sábado, 26 de dezembro de 2015

A DELINQUÊNCIA JUVENIL NEM SEMPRE É UMA FATALIDADE

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Reinserção pela Arte é um livro que nasceu de muitas mãos e que resulta de um projeto que "viveu" em três centros educativos de Lisboa, de 2005 a 2008. Jorge Barreto Xavier coordenou o trabalho que envolveu jovens dos 13 aos 18 anos.

Na introdução, há uma frase que faz pensar. "A delinquência juvenil não é uma fatalidade", afirma o professor Jorge Barreto Xavier, coordenador de um projeto que deu origem ao livro Reinserção pela Arte que foi apresentado na quarta-feira no auditório 3 da Fundação Gulbenkian, em Lisboa, por Laborinho Lúcio e Viriato Soromenho-Marques. O docente explica o sentido da frase ao EDUCARE.PT

"Vivemos numa sociedade em que nos habituámos a aceitar certas coisas: a pobreza, a criminalidade, a delinquência juvenil. Quando digo aceitar, não digo que haja resignação perante estas fragilidades sociais - mas digo que acreditamos que todas elas hão de sempre existir, em maior ou menor grau." E continua: "É nesse sentido que a delinquência juvenil pode ser encarada como uma fatalidade. Creio que é necessário acreditar na efetiva erradicação da delinquência juvenil. É preciso trabalhar com objetivos máximos e não mínimos ou medianos.

Depois, procuramos aproximar-nos o mais possível da concretização destes objetivos, que não são para cumprir num ano nem sequer numa geração - mas se não forem estabelecidos com clareza, não podemos trabalhar em função deles."

O livro decalca um projeto experimental desenvolvido no Centro Educativo da Belavista na Graça, no Centro Educativo Navarro de Paiva em Benfica, e no Centro Educativo Padre António de Oliveira em Caxias, todos em Lisboa, entre 2005 e 2008. Em cada um desses anos, cerca de 30 jovens, com idades entre os 13 e os 18 anos, distribuídos pelos três centros educativos, envolveram-se em atividades artísticas nas áreas de teatro, música, dança, vídeo, fotografia, escrita, cinema, e design de espaços. O bailarino e coreógrafo Rui Horta, o ator e encenador Fernando Mora Ramos e a coreógrafa Madalena Victorino participaram nesse processo que pretendeu estimular a criatividade dos adolescentes internados nos centros educativos, que vestiram a pele de coautores, assistentes e colaboradores nesse trabalho artístico.

O projeto, que contou com o apoio da Fundação Gulbenkian, foi a adaptação de um programa do Reino Unido junto de jovens considerados de risco e sujeitos a medidas tutelares educativas. O livro problematiza, na primeira parte, a relação entre a arte e a reinserção social, e mostra como a criação artística é uma ferramenta na descoberta de competências que abra portas à reinserção de jovens problemáticos.

"As artes têm um discurso social autónomo, correspondem a uma presença social que tem as suas diferenças específicas em relação a outras áreas de atividade, e o seu trabalho é de grande valor na construção pessoal e coletiva. Se o ‘discurso artístico' tiver validade ‘construtiva' em ambiente controlado, como é o caso dos centros educativos, é válido pensar (com os devidos cuidados) que se pode extrapolar essa validade para o todo social", adianta Jorge Barreto Xavier, licenciado em Direito, professor auxiliar convidado do ISCTE e investigador associado do Centro de Investigação e Estudos de Sociologia, que coordenou o projeto e o livro.

Os intervenientes neste processo consideram que valeu a pena a intervenção, que teve como pano de fundo a reinserção social, e esperam que as recomendações e propostas feitas no livro sejam ouvidas. Jorge Barreto Xavier adianta alguns dos caminhos sugeridos na obra. "Tem de haver uma maior correlação entre o sistema de segurança social e o sistema de justiça - as articulações entre as políticas para crianças e jovens em risco, as políticas gerais na área da exclusão social e pobreza, as políticas de acolhimento de imigrantes e as políticas para a delinquência juvenil têm de ser articuladas". "Por vezes, com a ‘departamentalização' dos serviços públicos, funcionalmente necessária, perde-se o horizonte da prioridade ao resultado das políticas públicas, muitas vezes com muito maior necessidade de conjugação e articulação", acrescenta.

Os agentes ativos da sociedade civil não podem ficar parados. Por isso, no caso da delinquência juvenil, defende-se que é crucial a articulação entre a prevenção, o acompanhamento das medidas tutelares educativas e o acompanhamento da integração dos jovens. Segundo Jorge Barreto Xavier, este acompanhamento antes, durante e depois das medidas aplicadas, com o adequado envolvimento da justiça, segurança social e sociedade civil, é o caminho mais adequado para alcançar menores taxas de delinquência, menores taxas de reincidência e uma melhor inserção na sociedade. "Não se trata de uma questão financeira, mas de conjugação de vontades", refere.

As escolas estarão preparadas para lidar com a delinquência dos jovens? "Os professores ou, pelo menos, muitos professores, têm de lidar todos os dias com adolescentes e jovens com comportamentos desviantes, alguns dos quais têm ou terão comportamentos delinquentes". A questão, sustenta, é saber se os docentes estão ou não preparados para trabalhar com essas situações mais complicadas, se as escolas estão ou não organizadas para enfrentar esses casos e se há parâmetros nacionais para lidar com o assunto. "Diria que há ainda muito para fazer neste domínio, independentemente de, a nível individual, haver professores sensibilizados", comenta.

Resolver casos de abandono e de insucesso escolar continua a ser uma árdua tarefa. O coordenador do livro Reinserção pela Arte diz que é necessário definir que taxas de abandono e de insucesso são admissíveis em 2012, 2014, 2016, e estabelecer metas para que os objetivos se concretizem. "É preciso definir com clareza o objetivo final: não deixar nenhuma criança e jovem para trás." Até porque, lembra, "as últimas décadas, através dos maus resultados, têm demonstrado a desadequação dos meios para resolver os casos de abandono e insucesso escolar".

Por Sara R. Oliveira

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