sexta-feira, 29 de julho de 2022

Nós e Eles, os estrangeiros

 

São diferentes. Chamam a atenção pois têm outra cor de cabelo, de olhos, de pele, outra altura, postura e até por vezes outra maneira de estar. Falam outra língua que no primeiro instante constrói uma invisível barreira entre nós e eles. Por vezes tentam falar a nossa, mas como soa estranho a barreira não desaparece, e permanece firme pois não só a voz e a aparência a constroem. Eles comem noutros horários, irritam os donos dos restaurantes perguntando se podem almoçar na nossa hora de lanche, ao pequeno-almoço comem tomate e antes do almoço tomam café. Os estrangeiros porque deles falamos, têm um olhar caótico, curioso mas também um ar meio perdido.

Isso assusta ou desperta curiosidade? Com certeza um pouco dos dois. Ser diferente têm duas vertentes: assustadora e atraente. O ser humano desde sempre tem a tendência de temer o “outro”. É compreensível pois até nos primatas, o desconhecido significava perigo, que obrigava a manter uma postura desconfiada. Mas… os séculos passaram e o ser humano para além de manter o seu instinto de desconfiança percebeu que conhecer o “outro” é o primeiro passo para o seu próprio desenvolvimento. Dai surgiu o conceito que revolucionou a nossa era: a Interculturalidade.

O que significa a palavra Interculturalidade? São as culturas diferentes e grupos sociais, étnicos, religiosos que vivem no mesmo território e conduzem a vida em comum, entrando em relações abertas, regulares e constantes interações acompanhadas pela troca e mútuo respeito, compreensão dos estilos da vida, aceitação das normas e valores dos outros que deixam construir uma harmoniosa formação através das diferenças. A Diversidade é considerada como um fator importante no desenvolvimento social, político e económico.

A Realidade contemporânea é sem dúvida intercultural, pois tudo à nossa volta está a mudar à velocidade da luz. O mundo de hoje está a desenvolver-se a cada segundo que passa e anseia alcançar muito mais. As novas tecnologias permitem exceder as fronteiras em todos os sentidos desta palavra. As pessoas têm de saber viver no mundo intercultural. E onde deveríamos, nós pessoas, aprender a lidar com as regras desta realidade senão interagindo com o outro.

Se olharmos para a Gastronomia Portuguesa, o que seria da nossa cozinha se os navegadores não tivessem trazido especiarias dos vários cantos do mundo. O mesmo aconteceu nas artes, música, literatura, tecnologia, entre outras. O mundo tornou-se uma vila global, os intercâmbios universitários e empresariais promoveram a educação intercultural e as tecnologias facilitaram a comunicação entre as comunidades. Isso fez-nos perceber que na verdade “o outro” existe apenas na nossa subconsciência e quanto mais rápido o conseguirmos perceber, mais perto estaremos de nos perceber a nós também.

"O teu Deus é judeu, a tua música é negra, o teu carro é japonês, a tua pizza é italiana, o teu gás é argelino, o teu café é brasileiro, a tua democracia é grega, os teus números são árabes, as tuas letras são latinas. Eu sou teu vizinho. E ainda me chamas estrangeiro?" - Eduardo Galeano, O Caçador de Histórias.

Anna Kosmider Leal

(Antropóloga)

Enviado pela APImprensa

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