Alexandre
Correia,
cientista da Universidade de Coimbra (UC), integra uma equipa
internacional que descobriu
um sistema planetário particularmente interessante em torno da
estrela WASP-148.
O estudo vai ser publicado brevemente na revista Astronomy
& Astrophysics.
O
sistema descoberto possui dois planetas com massas semelhantes a
Saturno, e com períodos orbitais de apenas 9 e 35 dias. Esta
configuração origina variações nos períodos orbitais devido às
interações gravitacionais entre os dois planetas. Estas
variações foram observadas pela primeira vez a partir da superfície
da Terra.
Desde
a descoberta, em 1995, do primeiro exoplaneta (planeta em torno de
uma estrela que não o Sol), que o número de novos planetas
conhecidos não para de aumentar. A procura de sistemas com vários
planetas em torno da mesma estrela é particularmente interessante,
uma vez que eles interagem entre si e permitem determinar mais
propriedades sobre o sistema.
Quando
existe um único planeta em torno da estrela, ele tem um período
orbital bem definido, que não varia com o tempo. Sempre que o
planeta passa em frente da estrela, «podemos
detetar uma pequena diminuição na luz desta, fenómeno apelidado de
"trânsito planetário". Os trânsitos ocorrem em
intervalos de tempo regulares, permitindo que o período orbital do
planeta seja medido com bastante precisão. Se a estrela hospedar um
segundo planeta, as interações gravitacionais entre os dois
planetas originam pequenas modificações das suas órbitas. Como
consequência, os trânsitos planetários ocorrem um pouco adiantados
ou atrasados entre duas passagens em frente da estrela, um fenómeno
chamado de "variações do tempo de trânsito" (ou TTVs na
sigla em inglês)»,
explicam os autores do estudo, liderado pelo Instituto de Astrofísica
de Paris (França).
Embora
previstas do ponto de vista teórico, as TTVs permaneceram sem ser
observadas durante muito tempo, apesar de inúmeras observações com
telescópios terrestres. Com efeito, na maioria dos casos, as
interações gravitacionais levam a TTVs de apenas alguns segundos ou
menos, que são muito difíceis de detetar. O telescópio espacial
Kepler foi o primeiro a conseguir medir TTVs num sistema planetário,
em 2010, às quais se seguiram outras medições, mas sempre através
de telescópios espaciais como o Kepler. A observação de TTVs exige
instrumentos muito precisos e simultaneamente planetas de grande
massa que se encontrem em órbitas relativamente próximas.
Nesta
descoberta, Alexandre Correia, investigador do Centro de Física da
Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra
(FCTUC), esteve envolvido «na
análise das interações entre os planetas. Verificámos com
simulações numéricas que o sistema é estável até inclinações
de 35 graus, e que as TTVs observadas estão de acordo com o que
seria de esperar para este tipo de sistema».
O
sistema planetário WASP-148 agora encontrado, salienta a equipa,
«foi
descoberto usando unicamente telescópios terrestres. O primeiro
planeta, com uma massa semelhante a Saturno e um período orbital de
apenas cerca de 9 dias, foi observado pela primeira vez pelo
instrumento SuperWASP, instalado no Observatório Roque de los
Muchachos em La Palma, nas Ilhas Canárias, Espanha».
A partir de 2014, a estrela foi igualmente observada com o
espectrógrafo de alta resolução SOPHIE (Figura 1 em anexo)
instalado no Observatório de Haute-Provence, em França, que mede as
variações na velocidade da estrela. A combinação destas
observações levou à conclusão de que a estrela WASP-148 hospeda
um segundo planeta, igualmente com uma massa semelhante a Saturno e
um período orbital de cerca 35 dias (Figura 2 em anexo).
Ao
contrário do primeiro planeta a 9 dias, o segundo planeta a 35 dias
não transita em frente da estrela. «Isto
deve-se ao facto dos dois planos orbitais serem diferentes. Não é
possível ainda sabermos exatamente qual a inclinação entre as duas
órbitas, mas simulações em computador sobre o sistema WASP-148
mostram que para o sistema permanecer estável a inclinação poderá
ser no máximo 35 graus»,
esclarece Alexandre Correia.
A
razão entre os dois períodos orbitais é próxima de quatro, pelo
que as interações gravitacionais entre os planetas são
amplificadas por um fenómeno conhecido por ressonância. Como as
massas dos planetas são elevadas, este sistema é o candidato ideal
para observar as TTVs a partir da Terra. De facto, usando pequenos
telescópios localizados nas Ilhas Canárias (telescópios Nites,
Carlos-Sánchez e Liverpool) e em França (Observatório amador
Hubert-Reeves, em Ardèche), verificou-se que os trânsitos ocorrem
com um quarto de hora de atraso ou de avanço (Figura 3 em anexo).
A
equipa sublinha que o resultado desta investigação constitui a
«primeira
deteção de TTVs a partir da superfície da Terra, obtida através
de mais de dez anos de observações. Nos próximos meses e anos, o
sistema WASP-148 será objeto de numerosos estudos teóricos e
observações adicionais, o que permitirá melhorar as medições das
suas propriedades e melhor compreender a sua estrutura e evolução».
Em particular, o sistema será observado em breve pelo telescópio
espacial TESS da NASA (Transiting Exoplanet Survey Satellite). «Estas
observações, com muito mais precisão que as efetuadas na Terra,
irão medir nove trânsitos consecutivos do planeta a 9 dias, o que
permitirá determinar a inclinação entre as duas órbitas»,
concluem os investigadores.
Artigo
científico: "Discovery and characterization of the exoplanets
WASP-148b and c. A transiting system with two interacting giant
planets", par G. Hébrard, R.F. Díaz, A.C.M. Correia, A.
Collier Cameron, J. Laskar, D. Pollacco, J.-M. Almenara, et al.,
2020, Astronomy & Astrophysics, in press (arXiv:2004.14645).
O
documento preliminar está disponível: aqui.
Cristina
Pinto
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