Díli, 07 fev (Lusa) - A carta aberta em que Xanana Gusmão defende duas ex-ministras, condenadas pelo Tribunal de Díli, criticando o sistema judicial de Timor-Leste, representa uma forma de interferência política no sistema judicial, defende uma organização não-governamental timorense.
A avaliação é feita pelo Justice System Monitoring Program (JSMP), organização que monitoriza a justiça em Timor-Leste e que analisou a polémica carta assinada a 25 de janeiro pelo atual ministro do Planeamento e Investimento Estratégico.
"O JSMP condena firmemente esta postura política que continua a interferir no sistema. Tal prática ameaça seriamente a nossa independência judicial e viola o princípio da separação de poderes previsto na Constituição de Timor-Leste", considera Luis de Oliveira Sampaio, diretor executivo da JSMP em comunicado remetido à Lusa.
"Não é a primeira vez que os magistrados judiciais são pressionados e veem o seu trabalho desacreditado. Tem havido muitos casos que refletem essa tendência, que ocorreram quando as decisões não são favoráveis aos interesses políticos, e esta tendência ameaça a nossa democracia", sustenta a JSMP.
A organização considera que as instituições judiciais devem ser independentes e "livres de qualquer forma de interferência política em relação a decisões judiciais" que só podem ser contestadas através dos mecanismos jurídicos adequados.
Na carta, a que a Lusa teve acesso, Xanana Gusmão deixa duras críticas ao sistema judicial timorense e faz acusações sobre alegados casos de abuso de fundos públicos aos dois principais responsáveis da justiça em Timor-Leste, o presidente do Tribunal de Recurso e o Procurador-Geral.
"Esta interferência prejudica seriamente o trabalho do sector judicial e prejudica as instituições públicas que o Estado estabeleceu e nas quais investiu ao longo de um extenso período de tempo. Também prejudica a confiança do público em relação ao bom funcionamento e à credibilidade do Instituições judiciais e viola os princípios de igualdade e universalidade previstos", considera a JSMP.
A organização saúda o facto de Xanana Gusmão ter cumprido o seu dever cívico apresentando-se como testemunha no julgamento das ex-ministras, condenadas por participação económica em negócio numa sentença que foi alvo de recurso da defesa e do Ministério Público.
A JSMP considera que todos os cidadãos "têm o direito de questionar decisões judiciais consideradas injustas e em violação dos seus direitos fundamentais" e insta os tribunais "a respeitarem e defenderem os direitos de todos os cidadãos a um julgamento justo" e a "garantir que todas as decisões judiciais são credíveis e baseadas apenas nos factos e provas" apresentados durante o julgamento.
"Qualquer impugnação relativa às deficiências de uma decisão judicial deve ser feita através dos mecanismos jurídicos adequados, não através de uma carta aberta que seja uma intervenção direta no trabalho do judiciário", sustenta.
No seu comunicado a JSMP recorda que Emília Pires tinha escrito uma carta aberta ao Presidente da República a apontar as várias irregularidades do seu processo e a defender a criação de uma comissão internacional de pessoas eminentes para analisar todo o sistema de justiça.
Insiste que "o órgão que tem a competência para supervisionar a gestão e disciplina" dos magistrados é o Conselho Superior da Magistratura, recomendando por isso ao chefe de Estado que "se abstenha de tomar quaisquer decisões sobre a criação de uma comissão internacional" para essa função.
ASP // FV.
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