Melkulangara Bhadrakumar
A chamada "proibição muçulmana" do presidente Donald Trump – a decisão de restringir temporariamente durante um período de 90 dias a chegada de visitantes de sete países muçulmanos seleccionados e impor "verificações extremas" a solicitadores de visto de outros três países – criou turbulência na política americana e na opinião pública regional, o que poderia ter impacto na políticas da nova administração no Médio Oriente.
Bastante obviamente, foi o "trata-se de Trump, estúpido" – ao invés da "proibição muçulmana" como tal – que provocou na própria América a avalanche de crítica e condenação à ordem executiva presidencial. Os pormenores [do documento] mostram que a ordem executiva da Casa Branca simplesmente adoptou um precedente extraído do caderno de anotações do presidente Barack Obama. A administração Trump simplesmente seguiu as pegadas de Obama em relação ao apontar selectivo dos sete países muçulmanos. Como destacou um comentador: "Sim, estas políticas são más, muito más. Trump é mau. Mas também o era Obama assim como Clinton. Protestar contra políticas de um quando não se protestou quando o outro implementou as mesmas políticas é um exibicionismo falso".
Bill e Obama saíram impunes porque eram "liberais". Na verdade, não importa o que Trump faça – seja a proibição muçulmana ou a decisão de tornar seu estratega chefe Steve Bannon convidado permanente das reuniões do Conselho de Segurança Nacional – ele está destinado a ser escarnecido. Como pode a América arvorar sua bandeira com credibilidade no Médio Oriente e merecer respeito e audiência quando apresenta uma voz tão dissonante e internamente exibe tamanha desonestidade?
Sem dúvida, uma outra onda de "anti-americanismo" está a varrer o mundo islâmico, o que complicará mesmo os planos mais bem concebidos de Trump para Médio Oriente muçulmano. Ponde de parte a hostilidade da Rua Árabe, há também o dilema espinhoso que confronta os regimes do Médio Oriente que são aliados dos EUA, especialmente a Arábia Saudita, a qual utiliza descaradamente seu poder religioso para projectar seu papel na política regional. Naturalmente, algum caminho a contornar pode ser encontrado – na verdade, acabará por ser encontrado, se a história serve de orientação – mas leva tempo enfrentar a fúria pública.
Enquanto isso, o relógio já começou a marcar os 30 dias de prazo concedidos por Trump no sábado passado para os militares estado-unidenses conceberem uma "estratégia abrangente e planos para a derrota" do Estado Islâmico. Estão envolvidas questões práticas. A nova estratégia significa mais forças e equipamento militar americano a entrar no Iraque e na Síria – e mesmo assim o parlamento iraquiano acaba de votar uma proibição de viagem recíproca a cidadãos estado-unidenses.
A nota sobre política externa colocada no sítio web da Casa Branca em 20 de Janeiro, a poucas horas da posse de Trump, diz: "Derrotar o ISIS e outros grupos terroristas islâmicos radicais será a nossa mais alta prioridade. Para derrotar e destruir estes grupos, prosseguiremos operações militares conjuntas quando necessário". Agora, reunindo uma "coligação de vontades" está a ser difícil nas actuais circunstâncias. Ainda mais importante, os principais aliados europeus dos EUA relutam em consorciar-se com a administração Trump. Naturalmente, seus cidadãos não são directamente afectados pela "proibição muçulmana". Mas até onde desejariam eles associar-se às "agressivas operações militares conjuntas" no Médio Oriente?
Mais uma vez, os dilemas políticos da administração Trump sobre a própria ideia de estabelecer "zonas seguras" na Síria e no Iémen podem tornar-se mais agudos. Trata-se em primeiro lugar de uma ideia muitíssimo controversa, exigindo uma escala de consenso regional que é simplesmente difícil de alcançar, dado os interesses em conflito envolvidos e possivelmente escoras de forte presença militares estado-unidense durante um longo tempo para chegar a impor as "zonas seguras". Na verdade, a presente localização das mesmas zonas seguras enfrentará ventos tempestuosos. O governo sírio adoptou a posição de qualquer tentativa de instalar zonas seguras sem o seu consentimento constituiria uma "violação da soberania da Síria".
Claramente, a evolução do compromisso EUA-Irão no período que vem aí, um modelo altamente consequente de segurança regional no Médio Oriente, também está para ser vista. Provavelmente uma opção militar contra o Irão nunca foi inteiramente viável ou realista para Washington desde o princípio, mas manifestamente assim é hoje em dia.
