A investigadora Maria de Lurdes Lopes Rodrigues foi presa, na semana passada, para cumprir uma pena de três anos de prisão por crimes de injúria e difamação. A condenação “insólita” surge no âmbito de um processo que começou há 20 anos.
O caso está a gerar uma onda de indignação nas redes sociais, entre amigos e desconhecidos da investigadora, e muitos consideram a prisão de Maria de Lurdes Rodrigues injusta.
A investigadora foi detida na passada quinta-feira, 29 de Setembro, quatro anos após ter sido emitido o mandado de detenção no âmbito de um processo em que foi condenada por crimes de injúria e difamação.
Tudo começou em 1996, quando ela perdeu uma bolsa de estudo e despoletou um processo de contestação, pondo em causa o processo de atribuição das bolsas e depois, também os juízes que não lhe deram razão em tribunal.
Maria de Lurdes Rodrigues está detida no Estabelecimento Prisional de Tires para cumprir uma pena de prisão efectiva de três anos.
O caso é insólito e considerado quase inédito, já que a investigadora é “uma das poucas pessoas que estão condenadas a cumprir pena efectiva de prisão por crimes menores como injúria ou difamação”, conforme salientava o Diário de Notícias num artigo de 2013.
Condenação “insólita e rara”
O mandado de detenção em nome da investigadora foi emitido a 20 de Dezembro de 2012, altura em que foi condenada por ter ofendido “as mais altas magistraturas da nação, incluindo o ex-procurador-geral da República Pinto Monteiro”, sublinhava o DN.
O então bastonário da Ordem dos Advogados, António Marinho e Pinto, dizia ao mesmo jornal que a condenação é “absolutamente insólita e rara“, comparando-a com outros casos mediáticos que acabaram por ser arquivados.
“É raríssimo alguém ir preso neste país por crimes como difamação ou injúria. Se essa senhora tivesse dinheiro para pagar uma boa defesa não seria presa”, dizia ainda Marinho e Pinto, lembrando, por exemplo, que um processo envolvendo o jornalista Miguel Sousa Tavares, por ter chamado“palhaço” ao então Presidente da República Cavaco Silva, foi arquivado.
Tudo começou em 1996
A história de Maria de Lurdes Rodrigues com a Justiça portuguesa começa em 1996, quando era estudante e viu o Ministério da Cultura, na altura chefiado por Manuel Maria Carrilho, retirar-lhe uma bolsa de estudo de longa duração para estudar cinema na Holanda.
“A Lurdes está presa desde ontem porque ousou questionar o poder discricionário de Manuel Maria Carrilho (MMC) enquanto Ministro da Cultura. MMC retirou-lhe uma bolsa - que ela tinha ganho por mérito em segundo lugar e porque o primeiro da lista desistiu”, escreve um amigo da investigadora, Mário Gomes, no seu perfil do Facebook, onde lança um apelo para a sua libertação.
Após lhe ter sido retirada a bolsa, surgiram suspeitas de um eventual falseamento do júri no processo por parte de duas funcionárias do Ministério da Cultura.
A investigadora levou o caso para tribunal, desencadeando diversos recursos e queixas-crime, apresentando também vários pedidos de reconsideração da decisão de Manuel Maria Carrilho, incluindo exposições por escrito ao então primeiro-ministro, o novo secretário-geral da ONU António Guterres, ao provedor de Justiça, Menéres Pimentel, e ao próprio ministro da Cultura.
Investigadora acusou juízes de corrupção
O processo chegou ao Supremo Tribunal de Administração (STA) que não lhe deu razão. A investigadora apresentou então queixa-crime contra os juízes do STA, argumentando que foram “coniventes” com um alegado “roubo de actas do júri” por parte do Gabinete de Relações Internacionais do Ministério da Cultura.
Mário Gomes afirma que a amiga “ganhou o processo ao Carrilho mas perdeu os seguintes com um juiz a quem acusou de corrupção, porque no seu entender se punha sempre do lado do ministro”.
Todo este processo, que começou com a perda da bolsa, impedindo-a de continuar os seus estudos, deu “cabo da vida” de Maria de Lurdes Rodrigues, salienta Mário Gomes.
Como alternativa à pena de prisão efectiva, foi apresentado um tratamento psiquiátrico que ela sempre recusou, entregando um atestado médico a comprovar que não prefigurava qualquer caso clínico.
Foi assim, detida na semana passada e encontra-se a cumprir pena no Estabelecimento Prisional de Tires. E já não pode recorrer da condenação para o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, já que o acórdão da mesma transitou em julgado em Abril de 2012, isto é, há mais dos seis meses que são requisito para o poder fazer, conforme destaca o especialista em liberdade de expressão Teixeira da Mota.
ZAP / Ciberia
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