Carolina Patrocínio foi criticada por continuar magra na gravidez. Carolina Deslandes gerou polémica com foto pós-parto
Uma barriga menos firme, estrias, queda de cabelo, manchas na pele, a cicatriz da cesariana, aqueles quilos que não desaparecem. São as marcas da gravidez, que enfrentam a ditadura dos corpos perfeitos, mesmo no pós-parto. Contrariando a obsessão pela perfeição corporal, há mulheres que se despem de preconceitos e exibem as marcas da maternidade. Foi o que fez recentemente a cantora Carolina Deslandes, que partilhou uma fotografia cerca de um mês após ter sido mãe para dar força a outras mulheres na mesma situação. Uma imagem que gerou polémica, pois houve quem considerasse que não estava em boa forma física.
"Vivemos numa sociedade em que existe pressão pelo corpo perfeito. Em todas e quaisquer circunstâncias. Com maior ou menor crueldade, dependendo também do grau de fragilidade do visado pelas críticas, que em fases específicas da vida - como num pós-parto - estará mais vulnerável às mesmas", destaca a ginecologista Marcela Forjaz. Uma pressão que, segundo a médica, "pode ser mais um fator a levar a mulher no pós-parto a uma baixa autoestima e até à depressão".
Ao DN, a cantora Carolina Deslandes explica que, quando chegou da maternidade, arranjou "550 mil desculpas pelo facto de não aparecer e publicar coisas". "Mas senti que estava a falhar a mim própria e ao propósito com o qual criei o blogue, que era falar da verdade." Assim, a jovem, que deu à luz duas vezes em 11 meses, decidiu partilhar com os seus seguidores o que estava a viver. "Dei por mim a pensar "Serei eu a única pessoa a passar por isto?" Esta fase em que não caibo em roupa nenhuma ainda, em que a barriga ainda está enorme e cheia de riscas, em que não consigo ver-me numa única fotografia e em que ando a fugir de espelhos?", escreveu no blogue.
Carolina não esperava o que aconteceu após aquela publicação. "Mesmo as pessoas que nunca tiveram filhos sentiram necessidade de se unir e isto acabou por criar mesmo um movimento feminino", recorda. Mas também houve quem criticasse sua forma física, como a apresentadora Maya, que a aconselhou "a fazer ginástica de recuperação pós-parto e a procurar uma nutricionista". "Quando fui mãe a primeira vez, não ganhei tanto peso. Desta vez foi mais agressivo, porque tive dois filhos em 11 meses. O meu corpo está cansado", afirma a cantora, destacando que depois do primeiro parto também foi alvo de apreciações negativas, durante um concerto, por "estar mais gordinha e com barriga pós-parto".
"Tens de ser magra"
A cantora achou "impressionante a quantidade de pessoas que passaram" pelo mesmo. Marcela Forjaz explica que "no pós-parto, entre os cuidados com a amamentação, com eventuais pontos, com a gestão da casa e de filhos mais velhos, as fraldas, os banhos, as visitas, quando finalmente a recém-mamã olha para si, por vezes terá dificuldade em aceitar o que o corpo mudou". Segundo a autora de O Grande Livro da Grávida, "esta questão prende-se não só pela imagem que tinha de si própria, mas também pela "formatação" que a levou, anteriormente, a ter essa imagem. É revoltante, mas o que está quase inscrito na consciência da mulher, a maior parte das vezes, é a forma como ela tem de ter a sua aparência e não o que será saudável para si". Mais do que "tens de ser saudável", a sociedade diz à mulher "tens de ser magra".
Tudo o que se afasta da "norma definida pela sociedade é alvo de crítica". "Temos exemplos de grávidas que "pecaram" pelo oposto, não mudaram, não engordaram, investiram na sua forma física, eventualmente porque já o faziam antes da gravidez, ou porque têm uma capital genético diferente, ou um metabolismo próprio. Desde que os seus bebés cresçam de forma harmoniosa e saudável, porque tem a sociedade de apontar o dedo?", questiona. Carolina Patrocínio, apresentadora da SIC, foi criticada precisamente por estar magra durante a gravidez.
Corpo magro é considerado belo
Maria João Cunha, investigadora do Centro Interdisciplinar de Estudos de Género, diz que "a latitude de aceitação é cada vez menor". "É criticada a pessoa que supostamente passou os limites e não mostra as formas de grávida e é criticada a pessoa que, por estar grávida, aumentou um pouco mais o seu peso. Há sempre um escrutínio, porque parece que a mulher tem de cumprir padrões que na maioria das vezes são impossíveis, irreais. É triste verificar que, até numa altura em que o corpo passa necessariamente por transformações, ainda tem todo esse escrutínio de cumprir ou não com aquilo que seria uma suposta forma ideal de mulher grávida", lamenta a também docente no Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas da Universidade de Lisboa.
A era dos "corpos perfeitos", explica Maria João Cunha, vem do final do século XX, "em Portugal sobretudo a partir dos anos 90" e está associada aos media, à indústria da moda, à publicidade. "O corpo magro é que é considerado o corpo belo. Há uma pressão muito forte, sobretudo para a mulher - não tão visível para os homens - que faz que possamos quase falar de uma ditadura do corpo. Por um lado, temos a ideia de que podemos ser o que quisermos, mas o que verificamos é o contrário."
Fonte: DN
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