PROJETAR A FELICIDADE
Paul Dolan
Pergaminho
348 páginas
17,70 euros
Vivemos num tempo de ditadura de felicidade. Temos a obrigação de nos sentirmos felizes, de tudo fazer para alcançar a felicidade para nós próprios e para os que estão sob nossa dependência. E tudo promete felicidade: o carro novo, o perfume, o telemóvel, o brinquedo, as férias. Antes, a felicidade era quase uma utopia. Só se poderia esperar depois deste “vale de lágrimas”. Mas a sociedade moderna secularizou a felicidade. Industrializou-a e distribui-a às massas. A ter em conta a publicidade – e um cidadão, em média, consome centenas de anúncios por dias – a felicidade está ao alcance de todos. Na televisão, em média vemos 100 anúncios por dia. O que dá 2 000 000 (dois milhões) ao fim de 60 anos. Nenhum anúncio promete infelicidade. Gastando, consumindo, desfutando, a felicidade acabará por chegar. É um engano a que estamos sempre a dar novas oportunidades.
Este livro de Paul Dolan, professor da London School of Economics, é considerado inovador na abordagem da felicidade e do modo de como a conquistar, pondo de lado as abordagens que relacionam felicidade com satisfação. Por uma ou outra vez, quando fala de voluntariado ou da dedicação à família, por exemplo, aproxima-se da visão cristã de felicidade, que afirma claramente que não há felicidade verdadeira sem entrega aos outros… e sem cruz. Mas o seu posicionamento continua a ser o de uma espécie de “engenharia da felicidade”. A felicidade é o resultado de uma produção eficiente, de uma gestão criteriosa de recursos. Só não é feliz quem não quer. Só não é feliz quem não sabe como ser feliz. E ser feliz é uma questão de técnica. Afirma o autor: “A sua felicidade é determinada pela forma como dirige a sua atenção. Aquilo a que presta atenção conduz o seu comportamento e determina a sua felicidade. A atenção é a cola que dá consistência à sua vida. (…) Os seus recursos de atenção são por vezes dirigidos para atividades em que está envolvido, mas outras vezes estará a pensar em todo o tipo de coisas, como o que comer ao jantar, ou até simplesmente a sonhar acordado. (…) A escassez de recursos de atenção implica que deve ponderar como tomar melhores decisões sobre aquilo a que deve prestar atenção e de que modo o deve fazer”. Mas quando se trata de saber “aquilo a que devemos prestar atenção”, ficamos nos típicos assuntos da “satisfação”: mais dinheiro, novas experiências, mais tempo com os filhos, novo(a) parceiro(a)…
O livro é muito útil em certos momentos. Tem boas dicas para os procrastinadores (os que estão sempre a adiar) e para os muito hesitantes. A felicidade tem certamente a ver com o agir. É um caminho, um projeto, não uma paragem.
Quando parece que chegamos ao ponto em que se toca na proposta cristã, a ideia é descartada como sendo resultado da evolução, como se os mais generosos fossem, no fundo, no fundo, os mais egoístas (argumento usado pelos mesquinhos: “ele só é generoso porque se sente bem ao sê-lo”): “Não tenho grande desejo de aprofundar as motivações subjacentes que geralmente levam as pessoas a cuidarem umas das outras, uma vez que isto se faz em todo o lado até à morte. Será aqui suficiente dizer que geralmente joga a favor da nossa vantagem evolutiva ajudar outras pessoas a favor na presunção de que, se os papéis fossem invertidos, elas também nos ajudariam” (pág. 285). Ora precisamente este assunto – o estudo por um economista e não por alguém religioso sobre como a dádiva, o amor, a solidariedade fazem a felicidade – é que seria revelador.
Fonte: Site do Correio do Vouga
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