As agendas políticas andam amiúde ao sabor dos incêndios mediáticos. Fazem-se declarações inflamadas, prometem-se respostas legislativas, mas entretanto o lume baixa ou aparece outro fogo e nada acontece.
01 de agosto de 2017 às 23:00
Tem sido assim com o tema das comissões bancárias. Foi criado em Janeiro do ano passado um grupo de trabalho no Parlamento para legislar sobre o tema, mas há mais de um ano que nada acontece. O dito grupo está até sem representantes do PS, depois de Ana Passos e Eurico Brilhante Dias terem ido para o Governo. Uma prioridade, portanto.
Nos últimos anos, um grande número de portugueses viu juntar-se às facturas da luz, da água ou das telecomunicações a mensalidade do banco. Ter conta numa instituição financeira já foi grátis – agora paga-se e até já há pacotes com vários serviços ao estilo "triple play". Quem tem crédito viu o custo com juros encolher, e muito, e o das comissões subir bastante.
Aumentos que serviram para minorar o efeito devastador dos juros negativos nos resultados, em parte culpa (própria) dos "spreads" ultrabaixos. Um caminho endossado, de resto, pelos reguladores na Europa e em Portugal.
Seguindo o ardor mediático, os partidos voltaram a pegar recentemente no tema a propósito do aumento das comissões na Caixa e do facto de muitos pensionistas perderem a isenção. É cinismo político. Todos sabem que a Caixa está a aumentar comissões e vai continuar a aumentá-las porque a isso está forçada pelo acordo de recapitalização assinado com Bruxelas e Frankfurt. Está no plano estratégico: o peso desta receita no volume de negócios tem de passar de 0,35% para 0,45% até 2020.
O problema da Caixa é que chega tarde à onda. Enquanto os restantes bancos iam surfando a vaga – Nuno Amado afirmou na semana passada que no caso do BCP ela chegou ao fim –, o banco público esteve encalhado na indefinição da liderança e do plano de recapitalização. O tema é politicamente sensível e Paulo Macedo usou a apresentação de resultados para preparar terreno quando afirmou que "a Caixa tem as comissões mais baixas do mercado". Podem não o ser em termos absolutos, mas são-no em termos do peso no negócio. E, Frankfurt "oblige", isso terá mudar. Ser o banco do Estado é irrelevante.
Os partidos hão-de inflamar-se de novo. Mas até o Bloco e o PCP sabem que o regresso à rentabilidade é essencial para a recuperação da banca portuguesa, o que por sua vez é chave para o crescimento da economia e diminuição da percepção de risco nos mercados, sem os quais o financiamento da sua dispendiosa agenda política é inviável. O presidente da Associação Portuguesa de Bancos diz que tem existido um "diálogo frutuoso" com os dois partidos que suportam o Governo em matéria de comissões. E assim continuará a ser. Pelo menos em privado.
Fonte: Jornal de Negócios
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