sábado, 3 de dezembro de 2016

OPINIÃO: Ou a RTP muda, ou teremos de mudar a RTP


Quem manda na RTP não se dará conta disso; mas, se não fosse o 1.º de Dezembro, a Rádio e Televisão de Portugal não existiria — teríamos a TVE.
José Ribeiro e Castro
JOSÉ RIBEIRO E CASTRO

A Lei da Televisão fixa como fins da actividade televisiva contribuir para a informação, formação e entretenimento do público”promover a cidadania” difundir a cultura portuguesa e os valores que exprimam a identidade nacional”. Ora, se tivéssemos que nos deitar a pensar num evento que reunisse tudo isto ao mesmo tempo, o Desfile Nacional de Bandas Filarmónicas 1.º de Dezembro está nesse elenco reduzido: informa, forma e entretém; promove a cidadania; difunde cultura portuguesa; difunde os valores da identidade nacional.

A RTP deve, portanto, transmitir o desfile, na íntegra e em directo, como fez, com agrado geral, em 2013 e 2014. Há um ano, recuou para um diferido muito mal tratado. Agora, nem isso. Irá fazer ligação a alguns momentos, em doses homeopáticas, um poucochinho de vez em quando, recuando, contrariada, para o improviso a que recorreu na estreia, em 2012. Está mal. Está mesmo muito mal.

Aquele preceito da lei aplica-se a todas as televisões, pelo que, dirão, todas deveriam estar no desfile. É uma boa observação e um bom argumento. Mas a RTP tem um dever superlativo, uma obrigação acrescida em tudo o que respeita ao interesse público. É o que resulta da lei e da própria noção de serviço público. Aí se enquadra a obrigação legal de a RTP ter “uma programação que promova a formação cultural e cívica dos telespectadores” e a incumbência de “promover o acesso do público às manifestações culturais portuguesas”. Não é que o 1.º de Dezembro e o Desfile Nacional de Bandas aqui estão a espreitar outra vez?

Se lermos o Contrato de Concessão de 2015, encontramos, como é natural, mais numerosos pontos de apoio a que a RTP não desvalorize o 1.º de Dezembro e transmita em directo um acontecimento com a grandiosidade do desfile nacional. Neste ano, irão estar na Avenida da Liberdade e Praça dos Restauradores 35 bandas filarmónicas e grupos de todo o país, incluindo, pela primeira vez, dos Açores, encerrando com um final espectacular, que congrega em orquestra gigante mais de 1700 músicos tocando ao mesmo tempo. O país não poderá seguir o desfile, porque esta administração e esta direcção decidiram não transmitir.

Quem manda na RTP não se dará conta disso; mas, se não fosse o 1.º de Dezembro, a Rádio e Televisão de Portugal não existiria — teríamos a TVE. Não haveria 1.º de Dezembro, é certo; e não haveria RTP também. É assim tão simples. É por isso particularmente deplorável este recuo decadente da cultura dirigente da estação pública, um recuo que é o regresso, por outra porta, do mesmo espírito que desvalorizou a data para matar o feriado. Agora, ironia do destino, temos feriado e celebrações para a frente; e temos RTP para trás.


É reprovável ainda a desconsideração e a ofensa feitas, em geral, às bandas filarmónicas e, em paralelo, aos municípios.

Fonte: Publico

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