por Dinis de Abreu |
O jornalismo vive dias difíceis. O avanço no digital não compensa os jornais que fecham e as redacções que reduzem os quadros. Criou-se um sentimento de precariedade no oficio de jornalista que ameaça a sua independência. Ou pior: que o coloca numa grande dependência perante as incertezas.
Na livre América, o jornalismo cerrou fileiras contra a ofensiva de um presidente que elegeu os media como destinatários privilegiados das suas diatribes, via tweet, ao amanhecer. Na Venezuela, há uma cruzada nas ruas, em risco de vida contra um poder despótico, que arruinou há muito qualquer conceito democrático. No Qatar, a Al-Jazeera - uma televisão que soube conquistar uma respeitável cidadania internacional, apesar das cedências iniciais -, está a braços com crescentes dificuldades para sobreviver com mínimos de liberdade. Na Turquia, encarceram-se jornalistas, julgados por “delito de opinião”, ou por informarem à revelia dos cânones censórios de um presidente que está que a eliminar a herança de Atarturk, que lutou por separar o Estado da religião. E em tanto outro mundo, que nos é menos próximo, sobejam os exemplos de perseguições, degredos, com silenciamento dos jornalistas que ainda ousam pensar pela sua cabeça .
Em Portugal, o jornalismo atravessa um dos seus períodos mais cruciais. Um dia, nos idos de 70, antes ainda do 25 de Abril, Francisco Pinto Balsemão editou um livro, cujo título tinha a ver com a época, mas que se revelaria premonitório: “Informar ou Depender”.
É do que hoje se trata. Informar ou depender? Há sintomas já preocupantes.
A “lei da rolha”, imposta pelo Governo aos bombeiros empenhados no combate aos incêndios que lavram pelo País; o escamoteamento ou desvalorização de tudo o que incomode o poder político do dia, seja Pedrogão Grande, Tancos ou o apuramento de responsabilidades nos empréstimos ruinosos da CGD; o cerco do “politicamente correcto” às opiniões diferentes; ou a adopção de uma linguagem menos canónica por parte do primeiro ministro.
São sinais de alarme, num Verão quente pela sazonalidade da natureza e pela temperatura política que não promete baixar nos tempos mais próximos.
Depois, as empresas editoriais estão a viver uma transição complexa. Seja por escassez de recursos, seja pelas dúvidas que sempre se instalam quando mudam os accionistas de referência.
A Impresa viu-se forçada a cancelar uma emissão obrigacionista, por aparente desinteresse dos investidores institucionais. A Media Capital, com a TVI , deixará de ser em breve espanhola – se os reguladores não se opuserem – para ser controlada por franceses. A Global Noticias (Diario de Notícias, Jornal de Notícias e TSF), a confirmarem-se os rumores, defronta o comportamento dúbio dos investidores chineses.
Quando os principais grupos editoriais se debatem com não poucas incógnitas, a vulnerabilidade das redacções deixa o jornalismo sem rede.
São já escassos os “refúgios” para escrever com independência. Informar está a converter-se num jogo de dependências. Há quase meio século havia uma censura que incomodava Balsemão e todos os jornalistas que sonhavam com a liberdade de Imprensa. Hoje - não se duvide - , há novas censuras e autocensuras.
Pode ser o princípio de outro mau fim. Ser jornalista está a ficar um ofício perigoso. Excepto para os invertebrados, que não são jornalistas.
Fonte: CPI
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