terça-feira, 31 de julho de 2018

O pior de Catarina

Robles caiu, como expectável. A incoerência entre o discurso político e a prática privada não lhe dava outra saída. Pior esteve Catarina Martins, que achou por bem defender a conduta indefensável do vereador e a sua permanência no cargo: deu-se mal, duplamente.

Cronista
Adicionar legendaAndré Veríssimo 30 de julho de 2018 às 23:00






Ricardo Robles acreditou que podia viver uma vida com dois sistemas, como fez como Deng Xiaoping. Neste caso, ser dirigente de uma força política anticapitalista e, simultaneamente, um bem-sucedido empresário imobiliário. De manhã, criticar a especulação, à tarde, a gentrificação dos centros históricos e, no fim do dia, procurar ganhar milhões com o que andou a diabolizar.


Catarina Martins veio defender, com unhas e dentes afiados, o vereador da Câmara de Lisboa. É um colega de partido, é certo. Mas se o conflito de Robles era insanável, porquê especular sobre a sua sobrevivência política, expondo-se e sujeitando-se a ouvir recados de outras figuras do partido, como Luís Fazenda, que veio aconselhar "reflexão" e retirada de ilações? Chegar ao ponto de envolver o Presidente da República no barulho, para depois ser desmentida?


Os argumentos também não lhe saíram bem. Atirou a responsabilidade para as manchetes dos jornais e usou como argumento que Robles não vendeu prédio nenhum, ao contrário do que se escreveu, apenas o pôs à venda. É uma resposta ao nível do "fumei, mas não inalei" oferecida por Bill Clinton quando confrontado com o consumo de canábis. Pura hipocrisia.


A recusa do capitalismo está na carta de princípios do Bloco. Há cerca de dois anos, numa conferência do Partido Socialista, Mariana Mortágua gerou polémica com uma frase esclarecedora: "A primeira coisa que acho que temos de fazer é perder a vergonha de ir buscar dinheiro a quem está a acumular riqueza."


A presidente do Bloco até pode ter razão quando diz que a notícia do Jornal Económico teve como intuito procurar travar as alterações legislativas que pretendem restringir a capacidade de os senhorios venderem prédios ou empreendimentos inteiros, ao dar ao inquilino 90 dias para exercer o direito de preferência. Regras que, garante, "serão um obstáculo a grandes negócios que estão a ser preparados". Catarina Martins é contra os negócios imobiliários, menos os de Robles?


Acontece que foram os negócios que permitiram a reabilitação da cidade, deram emprego a quem a fez e, no caso do alojamento local, a muitos outros que directa e indirectamente dele vivem.


Mas para o Bloco não existe investimento imobiliário, só especulação e acumulação de riqueza. Robles não conseguiu viver por essa cartilha. O país muito menos conseguiria.

Fonte:jornaldenegocios

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