Reflexões sobre os usos/competências/danos experimentados pelas crianças e o papel das famílias na socialização digital
No Dia da Internet Mais Segura 2018, iniciativa europeia que arranca a 6 de fevereiro, a ERC – Entidade Reguladora para a Comunicação Social disponibiliza ao público, no seu sítio eletrónico, o ebook “Boom Digital? Crianças (3-8 anos) e Ecrãs”.
O volume integra textos de especialistas e de profissionais nacionais e internacionais que refletem, em relação à sociedade portuguesa e a estudos realizados noutros países europeus, sobre o modo como as crianças mais novas estão a crescer em contacto com a tecnologia digital, os usos que fazem dos ecrãs, as competências e literacias que vão adquirindo, as situações de dano que podem experimentar e os modos como as famílias intervêm nessa socialização digital.
Este estudo constitui mais um contributo no âmbito da terceira edição do projeto da ERC “Públicos e Consumos de Media”, desenvolvida em parceria com uma equipa de investigadores da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa coordenada pela professora Cristina Ponte, e sucede à publicação Crescendo entre Ecrãs. Usos de Meios Eletrónicos por Crianças (3-8 Anos) (ERC, Fevereiro de 2017).
Recordamos que se tratou de uma análise pioneira em Portugal sobre usos de meios eletrónicos por crianças de 3 a 8 anos, baseada num inquérito nacional e na observação de 20 famílias com crianças que acedem à internet.
Segundo os resultados desse inquérito, 38% das crianças dos 3 aos 8 anos acedem à internet. O acesso cresce significativamente com a idade: 22% das crianças de 3-5 anos e 62% das crianças de 6-8 anos. Crianças de famílias com estatuto socioeconómico alto são as que mais usam a rede. Os principais usos desta tecnologia são lúdicos: ver desenhos animados e filmes, jogar jogos, ouvir músicas.
O título interrogativo do ebook que hoje se disponibiliza procura destacar a ambivalência entre usos e projeções de risco.
Apesar de mais de dois terços dos pais serem utilizadores da internet, o estudo evidencia que se preocupam muito mais com esta tecnologia do que com a televisão, meio a que a maior parte das crianças assiste todos os dias. Na internet, os educadores projetam ideias de risco associadas ao seu contexto cultural e ao consumo dos chamados meios tradicionais (violência, linguagem inapropriada e nudez), a que se soma a preocupação com os contactos com estranhos.
Para o Vice-Presidente da ERC, Mário Mesquita, «este estudo sobre os usos da televisão e das redes digitais pelas crianças, além de constituir um relevante contributo para as orientações da ERC, representa também uma proposta de reflexão que disponibilizamos às famílias e aos educadores. Registo a exigência e a qualidade da investigação elaborada por professores da FCSH da UNL, dirigidos pela Prof.ª Cristina Ponte, respondendo a solicitação da ERC».
Cristina Ponte, responsável pela coordenação científica do estudo, salienta que «na televisão os pais têm a sensação que controlam. Nos outros meios digitais sentem uma fragilidade nas suas competências de observação e controlo. Daí a importância de as competências digitais (…) fazerem parte de uma agenda de formação e informação parental e das próprias crianças, capacitadora de saber lidar com riscos e de tirar partido das oportunidades».
O estudo “Boom Digital? Crianças (3-8 anos) e Ecrãs” está dividido em sete capítulos:
- O primeiro, da autoria de Ana Nunes de Almeida e Vasco Ramos (Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa), intitula-se “As crianças nas famílias em Portugal” e aponta o lugar das crianças na sociedade portuguesa contemporânea.
- O segundo, da autoria de Cristina Ponte, José Alberto Simões, Susana Batista, Teresa Sofia Castro e Ana Jorge (CICS.NOVA, da FCSH-UNL), tem por título “Educando entre ecrãs” e articula os resultados do trabalho de campo com os de estudos anteriores, junto de famílias de crianças mais velhas.
- O terceiro, da autoria de Maria João Leote de Carvalho (CICS.NOVA, da FCSH-UNL), intitula-se “Crianças e meios eletrónicos em territórios socialmente desfavorecidos: um olhar sobre (outros) mundos da infância” e apresenta um olhar etnográfico sobre esses territórios a partir das vozes de crianças e suas mães e avós, onde se descobre a vontade de integração social pelo acesso e uso de meios digitais.
- O quarto, da autoria de Andrea Basílio (RTP), intitula-se “Como o Zig Zag mantém o seu espírito na onda da convergência” e apresenta os desafios que se colocam à programação do serviço público de televisão para estas idades.
- O quinto, da autoria de Nelson Zagalo (Universidade do Minho), tem como título “Jogos digitais na infância” e chama a atenção para fatores psicológicos que dão sentido ao fascínio das crianças pelo ato de jogar, em geral, e para diferenças entre géneros de jogos.
- Os dois capítulos finais (“Conselhos para diferentes tipos de pais sobre usos de meios digitais” e “Intervenção parental sobre os usos dos média por crianças mais novas: o olhar da Holanda”) trazem contributos de investigadores europeus sobre estas temáticas e idades, privilegiando as dinâmicas das famílias e considerando as suas diferenças e necessidades de aconselhamento. Os seus autores são Bieke Zaman, Sofie Vandoninck e Marije Nouwen (Universidade Católica de Lovaina, Bélgica) e Peter Nikken (Universidade Erasmus de Roterdão, Holanda).
A ERC relembra que disponibiliza as bases de dados de todos os inquéritos “Públicos e Consumos de Media”, de forma gratuita, à comunidade académica e centros de investigação interessados.
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