sábado, 11 de fevereiro de 2017

Cartazes anti-Papa Francisco refletem contestação crescente


Funcionário da Câmara de Roma cobre cartaz crítico do Papa. Iniciativa clandestina que retomou uma prática anterior à unificação de Itália
Cartazes anónimos em Roma mostram que há setores da Igreja insatisfeitos com o Papa argentino mas vaticanistas recordam que antecessores também foram alvo de críticas.

Ignorar pedidos de esclarecimento de cardeais. Decapitar ordens religiosas. Afastar sacerdotes. Controlar congregações. A enumeração de casos referem-se a decisões do Papa Francisco que encontraram resistência, foram contestadas ou criticadas por alguns setores da Igreja, sendo expressão pública dessa contestação os cartazes surgidos há uma semana no centro de Roma, que terminavam com uma interpelação direta a Jorge Maria Bergoglio: "Mas onde está a tua misericórdia?".

Em causa está, principalmente, o silêncio do Papa a um pedido de esclarecimento feito, em setembro de 2016, por quatro cardeais sobre alguns aspetos da exortação apostólica encíclica A Alegria do Amor; a reforma profunda da Ordem de Malta e afastamento do grão-mestre; a intervenção, através da nomeação de um comissário apostólico, nos Franciscanos da Imaculada, considerados tradicionalistas.

Anónimos, os cartazes foram escritos no dialeto local chamado romanaccio, em que Francisco surge com ar hirsuto, e retomaram uma tradição de Roma, quando o papa era também o responsável pelo governo temporal da cidade, antes da unificação de Itália em 1870. Era então comum serem colocados panfletos numa estátua semi-destruída do século III antes de Cristo, conhecida pelo nome de Pasquino, com críticas ao papa e outras figuras.

Colocados na noite de sexta para sábado da passada semana, os cartazes foram tapados em menos de 24 horas mas a rapidez da remoção não esconde o facto de ser crescente a contestação a Francisco. E que a sua decisão em mudar certos aspetos do funcionamento da Igreja e as críticas que dirige a alguns setores não irá apaziguar. Vejam-se as palavras que proferiu numa reunião com dirigentes de ordens religiosas e congregações em novembro passado, e esta semana reveladas pelo Corriere della Sera. Segundo o diário italiano, o Papa terá dito que nas estruturas da Igreja encontra-se "uma atmosfera mundana e principesca" e que "não há necessidade de ser cardeal para se converter num príncipe. Basta ser religioso". Francisco considerou este o "pior na organização da igreja" em paralelo com a corrupção no Vaticano. E que não será de pouca monta: "Há corrupção no Vaticano. Mas estou em paz. Se há um problema, escrevo um bilhete a São José e coloco-o sob (...) uma estátua de São José adormecido. E agora dorme sobre um colchão de bilhetes"!

Para o vaticanista Andrea Tornielli, "a oposição vem sobretudo dos conservadores, mas há também algum mal-estar entre os progressistas porque o Papa não concorda com as suas ideias". Coordenador do blogue Vatican Insider, jornalista do La Stampa e autor de vasta bibliografia, em que se conta o recente O Nome de Deus é Misericórdia, uma conversa com Francisco, Tornielli pensa que esta contestação não é "um movimento de base, ainda que tenha grande projeção na Internet e redes sociais". A oposição é, "sobretudo um movimento circunscrito e autorreferencial, quer na base quer no topo", com origem em setores "conservadores e alguns tradicionalistas, que se fazem "papistas" em corrente alternada, ou seja, são "papistas" e convidam à obediência ao Papa só quando este está de acordo com eles", diz Tornielli.

Um outro vaticanista, Giuseppe Rusconi, nota que as críticas a Francisco têm vindo a "tornar-se mais frequentes e mais incisivas, em particular da parte dos "conservadores": cardeais, bispos, sacerdotes, e também muitos fiéis laicos, que se sentem alvos permanentes pela sua "excessiva" ligação às normas e ensinamentos da doutrina católica tradicional. As críticas surgem quer do "topo" (prelados, intelectuais, mundo da informação católica não "alinhada") quer da "base", ainda que a maior parte dos fiéis esteja ainda com o Papa".

Vaticanista desde os anos 90 e autor do blogue Rossoporpora, Rusconi refere a existência na personalidade de Francisco "um traço autoritário, que se manifestou já quando era provincial dos Jesuítas na Argentina", que, contudo, não considera "particularmente grave", mas é uma "tendência que devia atenuar". Ora, "está a suceder o contrário. Nos últimos meses, esta característica surgiu de forma cada vez mais frequente, com o crescer das críticas ao seu modo de atuar".

Idêntica opinião é sustentada por Marco Tosatti para quem o modo como Francisco "afasta as pessoas dos cargos no Vaticano é insólita e está a causar medo (...). Em mais de 35 anos em que cobri o Vaticano nunca vi nada assim". Vaticanista desde a década de 80, autor do blogue Stilum Curiae e de vasta bibliografia, entre a qual uma obra sobre o segredo de Fátima, além de jornalista do La Stampa, Tosatti afirma que Francisco governa "de uma forma muito pessoal, alguns diriam autocrática, muito distinta dos papas do século XX, que usaram a Cúria de forma apropriada para governar. Contorna os procedimentos normais, o que cria mau ambiente nas pessoas" no Vaticano.

Há um ponto que faz a unanimidade entre os vaticanistas ouvidos pelo DN, é o de que todos os papas - considerando o período pós-Vaticano II - foram contestados e criticados. Rusconi recorda que "João XXIII foi criticado por conservadores pelos seus gestos de abertura para o Leste comunista. Paulo VI foi criticado por grupos pela sua Ostpolitik e pelas decisões do Concílio e sua aplicação até nos aspetos litúrgicos. Por isso, o cisma de monsenhor Lefèbvre. Mas também por progressistas, por exemplo quando publicou a encíclica Humanae Vitae". Tornielli, sublinhando os aspetos anteriores, destaca que "João Paulo II foi criticado por progressistas e conservadores por questões teológicas e de governo da Igreja (a posição sobre a Teologia da Libertação, os encontros de Assis, certas nomeações de bispos). Bento XVI foi criticado também por ambos os setores nas mesmas áreas, o motu proprio a permitir a missa préconciliar, a revogação da excomunhão dos lefèbvrianos, nomeação de bispos, os encontros de Assis, alguns discursos sobre o ecumenismo, a posição sobre os preservativos". Já Tosatti prefere centrar-se no atual Papa, que diz ter como "alvo" o que Francisco designa como "pessoas rígidas, e aqui ele está a referir-se àqueles que seguem a Tradição da Igreja".

Fonte: DN
Sábado11 de fevereiro de 201719:38 Fundado em 29 de dezembro de 186


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