João Pedro Pereira
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A neutralidade da Internet, uma regra segundo a qual todos os dados que circulam na rede devem ser tratados de forma igual pelos operadores, foi um tema que ressurgiu nos últimos dias. No essencial, o problema já tinha sido dado como resolvido há uns anos, tanto nos EUA como na União Europeia, com legislação que procura assegurar a neutralidade. Agora, a autoridade que regula as comunicações nos Estados Unidos, a FCC, decidiu desenterrar o assunto e as garantias de neutralidade em vigor naquele país poderão vir a ser revertidas.
O caso conquistou particular atenção em Portugal porque vários sites americanos apontaram uma oferta da Meo como um exemplo do que classificaram como consequências nefastas de uma Internet não neutral. O operador permite aos clientes comprarem tráfego móvel que pode ser usado apenas em conjuntos de aplicações específicas (por exemplo, aplicações de mensagens como o Skype e o WhatsApp).
Aquela oferta da Meo não é um caso clássico da Internet a duas velocidades que decorre de uma Internet não neutral (a empresa diz cumprir as regras europeias de neutralidade e que o caso está a ser mal interpretado). O problema não é tanto o de permitir aos consumidores escolherem aplicações como se fossem canais de televisão, é o de permitir que prestadores de serviços (como o Google ou o Netflix) paguem mais ao operador para que os seus conteúdos tenham prioridade e cheguem mais depressa aos consumidores. A Meo, porém, não deixa de ferir o espírito da neutralidade, já que uma nova aplicação de mensagens criada por uma startup tem mais dificuldades em competir com o WhatsApp por não estar fazer parte daqueles pacotes.
Num cenário de Internet não neutral, as grandes empresas poderão pagar ao operador e assim esmagar os concorrentes mais pequenos, mas os operadores também poderão cobrar a essas grandes empresas, sob pena de abrandarem o respectivo tráfego (ou darem prioridade ao tráfego concorrente, o que na prática não é muito diferente) – e é sobretudo por isto que os gigantes da Internet, como o Google, o Facebook e a Amazon, entre outros, são defensores de uma Internet neutra, ao passo que os operadores argumentam que têm de ser recompensados pelo investimento que fazem nas infraestruturas para suportar serviços que requerem cada vez mais largura de banda.
O voto da FCC está marcado para 14 de Dezembro. O alinhamento político naquela organização (três republicanos e dois democratas) permite antever um voto favorável ao plano de reverter a neutralidade nos EUA, a que se seguirá uma batalha legal entre as várias partes interessadas. É inevitável uma enorme sensação de déjà vu...
Bitbolha “É uma bolha!”, gritavam alguns há uns meses, quando cada bitcoin valia dois ou três mil dólares. “É uma bolha!”, continuam muitos a dizer agora, quando a divisa digital se aproxima de uns espantosos dez mil dólares (é possível que já tenha acontecido à hora a que lê estas linhas).
A cada mil dólares de valorização, quebra-se uma barreira psicológica (mesmo que passar dos dois mil para os três mil dólares seja um salto muito maior do que passar dos nove mil para os dez mil). E a cada barreira que se quebra mais pessoas sentem-se tentadas a apanhar o barco antes que seja demasiado tarde.
As bitcoins (e as outras criptodivisas, bem como os pouco ortodoxos modelos de financiamento que trouxeram) são um dos fenómenos do ano, deixando muitos reguladores, investidores e outros agentes do mundo financeiro sem saber bem o que fazer ou pensar. Por ora, parece forte o argumento de que a principal razão para comprar bitcoins é esperar que o preço suba.
Digno de nota
- Com o atraso causado pelas duas semanas de ausência desta newsletter, aqui fica a referência à entrevista ao responsável máximo do Google para a Europa, Matt Brittin. O executivo admitiu que a empresa tem responsabilidades no bom funcionamento da Internet, mas argumentou que não pode garantir que não voltam a acontecer surtos de desinformação como os que aconteceram no ano passado durante as eleições americanas.
- A Uber vai comprar 24 mil carros à Volvo para uma frota de automóveis autónomos. É mais um sinal das muitas transformações que se avizinham no sector.
- Alguns jardins-de-infância em Portugal estão a usar pequenos robôs para ensinar rudimentos de programação informática a crianças. Saber programar é actualmente mais de meio caminho andado para uma carreira confortável, e a União Europeia tem avisado que este tipo de competência escasseia face ao que se antecipa serem as necessidades num futuro próximo. Mas não é consensual que se deva introduzir crianças tão pequenas à programação informática, mesmo que numa forma lúdica e muito básica, como explica o artigo da Karla Pequenino. E surge a questão: o que acontecerá se todas as crianças quiserem ser programadores informáticos quando crescerem?
4.0 é uma newsletter semanal dedicada a tecnologia, inovação e empreendedorismo. O conteúdo patrocinado nesta newsletter não é responsabilidade do jornalista. Críticas e sugestões podem ser enviadas para jppereira@publico.pt. Espero que continue a acompanhar.
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