Os resultados da colocação de dívida pública, desta quarta-feira, falam por si. O custo de 4,227% numa emissão a dez anos é o valor mais alto em quase três anos, acabando por não ser necessariamente uma surpresa tendo em atenção a evolução dos juros no mercado secundário.
O valor é dramático? Não. Se fosse, o competente IGCP não teria avançado. É preocupante? Sim.
Tem andado fértil a discussão sobre de quem é a culpa da subida dos nossos juros nos mercados internacionais, se das travessuras de Costa e de Centeno se da evolução da inflação e das políticas financeiras do BCE. Na verdade, parece evidente que a resposta mais correcta é esta última. Com o ressuscitar da inflação há parte dos problemas de algumas economias (e não só) europeias que ficam mais controlados, o que leva ao natural ajuste da política de estímulos do Banco Central Europeu. Que, diga-se, foi e é útil, mas não deixa de ser um programa excepcional e que distorce (em alguns sentidos positivamente) o mercado. Acontece que o fim (felizmente gradual) do programa é particularmente negativo para países como Portugal, que não estão necessariamente na lista de prioridades dos decisores internacionais.
Dito isto, os nossos juros têm subido mais do que o resto da Europa. Os nossos "spreads" têm vindo a alargar-se, ou seja, não basta dizer que os motivos vêm de fora. Isto é verdade, mas impactam-nos mais porque há motivos próprios para que tal aconteça.
A discussão sobre a culpa é muito interessante ao nível político, mas resolve pouco. Há coisas que simplesmente são, independentemente de quem as provocou. Parafraseando Mário Centeno, "a vida é o que é".
O Governo coloca todas as fichas no crescimento económico, afirmando que a consolidação e aceleração deste movimento vai abrir os olhos aos investidores e às agências de "rating". Tenho sérias dúvidas de que tal aceleração aconteça (as próprias previsões do Governo não são excitantes) e que, mesmo que tal suceda, o mercado queira saber.
Esta posição de achar que as sementes estão lançadas e vão dar fruto, ou seja, de deixar correr um movimento de aceleração económica, não chega. Porque as forças exteriores são sempre mais fortes e o seu rumo, em boa medida está traçado. Aqui, a simples passagem do tempo não vai funcionar a nosso favor.
O trabalho que o Governo já tem feito de "namoro" às agências de "rating" tem de ser reforçado e mesmo esse pode não bastar. É preciso juntar algo mais e mostrar aos mercados que há motivos específicos para confiar em nós. E a isso não ajuda mais despesa pública fixa ou relatórios sobre reestruturação da dívida com a chancela oficial dos partidos que suportam o Governo.
Os próximos meses serão muito importantes para fazermos a nossa parte do trabalho. O mercado é muitas vezes injusto, mas isso servir-nos-á de fraco consolo.
Fonte: jornaldenegocios
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