Na verdade, Teerão condenou a proibição muçulmana de Trump. Mas a declaração do Ministério do Exterior é num tom moderado e chamando a atenção para o "insulto claro ao mundo islâmico" e para o perigo de que Trump possa estar inadvertidamente a conceder "uma grande prenda aos extremistas e seus apoiantes", proporcionando terreno fértil para recrutamento por grupos terroristas. A ênfase está na legalidade da decisão dos EUA e a declaração diferencia "o rancor e inimizade de alguns no governo estado-unidense e círculos influentes tanto dentro dos Estados Unidos como no exterior".
Enquanto isso, o presidente Hassan Rouhani fez uma observação significativa segunda-feira passada ao destacar a importância do empenhamento construtivo com a comunidade internacional "para o benefício do nosso povo e dos interesses nacionais", traçando uma distinção clara entre soberania e isolamento. Basta dizer isso quando os ânimos estão exaltados no mundo muçulmano, a indicar que o Irão (ou na Arábia Saudita, a propósito) estará inclinado a ver como transitório o actual ambiente agitado. Considerações pragmáticas prevalecerão.
Talvez a parte boa em tudo isto seja que intervenções militares unilaterais dos EUA nos países muçulmanos podem estar a tornar-se cada vez mais difíceis – ou seja, mesmo se Trump viesse a abandonar a sua doutrina do "America First" de política externa e actuasse mais como Hillary Clinton teria feito. Certamente o teste ácido é a Síria onde para a administração Trump, a parceria com a Rússia aumenta a dependência das capacidades militares russas no combate ao Estado Islâmico, enquanto os EUA podem ter de anuir à participação de forças do governo sírio e também de viver com a realidade no terreno de que a milícia apoiada pelo Irão e o Hezbollah estão a dar uma contribuição decisiva no combate real sobre o terreno contra grupos terroristas.
O principal desafio de Trump está em resistir à oposição visceral que enfrenta dentro da própria América com uma metade a rejeitar sem rodeios sua legitimidade para liderar a nação. É o paradoxo final que nesta luta extraordinária, a assim chamada esquerda liberal progressista na América esteja a centrar-se na oposição a Trump ao invés de se opor às guerras que criaram o problema dos refugiados.
Bastante obviamente, foi o "trata-se de Trump, estúpido" – ao invés da "proibição muçulmana" como tal – que provocou na própria América a avalanche de crítica e condenação à ordem executiva presidencial. Os pormenores [do documento] mostram que a ordem executiva da Casa Branca simplesmente adoptou um precedente extraído do caderno de anotações do presidente Barack Obama. A administração Trump simplesmente seguiu as pegadas de Obama em relação ao apontar selectivo dos sete países muçulmanos. Como destacou um comentador: "Sim, estas políticas são más, muito más. Trump é mau. Mas também o era Obama assim como Clinton. Protestar contra políticas de um quando não se protestou quando o outro implementou as mesmas políticas é um exibicionismo falso".
Bill e Obama saíram impunes porque eram "liberais". Na verdade, não importa o que Trump faça – seja a proibição muçulmana ou a decisão de tornar seu estratega chefe Steve Bannon convidado permanente das reuniões do Conselho de Segurança Nacional – ele está destinado a ser escarnecido. Como pode a América arvorar sua bandeira com credibilidade no Médio Oriente e merecer respeito e audiência quando apresenta uma voz tão dissonante e internamente exibe tamanha desonestidade?
Sem dúvida, uma outra onda de "anti-americanismo" está a varrer o mundo islâmico, o que complicará mesmo os planos mais bem concebidos de Trump para Médio Oriente muçulmano. Ponde de parte a hostilidade da Rua Árabe, há também o dilema espinhoso que confronta os regimes do Médio Oriente que são aliados dos EUA, especialmente a Arábia Saudita, a qual utiliza descaradamente seu poder religioso para projectar seu papel na política regional. Naturalmente, algum caminho a contornar pode ser encontrado – na verdade, acabará por ser encontrado, se a história serve de orientação – mas leva tempo enfrentar a fúria pública.
Enquanto isso, o relógio já começou a marcar os 30 dias de prazo concedidos por Trump no sábado passado para os militares estado-unidenses conceberem uma "estratégia abrangente e planos para a derrota" do Estado Islâmico. Estão envolvidas questões práticas. A nova estratégia significa mais forças e equipamento militar americano a entrar no Iraque e na Síria – e mesmo assim o parlamento iraquiano acaba de votar uma proibição de viagem recíproca a cidadãos estado-unidenses.
