terça-feira, 25 de julho de 2017

Indignação ao retardador


Diz o PCP que "o aumento das receitas da CGD, por via das comissões bancárias é mais um passo que visa impor à Caixa critérios de gestão em linha com a banca privada".
Tiago Freire
Tiago Freire 
A subida dos custos, e a limitação severa das isenções, tinha sido noticiada pelo Jornal de Negócios a 7 de Junho, seguindo-se, a 8 de Junho, uma conferência de imprensa da própria Caixa a falar exactamente da mesma coisa. Mas a indignação estalou ontem, após uma notícia do Público, levando também o Bloco a rasgar as vestes e o CDS a alinhar no bota-abaixo, que é de borla. O partido de Assunção Cristas pede esclarecimentos, enquanto Catarina Martins foca também a questão da gestão de tipo privada que está a ser aplicada no banco público. 

É verdade que há muita coisa que, ao abrigo do segredo de negócio, nós contribuintes não sabemos do plano para a CGD. Mas, daquilo que conhecemos e de todo o espírito da empreitada, o mínimo que se pode dizer é que os partidos andaram muito distraídos. 

Reclama o PCP, reclama o Bloco, como reclamaria o PS se estivesse na oposição, que a Caixa segue "critérios de gestão em linha com a banca privada". Verdade, verdadinha. Percebendo-se a utilidade do tom de indignação, o que não se entende é o tom de surpresa. Os cortes de pessoal em ritmo acelerado, o fecho de balcões, a subida das comissões, a própria escolha inicial de António Domingues e as garantias que lhe foram dadas - de remuneração e de sigilo quanto ao património - nada disto fez a esquerda suspeitar de nada. Mais, não fez a esquerda exigir uma maior transparência sobre o que foi acordado entre o Governo e Bruxelas, e não simplesmente imposto por Bruxelas, como fica bem à narrativa do culpado exterior.


Por diversas vezes alertámos aqui para o embaraço que este emagrecimento e esta nova filosofia seriam a nível político, por dificultar a explicação de que banco público seria este se passasse a comportar-se como um banco privado. Para António Domingues e para Paulo Macedo, a explicação é simples e é minimalista: o banco público define-se não tanto por ter obrigações de serviço público mas sobretudo por ser detido a 100% pelo Estado. Para que serve uma coisa sem a outra é coisa que ainda está por clarificar, mas há muito que se percebeu que seria assim. E não poderia ser de outra maneira, diga-se.

Enfim, até poderia. A alternativa era fazer uma intervenção mais severa na Caixa, reduzir à mesma a sua dimensão, impor perdas e, muito provavelmente, ter de envolver privados no capital. A manutenção da Caixa em mãos públicas, que é uma coisa boa e deve ser preservada, tem este custo. Como disse Paulo Macedo há cerca de um mês: "Se a CGD não der lucro tem que ir pedir mais dinheiro aos contribuintes. E tenho uma ideia de qual será a resposta".

A discussão sobre a "gestão privada" do banco público teria sido boa há uns meses valentes, mas ninguém a quis fazer. Agora, para sermos sérios, basta perguntar qual é a alternativa.

Fonte: Jornal de Negócios

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