Apesar da recusa do povo colombiano ao “Acordo de Paz” do governo com as FARC, muitos prelados colaboraram para a desorientação dos católicos diante dessa estranha aproximação com o movimento guerrilheiro
Valdis Grinsteins
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O Dr. Alejandro Ordóñez Maldonado foi Presidente do Conselho de Estado e Procurador-Geral da Colômbia de 2009 a 2016. Católico fervoroso, sua integridade no combate legal e desassombrado à subversão e à corrupção transformou-o em uma das personalidades públicas de maior prestígio em seu país. Ele recentemente voltou a se destacar, ao lado de dois ex-presidentes da República e de alguns valorosos grupos de católicos conservadores, por ocasião da vitória do ‘não’ no plebiscito sobre os acordos de paz com a guerrilha comunista das FARC (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia), celebrado no dia 2 de outubro de 2016. Entretanto, o governo colombiano, ignorando o resultado do plebiscito, assinou com a narcoguerrilha o pseudo “Acordo de Paz.
Anteriormente à referida assinatura dos acordos de paz, o Dr. Ordóñez concedeu a Valdis Grinsteins, colaborador da RevistaCatolicismo, da Agência Boa Imprensa e de Polonia Christiana — prestigiosa revista católica sediada em Cracóvia —, a entrevista que reproduzimos abaixo, publicada por essa última na sua edição de janeiro.
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O diário “El Pais”, da Espanha, noticia a derrota do “SIM” no plebiscito colombiano
ABIM — Como o senhor vê a posição do Episcopado colombiano no processo de paz?
Dr. Alejandro Ordóñez — Houve declarações do Presidente da Conferência Episcopal que desorientaram os católicos, porque pretenderam induzir a opinião pública católica a votar afirmativamente no acordo de paz com argumentos emotivos, de que a paz era melhor que a guerra. Com isto desarmavam psicologicamente os católicos. Essa estratégia não surtiu, graças a Deus, qualquer efeito. Análoga posição assumiu o Cardeal Rubén Salazar, que durante todo o processo de Havana avalizou os acordos. Mas é importante reconhecer que houve vários bispos que tiveram a independência e a clareza necessárias para advertir os católicos colombianos. Digamos que houve discrepâncias na posição do Episcopado. O Presidente da Conferência Episcopal e o cardeal foram muito favoráveis ao acordo, mas houve outros setores que foram críticos.
ABIM — O senhor diria que os bispos favoráveis ao acordo foram ingênuos?
Dr. Alejandro Ordóñez — Dando-lhes o benefício da dúvida, podemos dizer que foram ingênuos, embora seja difícil sê-lo. Não só conhecendo as FARC, mas conhecendo a magnitude das concessões feitas. É incrível que os referidos bispos não tenham advertido os católicos sobre como se pretendia transformar em norma constitucional os princípios essenciais daIdeologia de Gênero, como o reconheceram os negociadores de Havana. Grupos de leigos católicos foram os primeiros a advertir e conseguir que a opinião pública reagisse de maneira muito inesperada.
Creio que o acontecido na Colômbia foi um autêntico milagre, uma vez que não era previsível que o governo e todos os interesses que estavam implicados no acordo fossem derrotados no plebiscito.
“Dois dias antes do plebiscito, o Papa Francisco fez declarações que desalentaram muitos leigos que estávamos pedindo para votar ‘não’ no plebiscito por causa de temas de caráter moral”
ABIM — Era todo o poder do Estado…
Dr. Alejandro Ordóñez — Estávamos lutando contra o mundo! Contra 15 partidos políticos, contra um governo que abusou do poder, que abusou dos recursos públicos, que chantageou a opinião pública, que chantageou os governadores, que recorreu a estratégias de guerra psicológica para amedrontar a opinião pública, dizendo: “Se votarem contra o acordo haverá guerra terrorista, haverá novos impostos”. Lutávamos contra o setor privado, que preferiu defender seus interesses e sacrificar os princípios. Lutávamos contra as Nações Unidas, contra a União Europeia, contra os Estados Unidos... Inclusive contra o Papa! Dois dias antes do plebiscito, o Papa Francisco fez declarações que desalentaram muitos leigos que estávamos pedindo para votar ‘não’ no plebiscito por causa de temas de caráter moral, pois víamos que a família e a infância iam ser agredidas pela Ideologia de Gênero. Isso representou uma bofetada dos nossos pastores, aos quais estávamos objetando por razões morais e doutrinárias o acordo de Havana.
ABIM — A decisão do Presidente Juan Manuel Santos de não convocar outro plebiscito para a ratificação do novo acordo não parece ser muito correta. O voto no Parlamento pode ser legal, mas a autoridade não fica com isso em má posição?
Dr. Alejandro Ordóñez — O que o senhor diz é correto. Embora jurídica e institucionalmente se possa [ratificar pelo Parlamento], essa não é a discussão. Ela é moral e política. O Presidente se comprometeu com os colombianos que eles teriam a última palavra. E como o povo recusou o acordo, agora descumpre sua palavra. Ele usurpou do povo colombiano essa esperança, essa possibilidade que o mesmo [povo] lhe havia concedido, para que a última palavra fosse do Congresso. Um Congresso que foi derrotado no plebiscito, porque 90% dos senadores e 80% dos deputados foram derrotados. E eles, que foram derrotados, são os que vão aprovar o que o Presidente chama de novo acordo. Mas isso de novo não tem quase nada. No essencial, o acordo velho permanece.
Estamos em face de uma ameaça, porque a sociedade vai aprofundar sua fratura. Estamos ante o desconhecimento da ação majoritária dos colombianos. Para usar uma expressão colombiana, “nos están haciendo conejo” [estão nos enganando, roubando]. Isso deslegitima nosso sistema político, fazendo-o perder credibilidade e seriedade. Pretende-se reviver por essa via uma figura que exprime claramente que estamos em um governo autoritário, posto que, através da via de referendamento, o acordo pelo Congresso pretende reviver leis habilitantes que haviam sido outorgadas ao presidente pelo ato legislativo para a Paz. Este ato estava condicionado ao triunfo no plebiscito. Como no plebiscito ele foi derrotado, essas faculdades habilitantes não podem ser ativadas. Produzido o referendamento pelo Congresso, pretendem reviver essas faculdades, que são abertamente totalitárias. É como na Venezuela, onde o presidente assume funções legislativas privativas do Congresso.
Fonte: (ABIM)
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