domingo, 21 de agosto de 2016

Tensão social faz Macri reforçar sua segurança

Alvo de ataques e ameaças, presidente da Argentina vê a aprovação do governo cair
 POR JANAÍNA FIGUEIREDO,
CORRESPONDENTE 21/08/2016 4:30 / atualizado 21/08/2016 8:10
Descontentamento. Manifestantes protestam contra o aumento das tarifas: com apenas 45% de aprovação, Macri vê crescer o questionamento de eleitores - FABIAN MARELLI / La Nación/GDA/14-7-2016
BUENOS AIRES — Quando assumiu o poder, em 10 de dezembro passado, o presidente da Argentina, Mauricio Macri, nunca imaginou que, oito meses depois, estaria lidando com agressões físicas em atos públicos e ameaças de bomba na Casa Rosada e até mesmo de morte contra sua vice-presidente, Gabriela Michetti. Nas últimas semanas, em meio ao aprofundamento do clima de mau humor social provocado pela recessão econômica e a adoção de medidas impopulares como o reajuste das tarifas de serviços públicos, o governo argentino foi obrigado a reforçar a proteção de suas principais autoridades. Segundo confirmou a ministra da Segurança, Patricia Bullrich, que acusou diretamente o kirchnerismo de “trocar democracia por pedradas”, o chefe de Estado passará a usar um carro blindado, enquanto avançam as investigações na Justiça sobre os recentes ataques.

Há pouco mais de uma semana, um grupo de manifestantes atirou pedras contra Macri e a governadora da província de Buenos Aires, a popular Maria Eugenia Vidal — que em breve se mudará para um bairro militar, por recomendação de assessores —, durante um ato no balneário de Mar del Plata. O incidente assustou o governo, que recebeu duras críticas sobre o seu esquema de segurança.

‘PLANO DE DESESTABILIZAÇÃO’

O juiz de Mar del Plata Alfredo López, encarregado de investigar o ataque, assegurou que “existe um plano sistemático de desestabilização” do governo Macri.

— O que vemos é um grupo ligado ao kirchnerismo que tem uma posição tão radical que troca democracia por pedradas, por agressão, pela tentativa de impedir que o presidente participe de atos públicos — declarou a ministra, que confirmou “várias ameaças de bomba” ao palácio de governo.

Este mês, a Justiça processou um tuiteiro detido por postar mensagens contra Macri, simulando ser membro do Estado Islâmico, pelo delito de “intimidação pública agravada”. Paralelamente, a vice-presidente recebeu ameaças de morte no telefone de uma fundação presidida por ela, caso que também está nas mãos da Justiça. “Você também deveria comprar um carro blindado porque vamos te fazer voar pelos ares, filha da puta”, foi o recado deixado para Gabriela, de acordo com informações do governo. Tentando manter a calma, a vice de Macri respondeu apenas que são embates que ocorrem porque querem fazer mudanças.

A relação entre os ataques e o kirchnerismo foi feita apenas pelo governo. Analistas locais ouvidos pelo GLOBO consideraram difícil de provar e ainda pouco clara a responsabilidade de seguidores da ex-presidente Cristina Kirchner (2007-2015). O que, sim, está claro, coincidiram, é que a tensão dentro e fora da Casa Rosada ocorre no momento em que Macri está em baixa e com evidentes dificuldades para atender às demandas e, sobretudo, às expectativas que sua chegada ao poder despertaram na maioria dos argentinos.

— O que preocupa é constatar que o presidente enfrenta estas ameaças, sejam de quem for, num contexto pouco favorável e no qual cresce a sensação entre os argentinos de que Macri governa para os mais ricos — disse o analista político Carlos Fara, da Fara e Associados.

De acordo com suas pesquisas, essa é a opinião de 55% dos argentinos atualmente.

— As expectativas positivas estão caindo e, ao mesmo tempo, aumentam sentimentos negativos, como raiva e decepção — enfatizou o analista.

Dados da Fara e Associados indicam que hoje a aprovação ao governo Macri alcança 45%, contra 49% de desaprovação. O presidente, frisou o analista, “está entrando num terreno complicado, embora ainda tenha margem de manobra”.

— Algumas questões estão sendo mal administradas, como as tarifas (semana passada a Corte Suprema anulou o reajuste do gás). A economia, que não se reativa, está no centro da agenda nacional — opinou Fara.

A economia segue estagnada e, segundo a Universidade Católica Argentina (UCA), com cerca de 1,4 milhão de novos pobres em menos de um ano de gestão. E a inflação continua alta — apesar de ter começado a desacelerar-se nos últimos meses —, os sindicatos estão inquietos e já pensam numa greve geral e grupos violentos rondam o presidente e as principais figuras de seu gabinete.

— Existem setores que estão tentando gerar um clima de incerteza, mas ainda parecem ser marginais — afirmou o analista Sergio Berenztein.

Para ele, “em torno de 30% dos argentinos detestam Macri, outros 30% são macristas convencidos e os que restam apoiam algumas medidas e criticam outras, são mais independentes”.

— A oposição ferrenha a Macri vem do kirchnerismo e da esquerda. Essas são as pessoas que o acusam de governar para os ricos — apontou Berenztein.

UM ANO RUIM

O analista acredita que as ameaças ao presidente podem estar relacionadas à reforma dos serviços de inteligência e à política de combate ao narcotráfico.

— Em todo caso, são consequências de medidas que eram necessárias — disse Berezntein.

Venham de onde vierem, a realidade é que o presidente já deixou atrás o clássico período de lua de mel com seus apoiadores e hoje vive às voltas com panelaços e questionamentos cada vez mais frequentes por parte de seus eleitores — que, a esta altura, esperavam estar vivendo numa Argentina com menos inflação, mais emprego, menos pobres e mostrando os primeiros sinais de recuperação de sua economia.


— Ninguém esperava um 2016 tão ruim, nem mesmo Macri — concluiu Fara.

Fonte:oglobo

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