A avassaladora demolição atual das instituições e dos usos e costumes vigentes até há pouco escancaram para o leitor uma crise sem precedentes, ampla e universal, que atinge todos os setores da vida social. Ainda que para efeito didático destas linhas, ouso dar-lhe um nome: apostasia. Por sua natureza, tal crise se reduz a um sistema doutrinário que procura conduzir o desregramento das paixões ao seu mais alto grau.
Basta considerarmos a tão propalada Ideologia de Gênero, inserida na Revolução Cultural, que surge para demolir nos seus aspectos mais transcendentes o próprio ser, ao negar que nascemos homem e mulher para propagação da espécie. Essa nova ideologia parece ter saído dos antros infernais, pois traz em seu bojo um verdadeiro ódio a Deus, o sumo bem, Autor da diversidade das criaturas e de sua hierarquização.
Ao criar, Deus manifestou sua suma bondade e sabedoria, pois quis comunicar suas perfeições às criaturas para que estas O refletissem, tornando-O assim mais conhecido e contemplado por elas enquanto Criador de todas as coisas, visíveis e invisíveis, como nós rezamos no Credo. Neste movimento de conhecer e amar nós teríamos todas as predisposições para bem servi-Lo.
Historicamente isso aconteceu. Como nos ensinou o Prof. Plinio Corrêa de Oliveira, “a Cristandade medieval não foi uma ordem qualquer, possível como seriam possíveis muitas outras ordens. Foi a realização, nas circunstâncias inerentes aos tempos e aos lugares, da única ordem verdadeira entre os homens, ou seja, a civilização cristã”. Com toda razão, Leão XIII pôde afirmar que naquele tempo a filosofia do Evangelho governava os Estados.
Para os incréus, basta contemplar tudo que a Cristandade foi capaz de fazer: as catedrais, os castelos, as universidades, os hospitais, enfim tudo aquilo que ainda atrai os viajantes à Europa. A vida terrena para o homem era uma espécie de antecâmara do Céu. E não foi por outro motivo que o demônio desencadeou uma Revolução a fim de destruir até os fundamentos a ordem por excelência que reinava naquela “doce primavera da fé”.
Odiar em princípio toda e qualquer desigualdade é colocar-se filosoficamente contra os elementos existentes entre criatura e Criador, e, portanto, representa um ódio metafísico contra o próprio Deus. Infelizmente, foi o que se passou com a decadência da Idade Média, com o advento de Lutero e sua Revolução Protestante, com a Revolução Francesa e com a Revolução Comunista, que parece agora, em seus estertores, caminhar para o seu trágico fim.
Fim trágico que se manifesta, por exemplo, através de ataques soezes aos símbolos de nossa Redenção e ao próprio Nosso Senhor Jesus Cristo e sua Mãe Santíssima, em peças blasfemas como “O Evangelho Segundo Jesus, Rainha do Céu“, exibido em unidades do Serviço Social do Comércio – SESC com o patrocínio de órgãos como Itaú Cultural e Instituto Tomie Ohtake, ou ainda em exposições, como a denominada “Queermuseu: Cartografias da diferença na arte brasileira” [foto], patrocinada pelo Banco Santander.
Tais iniciativas vão muito além de simples quedas a que a fragilidade humana está sujeita depois do pecado original, pois se revestem de um ódio que gera erros doutrinários, levando até mesmo à profissão consciente e explícita de princípios contrários à lei moral e à doutrina revelada, constituindo um pecado contra o Espírito Santo.
Todos nós assistimos a erosão da família na sociedade civil, e até mesmo da Igreja Católica, que deveria ser sua defensora natural e espiritual, mas que, em vez disso, abre espaço para adúlteros e homossexuais em reuniões e encontros católicos, administra o sacramento da Comunhão e da Confissão para pecadores sem o firme propósito de emenda de vida.
Outro acontecimento escandaloso recente foi a comemoração dos 500 anos da revolução protestante de Lutero, que pregou a supressão do celibato eclesiástico e a introdução do divórcio, além de ter sido responsável pela decadência moral que atingiu o seu paroxismo em nossos dias. Das tendências, dos estados de alma, dos imponderáveis protestantes surgiram outras revoluções, como a Revolução Francesa, a Revolução Comunista e a Revolução Estruturalista.
Creio ser do Pe. Leonel Franca a afirmação de que a sociedade moderna ataca tudo o que a sustenta e sustenta tudo o que a demole. O destaque dado em meios católicos aos festejos da revolução luterana percorreu todos os níveis da Hierarquia eclesiástica. Segundo informa o boletim da “Unisinos”, “Lutero no seu tempo julgado como herético e excomungado pelos papas, neste ano será comemorado pela filatelia vaticana com um selo [foto] que recorda os 500 anos da Reforma Protestante”…
Diante da tragédia de nossos dias, recordo aqui um ensinamento de Pio XII: “Embora os filhos do Século sejam mais hábeis que os filhos da luz, seus ardis e suas violências teriam, sem dúvida, menor êxito se um grande número, entre aqueles que se intitulam católicos, não se lhes estendessem mão amiga. Há os que parecem querer caminhar de acordo com os nossos inimigos, e se esforçam por estabelecer uma aliança entre a luz e as trevas, um acordo entre a justiça e a iniquidade. [...] Como se absolutamente não estivesse escrito que não se pode servir a dois senhores. São eles muito mais perigosos certamente mais funestos do que os inimigos declarados”.
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(*) Sacerdote da Igreja do Imaculado Coração de Maria – Cardoso Moreira (RJ).
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