Ainda é Novembro mas já começaram os almoços e os jantares de Natal. São mesas enormes cheias de sorrisos forçados, reproduzindo até ao pormenor as hierarquias que em vigor durante todo o ano.
Há um fingimento de folia, um riso postiço que é filho mais da água do que do vinho, um humor fácil, medido a gargalhada curta, que é prontinho de mais para ser convincente.
As mesas com ementas fixadas de antemão são as menos alegres. Nalgumas chega-se ao luxo de poder escolher entre o arroz de frutos do mar e o empadão de farinheira. O vinho é da casa, as garrafas estão contadas e "não, não é possível pedir que se faça uma sangria à parte com uma delas, não, nem pagando mais um bocadinho, já está tudo pago, não sei se me estou a fazer entender, mais alguma coisa em que eu possa não ajudar?"
As máscaras fazem-se pagar. Comem a cara. Quanto àquele ríctus que usamos para fazer de conta que nos estamos a divertir enquanto ouvimos o chato do contencioso a contar como é que se vai da Buraca para Barcarena sem usar o IC19 - ele pode ficar-nos esculpido nas bochechas para sempre.
Às vezes há um bolo e tudo: um bolo-rei especialmente trazido pelo patrãozinho da pastelaria Princesa de Mem Martins, completo com uma quantia excepcional de abóbora cristalizada, tingida de verde.
Por ser Natal, há até uns fios de ovos a decorar o buraco no meio que é melhor ninguém tentar comer, até porque provavelmente sobraram do ano passado.
O fim tarda mas lá chega: "Toma uma jeropiga, para rematar?" "Não".
Fonte: Público
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