Uma juíza de Nova Iorque decretou a reversão parcial da ordem do presidente norte-americano de suspender a autorização da entrada de refugiados e muçulmanos de sete países.
A decisão judicial, conhecida horas depois da ordem executiva emitida por Donald Trump e que provocou protestos e o caos em aeroportos de todo o mundo, conseguiu impedir a deportação de estrangeiros que aterraram nos aeroportos norte-americanos.
A nova administração da Casa Branca tinha ordem para suspender por 120 dias a entrada de refugiados em solo dos EUA. Mas não só: Trump definiu que qualquer cidadão da Síria, Irão, Líbia, Somália, Sudão e Iémen, não podia entrar no país nos próximos 90 dias. Mesmo os que eram portadores de visto de residência permanente, os chamados "green cards", e que se tinham deslocado aos seus países para funerais, férias ou outro motivo normal.
Ontem, a imprensa norte-americana, encheu-se de histórias de cidadãos daqueles países de maioria muçulmana - cientistas, estudantes e pessoas sem qualquer historial de ameaça à segurança dos EUA - , mas com dupla cidadania ou com autorização de residência, que foram surpreendidos nos aeroportos dos seu países com a ordem executiva, que os impedia de embarcar de volta para os EUA. Outros ficaram detidos à chegada aos aeroportos norte-americanos e que aguardavam deportação.
O "The Guardian" referiu ainda que o decreto judicial se aplica apenas aos que já estavam em território americano ou a caminho, ou seja, que estavam já a voar para a América ou já num aeroporto americano quando os efeitos da ordem de Trump começaram a produzir-se. Para já, as deportações foram impedidas, mas não é claro o que acontecerá aos que aguardam, nos aeroportos de todo o Mundo, autorização para voltar aos EUA.
A decisão judicial apenas travou a deportação, mas não dá autorização de entrada imediato nos EUA aos que ficaram retidos em centros de detenção.
O Departamento de Estado responsável pela implementação da medida, já declarou que iria no entanto continuar a aplicar a ordem de Trump, ainda que vai cumprir a decisão judicial. "A diretiva [da Casa Branca] é um primeiro passo no sentido de reestabelecer o controlo sobre as nossas fronteiras e segurança nacional", informou o governo.
O "The New York Times" diz também que as autoridades norte-americanas acabaram por conceder autorizações de entrada a 81 pessoas. Não é claro ainda o número total de cidadãos que estão, nos aeroportos norte-americanos, detidas.
Vitória para os defensores dos imigrantes
O bloqueio das deportações foi, ainda assim, uma vitória para os defensores dos imigrantes, que elogiaram a decisão da juíza Ann M. Donnelly, do Tribunal do Distrito Federal de Brooklyn (Nova Iorque).
A decisão de Donnelly de fazer uma suspensão temporária da ordem aconteceu depois de dezenas de passageiros -- entre 100 e 200, de acordo com o New York Times -- terem sido detidos ao chegarem aos aeroportos nos EUA e ameaçados de expulsão.
A decisão vai no sentido de as autoridades norte-americanas não procederem a nenhuma deportação de cidadãos dos sete países de maioria muçulmana visados pelo decreto de Trump.
Várias associações, incluindo a União das Liberdades Civis na América (ACLU), tinham desafiado na justiça na manhã de sábado a nova medida de Donald Trump sobre "a proteção da nação contra a entrada de terroristas estrangeiros nos Estados Unidos".
As associações consideram a medida discriminatória e anticonstitucional uma vez que se aplica aos cidadãos com os documentos em dia. Elas invocam a quinta emenda, alegando que as questões relacionadas com os documentos não podem ser decididas arbitrariamente pelo governo e necessitam de uma decisão da justiça.
A decisão da juíza Donnelly, que não se pronunciou sobre a constitucionalidade da medida, não resolveu, todavia, toda a questão, reconheceu o advogado da ACLU Lee Gelernt, ao invocar uma nova audição para fevereiro.
"O importante esta noite era que ninguém fosse colocado (de volta) num avião", disse Gelernt à saída do tribunal.
Igualmente indicou que a juíza tinha ordenado ao governo comunicar a lista de todas as pessoas detidas nos aeroportos norte-americanos desde sexta-feira. Isso deverá permitir às associações poderem mobilizar-se por todos os visados, precisou.
Outro juiz federal da Virgínia anunciou uma decisão semelhante, desta vez visando os passageiros detidos no aeroporto de Dulles, perto de Washington, segundo o diário The Charlotte Observer.
A mobilização de associações começou após a detenção de dois iraquianos na noite de sábado no aeroporto JFK em Nova Iorque, que estavam ligados ao governo norte-americano no Iraque e possuem vistos de viagem válidos.
No sábado de manhã, assim que a queixa foi interposta na justiça, e depois que Donald Trump afirmou que a aplicação do decreto "estava a correr muito bem", várias associações convocaram manifestações nos aeroportos do país.
Milhares de pessoas responderam à convocatória, enquanto outros saudavam as detenções nas redes sociais, ilustrando a divisão do país.
No JFK, dois representantes democratas de Nova Iorque no Congresso, Jerry Nadler e Nydia Velasquez, juntaram-se aos manifestantes e negociaram, ao longo de todo o dia, com a polícia do aeroporto.
Estes conseguiram a libertação de um dos iraquianos que trabalhava para empresas dos EUA e para o consulado norte-americano de Erbil, no curdistão iraquiano, Hameed Khalid Darweesh, que saiu do aeroporto sob o apoio dos manifestantes que gritavam palavras de ordem como "Bem-vindo" ou "Os muçulmanos são bem-vindos".
Estas mobilizações e primeira decisão na justiça deixam antever um longo braço de ferro entre os defensores dos imigrantes e a administração de Trump.
"Esta é a primeira etapa numa longa batalha nos tribunais", disse Michael Kagan, especialista em lei de imigração na Universidade de Nevada.
"Estamos a preparar-nos para uma guerra de trincheiras jurídica desde a eleição", acrescentou.
Para este jurista, o rumo desta batalha perante os tribunais é incerto uma vez que "não tem precedentes na história recente norte-americana".
Tudo depende da atitude dos juízes, podendo seguir até ao Tribunal Supremo, que não se pronuncia sobre questões de imigração deste tipo desde a lei sobre a exclusão dos chineses (Chinese Exclusion Act) adotada em 1882, incluindo daqueles que residiam legalmente nos Estados Unidos e tiveram de retornar temporariamente ao seu país de origem.
Fonte: MCC com Lusa
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