segunda-feira, 19 de junho de 2017

Porquê?

P
 
 
Enquanto Dormia
 
David Dinis, Director
 
Já lá vamos, ao porquê. Antes disso tenho que lhe contar sobre o que se passou em Londres e Paris:
No Norte de Londres, uma carrinha atropelou várias pessoas na madrugada desta segunda-feira, junto a Finsbury Park e a uma mesquita. A polícia já confirmou que uma pessoa foi declarada morta no local e que o suspeito, um homem de 48 anos, foi detido, depois de ter sido impedido de sair do local pelas pessoas que estavam na rua. O Governo e o mayor da cidade falam de um ataque terrorista - mais um. E a descrição do que aconteceu não pode fugir à palavra de sempre nestes casos: tragédia. Para ler, aqui.
De França vêm notícias com sorrisos - pelo menos de Emanuel Macron e da maioria que votou no seu partido. O Republique En Marche conseguiu mesmo uma maioria absoluta no Parlamento e abriu todo um novo ciclo político no país. O Jorge Almeida Fernandes escreveu o porquê.

Porquê?

Porquê? Pelo menos 62 vezes "porquê?". Andamos há anos e anos — 50 anos pelo menos — a ouvir os especialistas dizer a mesma coisa. Todos os anos perguntamos, todos os anos nos respondem que agora vai ser diferente. Nunca é. Porquê?
Como escreve a Ana Fernandes, no texto que lança o nosso trabalho sobre Pedrógão, que é também sobre a maior das nossas tragédias, os incêndios: “Não há rigorosamente nada de novo a dizer. Já tudo foi estudado, explicado e escrito na última década e meia. Houve comissões para todos os gostos e feitios. E foi feito muito trabalho sério. Faltou tudo o resto.” E de novo perguntamos: porquê?
Na procura das respostas a esse porquê, é preciso começar por este texto: "O que é que falhou neste sábado? Tudo, tal como falha há décadas". E é preciso seguir caminho pelo Pinhal Interior (colonizado pelo eucalipto), para perceber melhor o que escreve o Manuel Carvalho ("Um desastre a interpelar o nosso futuro"), a pergunta de Henrique Pereira dos Santos ("Imprevisível?"), a de Fernando Santos Pessoa (“Estás a ver no que dá terem acabado com os Serviços Florestais?”) ou estas respostas de Paulo Fernandes às nossas primeiras dúvidas ("O mínimo era que encerrassem estradas a tempo e horas"). As nossas dúvidas não acabam: como lidar com os campos ao abandono? E teria sido possível evitar esta tragédia? 
E vamos ter que voltar atrás, às horas mais terríveis, para respondermos ao porquê: hora a hora, em Pedrógão, como foi? E ler também o que é a trovoada seca, que se diz ter sido o causador do incêndio. Mas o nosso "porquê" continua aceso. Porque não chega um raio seco para explicar como aquela imensidão de território passa do paraíso para este inferno, visto pelas lentes do Paulo Pimenta. Para explicar o que viu e ouviu a Patrícia Carvalho ("Começou a chover lume e Dora pediu a Dulce que lhe levasse os filhos para os salvar"), a Sandra Rodrigues e o Adriano Miranda (“Num segundo as chamas estavam a quilómetros, noutro já estavam em cima de nós”), ou a Liliana Valente ("não têm casa por uma noite ou não têm casa de todo?").
Na sua hora mais triste, o país juntou-se para ajudar os sobreviventes. A entreajuda, de que fala o Rui Tavares, aconteceu em tal dimensão que a ministra já veio pedir para que não se mande mais comida. Mas não é só de alimentos, que as famílias e bombeiros precisam: ainda há muito que podemos fazer , antes mesmo de nos dedicarmos a "devolver ao mundo a sua normalização", como explica o Márcio Berenguer, com a ajuda dos que ajudaram a recuperar dos incêndios na Madeira, no Verão passado.
Com o país de luto face à tragédia, com o Presidente a pedir que se adiem as "interrogações", nós continuaremos por aqui. A registar as primeiras páginas (nossas e as de lá de fora), a anotar textos na concorrência que vale a pena ler, a acompanhartudo ao minuto. A fazer a pergunta que tem muitas perguntas dentro: "porquê?". Porque já são anos demais a fazer o luto. Porque não podemos repetir a mesma pergunta outra vez. Porque só assim Portugal poderá, sem medo nem vergonha, voltar a olhar-se ao espelho. Porque é esta a nossa missão: fazer perguntas, até que alguém nos responda.

Se quiser outras leituras

1. Vai correr bem? O que os pais dizem sobre os exames dos filhos. A Clara Viana e o Samuel Silva foram saber junto de figuras conhecidas do público como vivem a altura em que os filhos se prepararam para os exames e o que pensam destas provas. As atitudes e opiniões divergem, mas no essencial todos se preocupam. A avaliação arranca nesta segunda-feira. Começas tu, Clara de Sousa? Já ontem, por aqui, tinha ficado um trabalho interessante para pais e filhos (Será que os exames como os conhecemos têm os dias contados?) e uma entrevista ao ministro da Educação.
2. As negociações do “Brexit” começam em modo de navegação à vista. E começam hoje em Bruxelas, com um calendário exigente, enormes obstáculos e muitas incertezas sobre os planos britânicos, explica a Ana Fonseca Pereira. Para perceber o ponto de partida, eis o que quer o Reino Unido e as condições da UE. Para nos pôr a pensar sobre isto, o Manuel Carvalho escreveu um quase manifesto ("O Reino Unido não pode ser humilhado"), enquanto João Pedro Castro Mendes, do Institute of Public Policy, foi por aqui: "A very British mess".
3. Helmut Kohl, o bom gigante. Fez a nossa capa de sábado, quase toda a capa, porque há homens que ganharam um lugar na história - porque mudaram a nossa história. O obituário foi escrito pela Teresa de Sousa e começa no dia 11 de Janeiro de 1996, voltando depois atrás. Num outro texto, Carlos Gaspar circunscreve-se a um pequeno grande momento na história do chanceler da nossa geração: o da reunificação.

A agenda de hoje

Só mais um minuto...

... para lhe pedir (pedir mesmo) que leia a crónica do Adriano Miranda, o repórter fotográfico do PÚBLICO que no sábado à noite saiu de casa e se pôs a caminho da estrada da morte. "O meu filho Filipe perguntou porque tinha de ser eu a ir para Pedrógão. Respondi que era o dever. A missão. Perante mim e perante o jornal que represento. Parti com um adeus. Cheguei ao IC8 e já estava cortado. Esperei e fiz nova tentativa. Consegui. E com os máximos galguei a serra até ver o clarão ao longe. Com curvas e rectas entrei numa aldeia. Velhos estavam sentados. À espera. Meti pelo caminho que me levava às luzes azuis. Ali estava ele. O monstro. Assobiava e dançava numa atitude de gozo. Os soldados da paz e das aflições gritavam. Os velhos continuavam à espera. E depois, aquela senhora de preto. Nunca mais a esquecerei"O Adriano continua a crónica, por aqui. E o trabalho dele no inferno ficará para sempre neste sítio.
Ao Adriano, e todos os jornalistas do PÚBLICO, deixo um abraço forte e um obrigado pelo esforço incansável das últimas horas.  
Para si, hoje, na despedida, só lhe consigo dizer mais isto: estaremos por aqui, sempre. Até já.

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