Desta vez, as sondagens estavam certas: Macron e Marine Le Pen seguem para a segunda volta. Mélenchon não ganhou nada, mas foi outro dos vencedores da noite.
Sem surpresas, Emmanuel Macron e Marine Le Pen foram os dois candidatos a passarem à segunda volta das presidenciais francesas, que decorrerão no próximo dia 7 de maio e é de crer que o candidato independente se prepara para substituir o socialista François Hollande no Palácio do Eliseu. Desta vez, as sondagens parecem ter sido ‘seguidas à risca’, e a continuarem assim, Macron deverá ganhar a Le Pen, pondo um fim – para já – às ambições presidencialistas da líder da extrema-direita francesa.
Seja como for, Marine Le Pen tem todos os motivos para celebrar: conseguiu a passagem à segunda volta (com mais de 21% dos votos, contra os 18% obtidos em 2012, e que não lhe deram ‘bilhete’ para a disputa final com Hollande), tendo para isso batido o candidato de Os Republicanos, François Fillon, algo que há cinco anos era impensável. Neste quadro, e mesmo que Marine Le Pen perca a segunda volta daqui por quinze dias, a posição da Frente Nacional é agora impossível de não ser levada em consideração: a extrema-direita está, em França, a seguir um caminho de consolidação que, segundo alguns observadores, perspectiva uma vitória presidencial num futuro não muito longínquo. Principalmente, dizem os analistas, se se mantiver no território gaulês o clima de medo face à imigração islâmica e a ocorrência de actividade terrorista patrocinada pelos grupos radicais islâmicos.
A grande dúvida para a segunda volta é agora o tamanho do ‘gap’ entre Le Pen e Macron: muitos franceses optaram por não votar na primeira volta e votar contra Le Pen na segunda, mas é para já difícil perceber-se o que é que isso dará em termos de resultados a 7 de maio.
Seja como for, Le Pen acabou por não beneficiar do ‘efeito atentado’ que poderia tê-la ajudado, depois do ataque a polícias poucos dias antes das eleições: os analistas acreditavam que o atentado poderia ‘empurrar’ a líder da extrema-direita para o primeiro lugar das eleições de hoje, mas isso acabou por não acontecer.
Macron – que lançou uma campanha considerada ‘traidora’ pela família socialista a que antes pertencia – é outro dos vencedores da noite, contribuindo para aumentar as evidências (claras em vários países europeus) de que o eleitorado está cansado dos partidos tradicionais. Em França, essa evidência não podia ser mais óbvia: os dois partidos que disputaram a segunda volta das eleições de 2012 ficaram ambos fora da corrida final de 7 de maio próximo.
Tanto François Fillon como Benoît Hamon, candidato do PS francês, saíram claramente derrotados, sendo que o partido de Hollande se prepara agora para a sua própria ‘travessia do deserto’, que com certeza não será isenta de profundas alterações, nomeadamente no que tem a ver com a equipa de liderança. A derrota histórica dos socialistas indicia que o partido precisa de uma renovação profunda da sua hierarquia e de uma discussão séria sobre para onde quer ir, nomeadamente no que tem a ver com a continuação da deriva social-democrata ou o regresso à cartilha socialista.
Quem, apesar de não ter vencido nada, é claramente um dos vencedores da noite é Jean-Luc Mélenchon, candidato da esquerda radical que conseguiu disputar ‘taco a taco’ a terceira posição da primeira volta das presidenciais. Os 11% que Mélenchon averbara há cinco anos não faziam supor que a sua prestação pudesse, cinco anos volvidos, ser tão eficaz. Não sendo por certo um político da nova guarda da esquerda como são o espanhol Pablo Iglesias (Podemos) ou o grego Alexis Tsipras (Syriza), Mélenchon acabou por juntar em seu redor não apenas a esquerda radical, mas também, possivelmente, muitos dos socialistas descontentes com o rumo que o PS francês trilhou nos últimos anos.
De algum modo, as eleições francesas acabaram por espelhar a radicalização do eleitorado: tanto a extrema-direita como a esquerda radical têm bastas razões para saírem satisfeitas da noite de hoje, e mesmo que nenhuma delas acabe sentada no Palácio do Eliseu, o certo é que as suas hostes estão em claro crescimento.
Quem por certo está mais descansado esta noite é Jean-Claude Juncker, o luxemburguês que lidera a Comissão Europeia: a previsível derrota de Marine Le Pen na segunda volta das presidenciais e a igualmente previsível vitória de um europeista, afasta – pelo menos para já – o fantasma da saída da França do conjunto da União Europeia. Mas não afasta os motivos que levam um número cada vez maior de europeus a colocar fortes reservas à União – ou mesmo a pretender sair dela – o que é o mesmo que dizer que Juncker tem todos os motivos para continuar a não dormir.
Fonte: Jornal Económico
Foto: REUTERS/Benoit Tessie
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