A nota sobre política externa colocada no sítio web da Casa Branca em 20 de Janeiro, a poucas horas da posse de Trump, diz: "Derrotar o ISIS e outros grupos terroristas islâmicos radicais será a nossa mais alta prioridade. Para derrotar e destruir estes grupos, prosseguiremos operações militares conjuntas quando necessário". Agora, reunindo uma "coligação de vontades" está a ser difícil nas actuais circunstâncias. Ainda mais importante, os principais aliados europeus dos EUA relutam em consorciar-se com a administração Trump. Naturalmente, seus cidadãos não são directamente afectados pela "proibição muçulmana". Mas até onde desejariam eles associar-se às "agressivas operações militares conjuntas" no Médio Oriente?
Mais uma vez, os dilemas políticos da administração Trump sobre a própria ideia de estabelecer "zonas seguras" na Síria e no Iémen podem tornar-se mais agudos. Trata-se em primeiro lugar de uma ideia muitíssimo controversa, exigindo uma escala de consenso regional que é simplesmente difícil de alcançar, dado os interesses em conflito envolvidos e possivelmente escoras de forte presença militares estado-unidense durante um longo tempo para chegar a impor as "zonas seguras". Na verdade, a presente localização das mesmas zonas seguras enfrentará ventos tempestuosos. O governo sírio adoptou a posição de qualquer tentativa de instalar zonas seguras sem o seu consentimento constituiria uma "violação da soberania da Síria".
Claramente, a evolução do compromisso EUA-Irão no período que vem aí, um modelo altamente consequente de segurança regional no Médio Oriente, também está para ser vista. Provavelmente uma opção militar contra o Irão nunca foi inteiramente viável ou realista para Washington desde o princípio, mas manifestamente assim é hoje em dia.
Na verdade, Teerão condenou a proibição muçulmana de Trump. Mas a declaração do Ministério do Exterior é num tom moderado e chamando a atenção para o "insulto claro ao mundo islâmico" e para o perigo de que Trump possa estar inadvertidamente a conceder "uma grande prenda aos extremistas e seus apoiantes", proporcionando terreno fértil para recrutamento por grupos terroristas. A ênfase está na legalidade da decisão dos EUA e a declaração diferencia "o rancor e inimizade de alguns no governo estado-unidense e círculos influentes tanto dentro dos Estados Unidos como no exterior".
Enquanto isso, o presidente Hassan Rouhani fez uma observação significativa segunda-feira passada ao destacar a importância do empenhamento construtivo com a comunidade internacional "para o benefício do nosso povo e dos interesses nacionais", traçando uma distinção clara entre soberania e isolamento. Basta dizer isso quando os ânimos estão exaltados no mundo muçulmano, a indicar que o Irão (ou na Arábia Saudita, a propósito) estará inclinado a ver como transitório o actual ambiente agitado. Considerações pragmáticas prevalecerão.
Talvez a parte boa em tudo isto seja que intervenções militares unilaterais dos EUA nos países muçulmanos podem estar a tornar-se cada vez mais difíceis – ou seja, mesmo se Trump viesse a abandonar a sua doutrina do "America First" de política externa e actuasse mais como Hillary Clinton teria feito. Certamente o teste ácido é a Síria onde para a administração Trump, a parceria com a Rússia aumenta a dependência das capacidades militares russas no combate ao Estado Islâmico, enquanto os EUA podem ter de anuir à participação de forças do governo sírio e também de viver com a realidade no terreno de que a milícia apoiada pelo Irão e o Hezbollah estão a dar uma contribuição decisiva no combate real sobre o terreno contra grupos terroristas.
O principal desafio de Trump está em resistir à oposição visceral que enfrenta dentro da própria América com uma metade a rejeitar sem rodeios sua legitimidade para liderar a nação. É o paradoxo final que nesta luta extraordinária, a assim chamada esquerda liberal progressista na América esteja a centrar-se na oposição a Trump ao invés de se opor às guerras que criaram o problema dos refugiados.
01/Fevereiro/2017
Ver também: Is Soros The Source Of Funds Behind The "Muslim Ban" Lawsuits? (Será Soros o financiador dos processos contra a "proibição muçulmana"?)
O original encontra-se em www.strategic-culture.org/...
Este artigo encontra-se em http://resistir.info/
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