Em tempo de guerra não se limpam armas, sagaz princípio mas que não serve para que se esqueça. São mortes a mais para que possamos sequer esquecer quanto mais perdoar.
Perdoar os carros brancos modernos que aparecem perante a vetustez dos carros vermelhos; perdoar quem se mete em bicos dos pés para aparecer no retrato e sempre de farda imaculada; perdoar os especialistas de tudo e mais alguma coisa que sabem tudo mas nunca propuseram nada porque deixa-me estar caladinho a ver que talhadame toca; perdoar a altivez de um terreiro do paço, de todas as cores políticas que eles todos mamam, que continua a ignorar metade de um país que teve o azar de ter nascido virado a espanha e com nababos no seu mando; perdoar os que não querem imagens, que dificultam o trabalho de quem informa, com rudeza e grosseria como se fosse possivel esconder uma tragédia destas; perdoar os mais de 30 anos que vamos levar para que os mais de 24 mil hectares ardidos possam voltar a pintar de verde as serras. Perdoar os que nos prometeram que estava tudo bem, que este era o melhor dispositivo de sempre e que afinal não aguentou uma trovoada e nem uma estrada conseguiu fechar; perdoar a falta de vergonha de um país que paga principescamente aos serventuários que tem no seu mando mas que na hora de assumpção das culpas assobiam para o lado e enxotam a mosca com medo que a merda lhes caia no focinho que ele nós nunca tivemos culpados de nada. Há sempre uma trovoada, há sempre uma falta de caminho, há sempre tudo e mais alguma coisa e afinal continuamos a ver que quando a tragédia é dantesca todos perdem o norte, refundidos num abraço como se há 15 dias já não se soubesse o que aí vinha. Não se poderia evitar? Talvez não mas poderia ter sido minorado, mitigado, reduzido. E isso são coisas que não perdoamos.
E também não vamos esquecer o que aconteceu para que nao nos prometam, no setembro que há-de vir, que para o ano é que vai ser que é o que têm feito desde há muitos anos com total complacência, também minha e dos meus, da sociedade que nunca pede contas aqueles que lhes administram a pátria.
Mas em tempo de guerra não se limpam armas e portanto, agora que aparecem cozinhas e refeições quentes; psicologos e especialistas forenses; médicos e curandeiros; aviões e botas cardadas, vamos esperar que nos apaguem o braseiro e que nos dêem a justificação que merecemos. E que não limpem as mãos borradas de merda à parede e que não crucifiquem os do costume que esses, bem ou mal, sempre fizeram, nunca fugiram e nem se desculparam. Fizeram sempre o melhor e muito mais do que se lhes exigia.
E que agradeçam a este povo magnanino que consegue transformar a solidariedade em actos concretos: comida para dar alento a quem tudo perdeu; água para matar a sede de quem combate e dinheiro, como fez a Gubenkian com massa que se veja, para que a população possa recomeçar.
Tudo o resto é uma tremenda miséria, uma indigência moral por omissão que este país e estas pessoas, que sempre ali estiveram mesmo quando lhes levaram as escolas, os bancos, os médicos, a justiça, a segurança; não merecem. Para que não nos esqueçamos não vamos perdoar o silêncio nem as desculpas do costume.
E já agora que somos todos do mais afectuoso que há, quando devíamos ser os mais velhacos dos cinicos mas enfim, que pespeguem uma medalha, das melhores que a Patria tem, aos Bombeiros no próximo 10 de Junho. É que na hora do caldeirão são esses que nos valhem. Os que todos vituperam, insultam, ignoram e a quem não provisionam o minimo para que nos acudam mas que arranjam forma de prover sempre o máximo para nos proteger.
E se em 1986; 1995; 1998; 2003; 2005 e 2013 não aprendemos que seja em 2017 que vamos aprender. Mas aprender fazendo! Que já chega de nos enrolarem com politiquices, desculpas, dificuldades e devaneios. Só a nossa raiva é que não aplacam. E por muito que me doa a alma não quero chorar enquanto não me passar esta raiva que me consome. Como é que isto foi possivel!
Até lá que não se limpem as armas e o nosso Bem-haja Bombeiros de Portugal que sois gesta do melhor que a Pátria tem. Mas não me digam que isto correu tudo bem que éa mais bera das falácias. Não não correu. Correu 61 vezes mal mais os que estão nos hospitais e ainda os que perderam a vida num fósforo do laxismo.
Não esquecerei nem perdoarei.
Amadeu Araújo
Fonte:BPS
Fonte:BPS
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