sábado, 2 de janeiro de 2016

MÍDIA & CIDADANIA | O jornalismo político regredi



Por Luis Fernando Manassi Mendez em 04/10/2011 na edição 662

Foi noticiado, semana passada, que professores e policiais entraram em confronto no Ceará, na Assembleia Legislativa. O motivo da repressão policial aconteceu porque os professores queriam acompanhar de perto a votação dos parlamentares sobre o piso salarial da categoria. Segundo o que foi noticiado no Jornal Nacional, não houve motivos aparentes para policiais agirem de tal forma.
Ideologicamente, a Assembleia é a casa do povo. Em um país democrático, então, o acesso a este lugar deveria ser irrestrito, principalmente em um momento decisivo para a categoria. Não seria, portanto, admitida tal conduta policial de forma agressiva. Partindo para o aspecto das condutas cívicas, acredito que a política brasileira virou motivo de algazarras e desgovernos. O que simboliza, hoje, metaforicamente a moral de nosso Congresso é Tiririca. De palhaço a homem público. Dos males, o menor, já que há letrados que há anos corrompem a vida pública brasileira. O agravante é que o povo votou nele para fazer um deboche de si mesmo. A moralidade e a ética, como é sabido, não precisam de instrução, mas sim, de consciência.
Entretanto, há despreparos em torno dos representantes do povo e por parte do eleitorado. Eleger alguém através de seu passado humilde, ou porque decide afrontar o alto comando com seus despreparos, numa tentativa de desestabilizar a política, tem sido o critério de muitos eleitores.

Atitude antidemocrática
O jornalismo político brasileiro vem negligenciando seu civismo acerca da conscientização política. Na grade televisiva, se torna complicado, ao telespectador, contemplar temas de relevância política. Só consigo lembrar um único programa que é aberto para o público em geral, que é o programa Canal Livre. Fora este programa, é complicado haver uma abordagem televisiva do jornalismo político em profundidade. Resumidamente, falar de política em caráter noticioso varia entre um release e uma simples reportagem. Periódicos impressos, de uma forma geral, apresentam textos “pesados”, que deveriam ser revistos num conceito de público amplo – visando às massas, e não restrito – situação atual do jornalismo político.
Se formos analisar a linguagem gramatical das reportagens e coberturas sobre política, veremos que, estilisticamente, a política é abordada através de um formato cansativo. Não vejo nenhuma outra editora jornalística que aborde reportagens de forma tão cansativa e confusa quanto a do jornalismo político. Geralmente, os leads abordam níveis noticiosos supondo que o leitor está, há tempos, familiarizado com o tema. Outras editorias têm uma visão que guia o sentido da notícia com mais clareza.
O caso de Ceará merece algumas considerações: o que separa os três poderes do povo? Influência? Na verdade, é o povo que dá a devida influência e barrar seu direito de acesso à Casa é uma atitude antidemocrática. Se não bastasse o desinteresse do brasileiro sobre política, quando um grupo de cidadãos tem seu direito de ir e vir infringido pelo próprio Estado, é sinal que as coisas andam de mal a pior.

Superficialismo jornalístico
Desinteresse, desrespeito, impunidade – palavras-chaves que norteiam o tema política e que poderiam ser evitados. A superficialidade do jornalismo tomou conta da área política há muito tempo. Se existe algum estudo antropológico e filosófico sobre este tema – não sei se existe –, não foi apresentado à população, o que seria fundamental para entendermos nossa formação cultural e política. Desde as denúncias do mensalão no governo Lula, a imprensa tem se mostrado acomodada. Restringiram-se nossos repórteres a cobrir tais episódios escandalosos e dar ponto final à discussão.
A política precisa ser documentada e o conceito jornalismo de fazer política precisa ser revisto. Não existem mais os tempos em que o brasileiro era actuante, um cidadão cívico e participativo, quando a ordem imperante era a rebeldia. Tudo isso passa pelo jornalismo. A imprensa deve, basicamente, ser cívica.
Líbero Badaró foi um jornalista idealista à parte. Venho, ao longo da semana, neste espaço, debatendo o conceito de jornalista no âmbito académico e prático. É fácil exercer jornalismo sem ser jornalista por formação superior. Entretanto, neste artigo, abro excepção. Líbero Badaró não obteve formação em Jornalismo, mas seus ideais compensam a resignação do superficialismo jornalístico em pleno século 21. Obviamente, o tempo em que Badaró viveu não existia a democracia tão sonhada que conquistamos actualmente e são em épocas difíceis que o colectivo supera medos em torno de actuações cívicas.

Valores cívicos estão invertidos
De Líbero Badaró a restrições editoriais actuais e de convulsões sociais em busca do bem comum ao acomodamento popular, muita coisa mudou. O jornalismo político não é mais o mesmo. Não prega mais actuação pública das pessoas. Preocupa-se, basicamente, em noticiar fatos. Neste aspecto, recorro a um dilema junto ao senso comum: deve o jornalismo político negligenciar os fatos e deixar que o Poder Judiciário julgue processos políticos em segredo, tornando a população alheia aos acontecimentos, não formando a ideia generalizada sem um conceito crítico, a de que “todo político é ladrão”? Ou actuar usando os benefícios da imprensa livre e obter o seu produto, que é a notícia?
No actual dilema em que vivemos, nossa formação antropológica permite apenas que tenhamos uma democracia que permita livre acesso às informações. Entretanto, acredito que poderíamos mudar ideologicamente a respeito do interesse público com a interferência contínua do jornalismo. O caso ocorrido no Ceará foi um ato de extrema imprudência. Negar acesso livre do cidadão a um lugar em que os próprios são os encarregados de escolherem seus representantes, serem recebidos de forma hostilizada pelo próprio Estado, é sinal de que os valores cívicos estão invertidos.
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[Luis Fernando Manassi Mendez é jornalista, Quaraí, RS]


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