A viagem do presidente Michel Temer a Pequim deu origem a 14 acordos. Deixo de lado o memorando de cooperação relativo ao futebol e outros penduricalhos. Falo sobre financiamentos oficiais da China ao Brasil e compra de ativos de empresas brasileiras por estatais chinesas.
A propósito e de passagem, durante os dias em que Temer lá esteve, a estatal chinesa CMPort (China Merchant Port) comprou por R$2,9 bilhões 90% do TCP, terminal de cargas de Paranaguá. O terminal movimenta 10% dos contêineres no Brasil. A CMPort, agora dona, assim anunciou a nova propriedade em seu site: “A CMPort compra 90% do segundo maior porto do Brasil. A China Merchant Port Holdings Company Limited (CMPort) tem a satisfação de anunciar que comprará 90% do Porto de Paranaguá”.
Ainda no site se pode ler: “O China Merchant Group é um conglomerado de propriedade estatal.” Administra ativos próximos a US$1 trilhão, teve lucro de aproximadamente U$8 bilhões no ultimo exercício. É estatal semelhante à Petrobrás no Brasil, com ações negociadas em Bolsa. Qualquer diretor só é nomeado com o acordo do governo e do Partido Comunista Chinês. De outro modo, longa manus do governo e do PC chineses. A garra se fincou no porto de Paranaguá.
Volto aos resultados da viagem do presidente Michel Temer, selecionando trechos de ampla notícia do diário espanhol “El País” — os NB são destaques meus: “As autoridades chinesas respaldaram na sexta-feira o programa de privatizações realizado pelo presidente Michel Temer. O presidente chinês Xi Jinping insistiu no aumento dos intercâmbios econômicos entre as duas nações, e indicou novos investimentos de seu país ‘nos setores energético, agrícola e de infraestrutura’ do Brasil. São, justamente, parte das áreas que Temer quer abrir ao setor privado, acreditando que a China desempenhará um papel determinante. Os dois países assinaram 14 acordos bilaterais, dentre os quais se destacam a aprovação de uma nova linha de crédito de 300 milhões de dólares [NB: crédito estatal] ao Banco do Brasil e outro preparatório para que o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) receba uma linha de 3 bilhões de dólares [NB: outra vez, crédito estatal], uma confirmação de que a China tem se tornado o grande banqueiro do Brasil [NB: repito, dinheiro de bancos estatais chineses]. Na área da infraestrutura, a empresa chinesa State Grid [NB: estatal] assinou a licença para as obras da linha de alta tensão entre o Xingu e o Rio de Janeiro, enquanto a China Communication and Construction Company [NB: estatal] investirá 700 milhões de dólares na construção de um terminal de uso privado no porto de São Luís. A China National Nuclear Corporation [NB: estatal] assinou também um memorando de entendimento com a Eletrobrás para continuar com a construção da usina nuclear de Angra III. Afirmou Zhang Run, subdiretor para a América Latina e o Caribe no Ministério das Relações Exteriores chinês: “O Governo continuará incentivando as empresas chinesas a participarem ativamente na cooperação econômica e comercial com os países da América Latina, incluindo o Brasil e a Venezuela”. Sobre o programa de privatizações, disse a “El País” Li Yinsheng, executivo-chefe da China Three Gorges Brazil [NB: estatal], que opera duas das maiores hidrelétricas do país, em Ilha Solteira e em Jupiá: “Temos interesse nesse plano”.
Aviso de novo: em princípio, acho benéfica a presença de capital estrangeiro privado no Brasil, sou favorável a privatizações e concessões, mas não desse jeito. Está em jogo a soberania nacional; mais fundo, nosso futuro de nação cristã, com raízes ocidentais.
Este artigo, em parte, é costura de citações. O motivo é que escrevi tantas vezes sobre o tema que me dispenso de repetir aqui o que lá atrás já denunciei. Uma constatação resume tudo: estatais chinesas, dirigidas pelo governo e pelo Partido Comunista Chinês (PCC), estão avançando com garganta de jacaré sobre a economia brasileira. E o maior parceiro comercial do Brasil é a China comunista. Como resultado, querendo ou não — aqui também é constatação —, vamos sendo arrastados da condição de país formalmente independente e soberano para a de, na prática, protetorado chinês, no caso sujeitos a um poder despótico, ateu, coletivista e totalitário. Não adianta chiar, fechando olhos para fato óbvio. Daqui a quanto tempo? Não sei; é claro o rumo, porém.
Continuo voz isolada, mas aqui e ali começam a pipocar constatações parecidas. É um bico de gás de esperança. Um sintoma: vejam extratos do editorial de “O Estado de S. Paulo”, 5 de setembro: “Futebol de um lado, dinheiro e tecnologia do outro, isso resume a maior parte dos atos assinados por brasileiros e chineses. Muitos bilhões de dólares em créditos e investimentos. Os chineses passarão a controlar ativos importantes na área da infraestrutura. Os atos assinados remetem a uma deprimente história de erros do lado brasileiro. O governo brasileiro converteu o País em fornecedor de matéria-prima para o mercado chinês, numa relação semicolonial”. Relação semicolonial. De um lado, a semicolônia; do outro, a semimetrópole.
A primeira luzinha de esperança é ter nitidez sobre a gravidade do quadro. Começo a perceber. Cegos não vão a lugar algum. Outro ponto é que vem apagando entre nós o difuso otimismo superficial, amigo do devaneio, enraizado em ufanismo nacionalisteiro.
Serei sintético, só tratarei de um ponto, o espaço acabou. Por causa de sofrimentos e dificuldades, afirmou Nelson Rodrigues, “aprendi a ser o máximo possível de mim mesmo”. Grande programa, ele vale para pessoas, escolas, empresas, nações. O Brasil sairá da humilhação, se aprender a ser o máximo possível de si mesmo, entendendo logo que o mais importante é favorecer condições para buscar a plenitude em todos os âmbitos. Trabalhando para que, em clima de harmonia social, temperança e diferenças proporcionadas, haja estímulo às potencialidades de cada um. Quanto mais, melhor. É um programa para pais, religiosos, líderes políticos e empresariais. Seriedade na família, esforço na escola, liberdade, garantias à propriedade e livre iniciativa na economia. Ajudado por Deus, o Brasil aprenderá assim a ser o máximo possível de si mesmo.
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