David Pontes* - Jornal de Notícias, opinião

Lembrei-me várias vezes dessa sua irritação quando, nos alvores da atual situação governativa, as posições se dividiam muitas vezes entre o "vem aí radicalismo" de Esquerda ou o decretar taxativo que, com a atual maioria, tinha terminado a austeridade. Um pouco de ponderação oriental não nos fazia mal.
Foi lá pelas bandas do Oriente que um dia Deng Xiaoping gizou o seu equilíbrio entre a liberalização económica e um Estado comunista e por cá, à sua maneira, António Costa vai ensaiando a sua "terceira via", entre a austeridade que vigorou nos últimos quatro anos e que a Europa quer impor e uma política que, nas palavras do líder da CGTP, mas que poderiam ser entoadas pelos partidos à Esquerda do PS, não pode "assentar na obsessão de redução do défice" à custa dos trabalhadores e serviços públicos e no corte na "despesa social".
Não é um caminho fácil e os espectadores atentos vão procurando na linha em que o equilibrista avança o nó que pode redundar na queda. Já se disse que seria com a aprovação do primeiro Orçamento do Estado e ele passou, que seria no Programa Nacional de Reformas e ele está a passar, ou que será com o Programa de Estabilidade e, ao que tudo indica, ele também irá ser ultrapassado.
Para o ajudar tem um presidente da República que ou aparece a dar a deixa ao Governo ou a completar-lhe as frases e uma Oposição à Direita que ainda aparece abúlica, mal refeita de ter deixado um Mundo a preto e branco para entrar numa realidade cheia de matizes. Uma Europa mais empenhada na crise dos refugiados ou no "Brexit" também é um auxílio precioso.
É evidente que esta política de compromisso é feita de soluções de alcance limitado, o que restringe imenso algum ensejo reformista que os socialistas pudessem ter e que o país necessita de forma aguda, se quer ter perspetivas de futuro. É que a prazo, no caminho de todos nós, estão os resultados económicos que irão permitir aferir do sucesso deste percurso.
Mas até lá, continuaremos a ser surpreendidos por um primeiro-ministro capaz de se dar bem com Deus e com o Diabo e que, havendo alguém encarregado de tomar conta do Purgatório, é capaz de passar por lá para tomar café.
*Subdiretor
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