que pode estar a acontecer num país tido como exemplar – uma pista que no Macroscópio se tentará explorar numa outra ocasião.
 
Por hoje, e depois de por uma vez ter estado a debater boas notícias para o nosso país, despeço-me como desejos de um bom fim-de-semana.
 
 
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